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Em 'Mormaço', Marina Meliande trata da questão de gênero

No filme, o fantástico opera mudanças no corpo de uma mulher e elas metaforizam a realidade da metrópole

Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Na primeira versão do roteiro de Mormaço, o longa de Marina Meliande em exibição desde quinta, 9, a área em litígio era um amálgama de várias situações de remoção forçada no Rio. Durante as suas pesquisas, a diretora e roteirista foi à Vila Autódromo, cujos moradores estavam sendo removidos como parte do projeto de reurbanização visando a Olimpíada. ‘Vai ser melhor para todo o mundo”, diz o homem da administração pública. “Todo mundo quem?”, retruca Ana, a protagonista?

Ao visitar a Vila Autódromo e conhecer suas lideranças, Marina centrou o foco. Conheceu a líder local, e ao saber que fizera teatro quando jovem, deu-lhe o importante papel de Domingas. Mormaço tem um forte aspecto documentário. A realidade está lá, em toda a sua violência e complexidade. Mas a proposta sempre foi a de um filme de gênero.

Marina Provenzzano. Como Ana; seu corpo transpira sexo Foto: VITRINE FILMES

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Marina queria expressar, por meio das transformações no corpo de uma mulher, as transformações na cidade. “Quem vive no Rio conhece bem a combinação de calor, umidade e mofo. Imaginei essa ficção em que o mofo está tanto na parede de um prédio sendo desocupado como no corpo de Ana. Além de moradora, ela é advogada ligada a grupos em situações de riscos em remoções urbanas.” Existe, então, o prédio em que Ana mora, de classe média, numa área, digamos, mais privilegiada, e a Vila Autódromo.

Há um romance no meio. O mofo, que se apropria de seu corpo, acirra sua sensualidade. Ela quer, transpira sexo. Desperta o desejo do arquiteto que avalia o prédio em que mora. Ela o adverte de que não está bem. Ele a deseja, mesmo assim. O filme cresce nessas várias frentes. Uma, mais realista; outra, ficcional, a aberração (digna de David Cronenberg?) na qual Ana vai se transformando; e o erotismo.

Como Juliana Rojas e Gabriela Amaral Ameida, de outro filme em cartaz – A Sombra do Pai –, Marina Meliande é outra diretora brasileira atraída pelo cinema de gênero como forma de expressar o País. Ela não tem outra explicação senão esse desejo de buscar poesia numa situação limite. “Encaro como uma forma de utopia e resistência, muito ligada às questões da mulher.” Sua atriz, Marina Provenzzano, é visceral na entrega. O filme é ótimo, com um desfecho muito forte. Mormaço 2?

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