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ESTREIA-'Infância Clandestina' resgata memória infantil na ditadura argentina

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Por Redação
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A partir de "Infância Clandestina", drama de estreia do diretor argentino Benjamin Ávila, uma coprodução entre Argentina e Brasil, pode-se traçar inúmeras relações, históricas e cinematográficas. As memórias de uma ditadura militar, vistas pelo olhar de uma criança, foram objeto de diversos filmes recentes, como o brasileiro "O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias" (2006), de Cao Hamburger, o argentino "Kamchatka" (2002), de Marcelo Piñeyro, e também o chileno "Machuca" (2004), de Andrés Wood. Todos, por coincidência, indicados para representar seus países nas indicações ao Oscar de filme estrangeiro, situação que se repete este ano com "Infância Clandestina", pela Argentina. O filme, aliás, acaba de sagrar-se como grande vencedor na premiação da Academia Argentina, com dez troféus, inclusive melhor filme e direção e também premiando dois brasileiros: Marcelo Müller, corroteirista, e Gustavo Giani, montador. Se não é novo o tema, no entanto, "Infância Clandestina" guarda como diferencial um vigor muito particular na reconstituição do cotidiano de uma família, no caso, de Juan (Teo Gutierrez Romero). Com 12 anos, Juan vive ao lado dos pais, Horácio (César Troncoso) e Cristina (Natalia Oreiro), um casal de Montoneros que retorna à Argentina em 1979, ano em que o grupo armado peronista inicia uma grande contra-ofensiva contra a ditadura instalada três anos antes. Completa a família o bebê Vicky, garotinha com menos de um ano. Uma rotina nervosa pesa sobre o clã, que se instala numa cidade pequena, unido também ao irmão de Horácio, Beto (Ernesto Alterio), sob a fachada de um comércio de chocolates. Juan vai à escola, mas antes tem que decorar uma nova história pessoal, que inclui um nome falso, Ernesto - homenagem ao Che Guevara. O dia a dia é tenso, regido por normas de segurança que incluem vendar os visitantes, que entram na casa ocultos sob as caixas de chocolate numa caminhonete. As reuniões do grupo são realizadas a portas e janelas fechadas, sob a atenta observação de Juan, que se torna os olhos e ouvidos da plateia. Mesmo militantes apaixonados, os pais e o tio nunca descuidam das funções afetivas, compondo o retrato de uma família intensamente próxima que será completada por uma imprevista visita da avó, Amália (Cristina Banegas) - que se torna, igualmente, a voz de um questionamento àquele modo de vida, insistindo em levar as crianças com ela, sem êxito. Os pais não abrem mão de criar os filhos, mesmo no imenso perigo que todos correm. O filme ganha força não só nesta moldura política forte, como também ao delinear com despojamento as emoções do primeiro amor para Juan/Ernesto, infiltrando uma grande autenticidade e humor. O contraste entre as calorosas cenas familiares e a paixão de Juan por María (Violeta Palukas) e a angústia de seguidos tiroteios retratam a esquizofrenia da infância do protagonista, forçado a crescer rápido demais. Funcionam muito bem as sequências de animação de Andy Rivas, criando um apropriado clima de pesadelo para algumas das situações mais violentas. O diretor estreante, que é corroteirista ao lado de Marcelo Müller, sabe do que está falando - a história baseia-se em parte em suas próprias memórias de infância. Filho de uma mulher que foi companheira de um líder Montonero morto, Ávila dedica o filme à mãe, que foi capturada e figura até hoje na lista dos milhares de desaparecidos argentinos. O cineasta teve mais sorte ao localizar um meio-irmão, que foi levado pelos agentes da repressão que prenderam sua mãe, aos 9 meses de idade. O cineasta o reencontrou aos 5 anos, através da ajuda da organização das Avós da Praça de Maio. (Por Neusa Barbosa, do Cineweb) * As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb

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