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Em série da Netflix, Messias retorna em busca de 'likes'

O milagre de ‘Messiah’ é conseguir formar consenso negativo entre católicos, muçulmanos e críticos de seriados

Foto do author Pedro  Venceslau
Por Pedro Venceslau e Paula Reverbel
Atualização:

Um dos poucos consensos que unem a maioria das religiões ao longo dos séculos é o aparecimento de um Messias no Juízo Final. Mas como será essa volta gloriosa? Segundo as tradições católicas e cristãs ortodoxas, a segunda vinda de Jesus será um incidente repentino e inconfundível, “um relâmpago”.

O ator belga Mehdi Dehbi,protagonista da série Messiah, da Netflix Foto: Netflix

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Os muçulmanos acreditam no dia da ressurreição (al-Qiyamah) e no dia do Juízo Final (al-Din), mas não têm um roteiro unificado para esses momentos. Disponível na plataforma Netflix, a série Messiah conseguiu irritar todos ao apresentar um Messias que surge do nada com um discurso prolixo, um ar blasé, a barba cuidadosamente malfeita e um jeitão de pop star que usa blusão da Nike na hora de fazer esteira. 

Com 10 episódios de 50 minutos, a série foi a primeira aposta do ano da Netflix e entrou no cardápio da plataforma caprichosamente em 1.° de janeiro.

Celebridade instantânea

O suposto “Messias” surge no primeiro capítulo na Síria, quando faz uma fala repleta de platitudes para um multidão atenta, pouco antes de um ataque do Estado Islâmico em Damasco, seguida de uma tempestade de areia. 

“Eles fingem pregar a palavra de Deus e tudo que fazem é distorcê-la. Está escrito. Nada é por acaso. Tudo está no plano de Deus”, disse o “profeta”. 

Um popular então grita que é proibido citar errado as escrituras e dispara: “O diabo que lhe carregue”. O “Messias” não se faz de rogado e rebate: “Eu olhei o diabo nos olhos e ele não pode me carregar”. 

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Enquanto destila seus clichês de fé em meio ao caos, o pregador misterioso é filmado por uma miríade de câmeras de celular. E em um átimo ele está na barra de rolagem do Instagram, Facebook, YouTube.

Torna-se, enfim, uma celebridade instantânea. Mas seria ele um novo mico, como a “Grávida de Taubaté”?

O mundo aos seus pés, mas o sujeito segue como se nada tivesse acontecendo: “Abandonem suas suposições sobre Deus. Parem de se agarrar ao que acham que sabem. A humanidade é um barco sem leme. Agarrem-se a mim”. Corta.

Em outro momento, ainda no capítulo de estreia da série, o Messias surge do nada nos Estados Unidos, onde patrocina outros “milagres”. 

Novamente o feito é “flagrado” em ação e disseminado nas redes sociais, mas dessa vez seu foco são os cristãos.  As cenas se dividem entre o Oriente Médio e os EUA. Nos dois pontos, agentes céticos investigam o personagem da vez ao mesmo tempo que são seduzidos por ele. 

Conforme atrai multidões, o “Messias” passar a ser visto como uma questão de segurança nacional. 

O suposto enviado dos céus não se incomoda de ver sua vida transformada em um reality. Pelo contrário. Faz questão de gerar fatos e imagens para bombar no “insta”. 

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A série é uma daquelas que uma vez assistido o primeiro episódio, torna-se impossível não ir em frente. 

Debate ideológico e religioso

Em pleno ano de uma eleição presidencial dos Estados Unidos que deverá ser marcada pelo debate ideológico e religioso, Messiah abriu com o força a discussões sobre as miragens criadas no ambiente virtual e sua força na vida das pessoas. 

Logo após divulgar o primeiro trailer, a série enfrentou o mesmo ritual de críticas e ataques que o Porta dos Fundos com seu especial de natal sobre um Jesus Cristo gay. Mas, nesse caso, a artilharia veio de todos os lados. 

A primeira e mais contundente reação foi em caráter oficial e veio da Jordânia, onde a série foi parcialmente gravada. 

Um documento da Comissão Real de Filmes da Jordânia, a Ancine local, disse que o conteúdo de Messiah pode ser interpretado como algo que viola a santidade da religião – o que é um crime na Jordânia – e solicitou que o conteúdo não fosse disponibilizado no país. 

Em outra frente, uma petição online pediu um boicote à plataforma Netflix. Após a divulgação do trailer da série, muçulmanos e falantes de árabe acharam que o nome do protagonista estava entregando uma possível reviravolta da trama que seria ofensiva à religião islâmica.

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“Al-Masih” – que significa “o messias” – também é um nome associado à figura do “Al-Masih ad-Dajjal”, ou simplesmente “Dajjal”. Trata-se de um falso profeta da teologia islâmica, semelhante ao Anticristo, que se anuncia ao mundo como al-Masih e arrebanha muitos seguidores. 

Depois que falantes de árabe apontaram o significado do nome, a Netflix negou, em seu perfil americano no Twitter, que o nome completo do personagem era “Al-Masih ad-Dajjal”.

A crítica especializada foi dura. O agregador de resenhas Rotten Tomatoes cravou 43% de aprovação: “Promessa e elenco soberbo não podem salvar Messiah de sua narrativa sem sal”. 

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