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Estréia "Serpentes a Bordo", filme que estourou na web

Supertrash, o filme, estrelado por Samuel L. Jackson, conta a história de um assassino profissional que libera centenas de serpentes venenosas em um avião

Por Agencia Estado
Atualização:

Desde que a serpente tentou Eva, no paraíso, as cobras fazem parte do imaginário popular, quase sempre carregadas de forte conotação sexual. O diretor David R. Ellis sabe disso. No supertrash "Serpentes a Bordo", que estréia nesta quinta-feira, o sujeito vai urinar no toalete do avião. Abre o zíper, a câmera pega a expressão de alívio na cara dele e, de repente... nhauc. A cobra salta de dentro do vaso e pega o cara pelas partes pudendas. Ele se desespera e fica a cobra pendurada no zíper aberto. Mais fálico é impossível. É vulgar, claro, mas é bom esclarecer logo o que "Serpentes a Bordo" tem a oferecer a seu público: "American Pie" na veia. O próprio ator Samuel L. Jackson já disse que fez o filme pelo título, sem ter lido uma página sequer do roteiro que lhe foi enviado. Se tivesse lido, ele talvez recusasse o papel do agente destacado para proteger testemunha que vai depor contra chefão da Máfia oriental. O criminoso é um monstro. Quando seu desafeto é despachado num avião, do Havaí para os EUA o gênio do mal tem a idéia de soltar as serpentes a bordo. A expressão ?snakes on a plane? é usada em inglês para designar uma situação absurda e limite. Tem coisa mais insólita do que serpentes soltas num avião? Claro que a primeira coisa que o espectador tem de fazer é abrir mão da verossimilhança. Embarcar todas aquelas cobras num avião, após o 11 de Setembro, é uma licença que só o mais doido roteirista de Hollywood pode se permitir. Tomada a licença, a idéia é simples - as cobras fazem o maior banquete a bordo, mas é claro que super-Jackson está a bordo para garantir o happy end, representado pela grande onda que os heróis surfistas terminam por pegar. Faz sentido. Internauta navega na rede, mas o sonho, de verdade, é surfar. David R. Ellis misturou "Anaconda" com "Aeroporto" e fez um disaster movie com todos os clichês que você imagina. É divertido? Depende, se o seu modelo de diversão é ver as cobras saltando no pescoço das pessoas. As primeiras vítimas são aquelas que não conseguem conter a libido. O casal que vai transar no toalete, depois o sujeito que quer urinar. A passageira gorda tem um orgasmo com aquela cobra que sobe pelo corpo dela, mas a orgia logo, logo termina e daquele jeito horrível. Muitas vezes, as pessoas são tão ou mais peçonhentas que os ofídios e a prova é o passageiro que sacrifica o cãozinho e termina devorado no momento seguinte. Tem também a aeromoça que se sacrifica pelas crianças. Não há nada, rigorosamente, que você imagine e não termine acontecendo. Um filme artisticamente nulo como "Serpentes a Bordo" não deixa de colocar questões interessantes. Não, não se trata de compará-lo com "Vôo 93", o que é até ofensivo com o filme de Paul Greengrass sobre o 11 de Setembro. Como no caso de "A Bruxa de Blair", todo o bochincho sobre "Serpentes" foi criado na internet. A estréia nos cinemas foi precedida de trailers feitos por amadores, paródias e clipes que circularam por incontáveis sites. O objetivo foi atingido - surgiu um fenômeno, mais um, da era da comunicação de massa. Desde que a reprodutibilidade acabou com a aura da obra de arte - um certo Walter Benjamin refletiu sobre o assunto de forma muito mais lúcida que os especialistas atuais -, não se via nada parecido. Em 1985, seguindo a trilha de Woody Allen em "A Rosa Púrpura do Cairo", o crítico Paulo Perdigão alterou o desfecho de seu filme preferido o western clássico "Shane" ("Os Brutos Também Amam"), de George Stevens. Desde então, a tecnologia digital tem permitido ao público todo tipo de liberdade. O espectador pode começar alterando a velocidade do filme, por exemplo. Na internet, não apenas se promove não importa o que como o espectador constantemente é convidado a interagir, (re)fazendo a obra como quiser. Tudo isso está mudando a cara do cinema, o que não significa que seja, necessariamente, para melhor. "Serpentes a Bordo" está no bojo dessa tendência, mas toda a sensação de liberdade é falsa. Você pode se achar esperto, manipulando o filme, a indústria. Está sendo manipulado. Serpentes a Bordo (Snakes on a Plane", EUA/2006, 105 min.) Ação. Dir. David R. Ellis. 14 anos. Em grande circuito. Cotação: Ruim

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