Em cartaz, a grande época do cinema italiano

A Cinemateca Brasileira promove um Panorama de Diretores Italianos, com 14 títulos produzidos entre 1954 e 1996, entre eles, Vittorio de Sica, Bernardo Bertolucci, Dido Risi e Mario Monicelli

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Por Agencia Estado
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O ano começa falando a língua de Dante na Cinemateca. Além da tardia estréia de A Escolta, de Ricky Tognazzi, realizado em 1993, a Cinemateca Brasileira promove em sua sala a retrospectiva Panorama de Diretores Italianos, com 14 títulos produzidos entre 1954 e 1996. Catorze filmes para 14 cineastas, com nomes mais do que manjados como Vittorio de Sica, Bernardo Bertolucci, Ermano Olmi, Dino Risi e Mario Monicelli, entre outros. Durante muito tempo o cinema italiano exerceu sua influência benéfica sobre a cultura brasileira. Basta lembrar que alguns garotos, que depois seriam expoentes do Cinema Novo, foram para Roma aprender no Centro Sperimentale de Cinema, na época um pólo irradiador das idéias de Zavattini e Rossellini, os papas do neo-realismo, movimento que está na raiz do cinema moderno brasileiro. Nos anos 60 e 70 esperava-se com ansiedade pelo lançamento mais recente de mestres como Antonioni e Fellini que chegavam sem muito atraso. Depois, com o embrutecimento do circuito, a arte cinematográfica da península foi sendo deixada em segundo plano. Acabou quase por sumir das telas brasileiras, a não ser por uma ou outra exceção. Daí a importância dessa primeira mostra do ano promovida pela Cinemateca. Além da estréia de A Escolta, história de um promotor perseguido pela máfia na Sicília, há a atração de títulos antigos, há muito fora de cartaz. É o caso de Um Grito de Revolta (mais conhecido pelo título original, San Michele Aveva un Gallo), dos irmãos Taviani, A Grande Guerra, de Mario Monicelli, O Teto, de Vittorio de Sica, ou Eugênio, de Luigi Comencini. Gianni Amelio, que uma vez participou como jurado da Mostra Internacional de São Paulo, vem representado por aquele que é seu filme mais forte - América, o Sonho de Chegar -, comentário bastante atual sobre o problema da imigração na Europa, ou em qualquer lugar do mundo. A mostra é também oportunidade de conferir o trabalho da diretora Francesca Archibugi, muito badalada na Itália por sua ênfase nos temas sociais. Seu A Grande Melancia é comercialmente inédito em São Paulo. Amelio, em particular, é herdeiro legítimo do grande cinema social italiano. Seu América relembra a seus compatriotas que a Itália, que hoje recebe com tantas restrições gente de outros países, conheceu um grande surto de emigração no passado e mandou gente para todos os cantos do mundo. Não faz esse lembrete em termos acusatórios, mas por meio de uma metáfora poderosa - a do italiano senil, que volta à Itália e pensa estar chegando ao paraíso, ou seja, à América. Preocupações temáticas - Amelio e Archibugi formam um par de preocupações temáticas. Mas há outro, entre Ermano Olmi e seu discípulo, Mario Brenta, ambos empenhados em um cinema de fundo existencial e religioso. De Olmi, programou-se a alegoria social Longa Vida à Senhora. De Brenta, o maravilhoso O Guardião da Montanha, adaptação do relato de Dino Buzatti sobre um tema católico como o perdão. Concorreu no Festival de Gramado. Em Vigarice à Italiana, de Giuliano Montaldo, uma curiosidade: em seu elenco há a brasileira Norma Bengell, na época casada com o italiano Gabriele Tinti (com quem fez Noite Vazia, de Walter Hugo Khouri). La Bengell contracena com Renato Salvatori neste drama amoroso, considerado um dos bons filmes de Montaldo. O crime de amor, aqui, aparece como pretexto para uma obra de crítica social. Ponto alto da mostra é A Estratégia da Aranha, um dos grandes filmes de Bernardo Bertolucci, a ser contado ao lado de obras-primas como Antes da Revolução, O Conformista e O Último Tango em Paris. Bertolucci continua em grande forma, tendo apresentado no mais recente Festival de Veneza Os Sonhadores (ainda inédito no Brasil) sobre a geração de maio de 1968. Portanto, na política, como não poderia deixar de ser para um artista de sua geração, Bertolucci está em casa. O interessante é que, para filmar sua parábola sobre a memória do fascismo, Bertolucci se apóia no texto de um escritor que gostava de proclamar aos quatro ventos seu apoliticismo. Assim, A Estratégia da Aranha, uma produção encomendada pela RAI pré-Berlusconi, adapta o pequeno relato de Jorge Luis Borges Tema do Traidor e do Herói para a Itália convulsiva dos anos 60. Um rapaz tenta investigar a morte do pai, ocorrida anos antes em circunstâncias estranhas, e descobre que não se remexe em vão no passado. O filme aponta para as raízes fascistas da estrutura social italiana, unindo beleza formal e agudeza crítica. Uma obra maravilhosa de análise política. Serviço: Panorama de Diretores Italianos. Programação de hoje, às 17h15 e 21h10, quarta, às 19h15, quinta, às 19h05, ´A Escolta/93´, de Ricky Tognazzi. Duração: 95 minutos; às 19h05, ´A Investigação/87´, de Damiano Damiani. Duração: 110 minutos. Quarta, às 17h10, ´A Grande Guerra/59´, de Mario Monicelli. Duração: 110 minutos. Quarta, às 21h05, ´A Grande Melancia/93´, de Francesca Archibugi. Duração: 100 minutos. Quinta, às 17h10, ´O Teto/56´, de Vittorio de Sica. Duração: 100 minutos. Quinta, às 20h55, ´A Estratégia da Aranha/70´, de BernardoBertolucci. Duração: 110 minutos. De terça a domingo. Sala Cinemateca. Largo Senador Raul Cardoso, 207, tel. (11) 5084-2177. Até 18/1

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