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ESTREIA-Comédia mexicana "Paraíso" discute padrões estéticos e sociais

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Por Redação
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Não é só por eleger como sua musa uma heroína bem fora dos padrões estéticos e esquálidos vigentes que a comédia dramático-romântico mexicana “Paraíso” se desvia das formulações quase inevitáveis do gênero. Sem dúvida, é a joia do filme ter acertado com uma atriz tão natural e carismática quanto a estreante Daniela Rincón para interpretar sua rechonchuda protagonista, Carmen. Casada com um namorado da adolescência, Alfredo (Andrès Almeida), ela encarna com ele um protótipo de felicidade suburbana. Comilões, gorduchos e apaixonados, eles moram em Satélite, um subúrbio da capital mexicana, têm um cachorro e uma árvore plantada no jardim. Ela trabalha no negócio de refeições dos pais. Quando ele consegue um novo emprego numa grande empresa na Cidade do México, acena-se para uma perspectiva de ascensão social. Mas também de total mudança de parâmetros. Literalmente, o chão parece sair debaixo dos pés de Carmen, especialmente. Afinal, é ela quem será privada do trabalho familiar, do cachorro e das relações que a sustentavam até ali. A inadequação da bagagem que os dois trazem para o novo apartamento é simbolizada pela imensa geladeira – que não cabe na porta e tem que ser despachada de volta. Fora isso, é a própria figura física deles que não se ajusta ao figurino de sua nova classe social. Numa festa da empresa do marido, Carmen ouve sem querer colegas dele cochichando sobre a gordura dos dois, descrevendo-os como dois “fugitivos de uma exposição de Botero” – artista colombiano que, inclusive, Carmen só vai descobrir quem é pela Internet. A dieta torna-se uma urgência para Carmen, levando-a a convencer o marido a acompanhá-la, mesmo relutante, às frenéticas reuniões de uma espécie de “Vigilantes do Peso”. No processo, as posições se invertem e é ele quem se entusiasma bem mais pelo emagrecimento, descobrindo uma nova vaidade, um novo figurino, novos hábitos. E instala-se a crise no casamento feliz entre o par que se chamava entre si de “gordo” e “gorda”. Diretora que estreou em longas de ficção com o ótimo “Cinco Dias sem Nora” (2008), Mariana Chenillo, que adapta neste roteiro um conto de Julieta Arévalo, tem um olhar fino para as contradições humanas, os relacionamentos amorosos e também as expectativas da classe média, que é retratada em seus dois filmes. Singelo na aparência, “Paraíso” coloca em questão muito mais do que a obsessão pela boa forma ou os limites da vida familiar e dos papeis sexuais, explorando o que é realmente felicidade ao colocar em xeque as fórmulas socialmente impostas de realização, sucesso e mesmo de emagrecimento, como se pudessem servir indiscriminadamente a todos, só restando aos “desviados da norma” a exclusão. Por sua ternura com os personagens e um humor sutil, “Paraíso” remete, às vezes, à comédia alemã “Sugar Baby” (1985), de Percy Adlon – em que a heroína de formas generosas, Marianne Sägebrecht, foi uma precursora da nova musa mexicana, Daniela Rincón. (Por Neusa Barbosa, do Cineweb) * As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb

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