Estréia filme sobre Nelson Gonçalves

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Por Agencia Estado
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Por volta de 1984-85 - ele não consegue precisar o ano -, Eliseu Ewald leu uma notícia de jornal. Uma pérola atribuída ao cantor Nelson Gonçalves: ele dizia que havia gravado músicas mais do que suficientes para lançar um disco por ano até 2024. Ewald, que na época já fazia cinema, pensou que aquele Nelson era uma figura e tanto. Começou a acalentar o desejo de fazer um filme a ele dedicado. Esse filme está pronto. Chama-se Nelson Gonçalves, como o biografado. Estreou no Rio no ano passado e somente agora chega a São Paulo. No Rio, ficou nove semanas em cartaz, sem nenhuma verba de publicidade. "Foi a propaganda boca-a-boca que manteve o filme tanto tempo em cartaz", diz o diretor, que acrescenta: "Não tinha dinheiro nenhum para promover o lançamento." Ele diz mais: "O filme só não ficou mais tempo porque as salas do grupo Estação, que deu um grande apoio para a gente, estavam comprometidas com o Festival do Rio BR." Em São Paulo, a estréia será pequena - uma sala -, mas Ewald sonha com a mesma acolhida do Rio. "Havia gente que aplaudia no fim da sessão; conheço espectadores que viram o filme quatro, cinco vezes; isso é muito gratificante." É um tributo ao cantor que era chamado de rei do rádio, vendeu mais de 60 milhões de discos e tinha um vozeirão de impor respeito. Cauby Peixoto, um dos entrevistados, diz que Nelson tinha o prazer de cantar e isso era o mais importante. Mais do que o prazer de cantar, Nelson comunicava esse prazer ao público e fazia com que o ouvinte também tivesse prazer em ouvi-lo. Isso sim era importante. Ewald explica que foi um caso perfeito de casamento entre personagem e formato. Este ano, Marco Aurélio Barroso publicou o livro A Revolta do Boêmio, contestando alguns dos mitos criados em torno de Nelson. Esses mitos foram alimentados em boa parte pelo próprio Nelson. "Ele criou uma persona: exagerava fatos, distorcia-os; acreditava que a vida de uma pessoa é sua vida e o mito que ela consegue criar sobre si mesma." Daí o formato do docudrama, que não é um documentário radical, com seu compromisso, mesmo que entre aspas, com a verdade. O docudrama é ficcionalizado e, portanto, perfeito para contar a história do grande boêmio da MPB. Depois de muito pesquisar, sobre a vida do biografado, Ewald não tem certeza de mais nada sobre Nelson. "Acho que nem ele mais sabia", arrisca. Há tantas histórias que é difícil checá-las. Nelson não deixou músicas gravadas para compor álbuns até 2014, talvez não tenha sido profissional do boxe, como dizia mas certamente lutou, e pode ter tido mulheres na zona, na época em que gigolava para aumentar os rendimentos como cantor, mas vá alguém saber se eram mesmo dez, como ele sustentava. Tudo é incerto, nebuloso. Mas o filme não é nem pretende ser desmistificador. Desde o início, Ewald sabia o que queria fazer: um tributo a um grande ídolo. Acha que o Brasil precisa cultivar seus ídolos. Trabalhou a vida de Nelson, em seu documentário, no registro do mito. Acha que colheu depoimentos maravilhosos - o de Lobão, por exemplo -, só tem elogios para Alexandre Borges, que faz o papel. Alexandre faz a mímica, mas quem canta é o próprio Nelson. Sua voz, afinal de contas, é o atrativo mais forte do filme que estréia amanhã. Um dos entrevistados mata a charada ao dizer que Nelson fez a súmula dos grandes cantores que o precederam: Francisco Alves, Orlando Silva, Carlos Galhardo. Por meio dele, pode-se contar a história do rádio e da própria indústria fonográfica no Brasil. Foi o que Ewald fez. Contou com a participação da BMG, gravadora de Nelson, e da prefeitura do Rio. O prefeito Eduardo Conde gostava tanto do cantor que deu ao Largo da Lapa o seu nome. Quando Ewald foi entrevistá-lo para o filme, conseguiu mais: seu apoio. Para o diretor, resgatar figuras como Nelson deveria ser uma questão de segurança nacional. "Representa a defesa da nossa identidade." Cúmplice nesse processo foi o produtor Diler Trindade, com quem Ewald começou a trabalhar há muitos anos. "O Diler tem interesse afetivo no material; o pai dele foi um grande fotógrafo que deixou uma extensa documentação iconográfica sobre a Rádio Nacional." O produtor dos filmes da Xuxa tem como compromisso moral (e pessoal) criar condições para a divulgação desse rico material fotográfico. Se depender de Ewald e Diler Trindade, a era do rádio vai reviver. Nelson Gonçalves é só um começo. Serviço - Nelson Gonçalves. Drama. Direção de Eliseu Ewald. Br/2001. Duração: 73 min. Cine Arte Lilian Lemmertz 2, às 18 horas, 19h30 e 21 horas (segunda não há sessão). Interlar Aricanduva Cinemark 10, às 18h20 e 20h20. Livre.

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