'Elles' traz bom elenco em história sobre prostituição em Paris

Diretora alia sutileza e brutalidade em trama de repórter incumbida de pauta sobre garotas de programa

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Por Luiz Zanin Oricchio - O Estado de S. Paulo
Atualização:

Juliette Binoche é Anne, repórter especial da revista feminina Elle, incumbida de uma pauta especial sobre garotas de programa.

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Ela não quer conhecer prostitutas comuns, mas jovens universitárias que "fazem a vida" em Paris. Conhece duas e a convivência faz com que não apenas mude de percepção sobre essas moças como se sinta um tanto desconcertada. Este é o filme da diretora polonesa Malgorzata Szumowska.

Elles é surpreendente. Num tema banal, a diretora tenta - e consegue - aliar sutileza a brutalidade. Não doura a pílula. Tampouco faz sensacionalismo. As cenas de sexo não são edulcoradas nem apresentam aquela estética publicitária que transforma o intercurso entre homem e mulher em peça comercial. É sexo. E sexo pago. Ao mesmo tempo, não cai na gratuidade.

O maior trunfo é mesmo Binoche, grande atriz. Seu papel é ingrato, porque cairia facilmente numa caricatura. Mãe e esposa convencional, expõe-se a uma crise ao entrar em contato com um mundo que desconhece, mas em relação ao qual alimenta preconceitos e fantasias.

No começo, Anne tenta estabelecer com suas personagens (é assim que elas são designadas no jargão jornalístico) uma relação objetiva e distanciada, de repórter com fonte. Logo fica clara uma diferença entre ela e as moças, distância que não deixa de ser social. Mas percebe que, bem estabelecida na profissão, bem casada, mãe de dois filhos, tem tudo aquilo a que as garotas aspiram, por outros meios: a segurança burguesa. Há diferença social, não distância existencial.

Anne se envolve emocionalmente com as personagens. Elas deixam de ter existência abstrata, a de matéria-prima para um trabalho jornalístico, e ganham vida real. São pessoas de carne, osso... e desejo humano. Conversam com a repórter, passam experiências, falam da clientela, dos bons e maus momentos. Estabelece-se uma relação intersubjetiva entre a repórter e as moças. Entre mulheres, enfim. Mais ainda, uma relação de imaginários, porque o tema de que tratam não é neutro em absoluto. Trata-se da sexualidade, sobre a qual pairam tabus e inibições. E, acima de tudo, fantasias, algumas inconfessáveis.

Quem são essas garotas? Charlotte (Anais Demostier) e Alcja (Joanna Kulig). Uma francesa, outra estrangeira. Cada qual com seus problemas particulares, mas tentando viver da forma a mais desdramatizada possível. É provável, por isso, que para uma leitura mais moralista, o tratamento natural que a diretora dá à prostituição seja criticado. Pouco importa. A intenção parece ter sido exatamente essa - a de trabalhar, por um lado, com uma ausência de culpa. E, por outro, com a relação a princípio um tanto superior de Anne em relação às duas mulheres e que, depois, se torna mais homogênea. Há um claro viés libertário na maneira como o filme é concebido.

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Ao mesmo tempo, e contando com esse elenco bastante bom (sem falar em Binoche, que é sempre fora de série), há uma direção que exibe bastante frescor. Sem inventar em termos de linguagem, dar saltos no tempo, ou buscar qualquer artifício narrativo, o estilo jamais é percebido como monótono. O filme flui e deixa-se ver. Passa grande sinceridade, e verdade.

ELLESDireção: Malgorzata Szumowska. Gênero: Drama (França-Polônia-Alemanha/2011, 99 minutos). Classificação: 16 anos.

 

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