A política deixou os israelenses "doentes e cegos", diz o diretor Nadav Lapid sobre seus concidadãos, ao apresentar nesta quinta, 8, seu filme Ahed's Knee, uma queixa furiosa contra a censura governamental, durante a competição oficial do Festival de Cannes. Lapid, que vive basicamente em Paris, é uma figura em ascensão no cinema israelense. Em 2019, foi agraciado com o Urso de Ouro da Berlinale por "Sinônimos", um passeio existencial e autobiográfico pelas ruas da capital francesa. Em "Ahed's Knee", o diretor de 46 anos continua explorando a difícil relação com seu país, mas desta vez ele atira diretamente nas autoridades. A trama se passa na pequena vila de Sapir, na região desértica de Arava, onde um diretor, consumido pela raiva, chega para exibir um de seus filmes de sucesso no exterior.
Ao descer do avião, ele é recebido por uma jovem enviada pelo Ministério da Cultura que o faz assinar um formulário que o diretor (interpretado por Avshalom Pollak) define como "submissão": ele deve se comprometer a não tratar de temas polêmicos em seus filmes, optando por render glória a Israel e seu povo para então ter direito a receber financiamentos. "O que é triste em Israel é que não é necessário enviar tanques para a frente do Fundo de Cinema de Israel", um fundo que apoia o cinema nacional, explica Lapid. “Nem é preciso prender um diretor como na Rússia. Porque todos acabam dizendo: 'tudo bem, nada de política, vamos falar de família'." Para o diretor, essa censura ao cinema foi instalada com os últimos governos de direita. Antes, o Estado “exercia forte opressão sobre parte de sua população, mas, ao mesmo tempo, os cineastas gozavam de total liberdade”. O pior é "quando a censura passa a fazer parte da sua alma e te acompanha como uma sombra", diz Lapid, que também apresenta o curta-metragem "The Star" em Cannes. O cineasta também não espera que as coisas melhorem com o novo governo de coalizão, liderado pelo primeiro-ministro Naftali Bennett (direita radical). “A doença ainda está lá, as pessoas ainda estão completamente cegas. A alma israelense vive com essa vitimização sem fim”, diz ele.