'Ela Vai' revive o mito de Catherine Deneuve

A diretora Emmanuelle Bercot conta como foi escrever e filmar especialmente para a eterna Bela da Tarde

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Em Berlim, em fevereiro, havia forte torcida de parte da crítica para que Catherine Deneuve ganhasse o prêmio de melhor atriz, por seu papel em Elle s’en Va. No final, ganhou a chilena Paulina Garcia, por Glória, e foi uma belíssima vitória. Mas Deneuve também teria sido gloriosa. O problema é que o júri deve ter pensado – o que um prêmio de interpretação, mesmo num festival do porte de Berlim, pode acrescentar ao mito Deneuve?

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A diretora Emmanuelle Bercot conta que Catherine Deneuve foi sempre uma referência para ela. “Vi todos os seus filmes e tenho certeza de que muitos deles fortaleceram meu desejo de fazer cinema.” Em 2011, ela quase não acreditou quando foi sondada para adaptar o livro Un Jeune Fille aux Cheveux Blanc – para Catherine. “O projeto terminou não saindo (e virou Os Belos Dias, de Marion Vernoux, com Fanny Ardant), mas eu senti uma decepção por parte de Catherine. Estávamos nos dando tão bem. Na surdina, e sem lhe dizer nada, escrevi Ela Vai. O filme nasceu de uma imagem que me veio: Catherine Deneuve na direção de um carro, com o braço para fora, e fumando.”

 

  Emmanuelle Bercot escreveu o filme para Catherine, inspirada nela. “Ela acha que se inspirou em mim, mas o filme é muito mais sobre uma ideia que as pessoas fazem de mim”, declarou a própria Deneuve ao Estado. De qualquer maneira, em termos de Bela da Tarde, o filme tem algo de desmistificação, ou pelo menos de humanização. Divide-se em duas partes, quase dois filmes. Na primeira, Deneuve é dispensada pelo amante, surta e termina indo para a cama com um homem mais jovem. Na segunda, cai na estrada com o neto. Deneuve avó? Na cama, o homem mais jovem diz que ela deve ter sido muito bonita. Não houve constrangimento para fazer a cena? “Claro que não. Tenho consciência de que o tempo está passando para mim”, disse Deneuve. “Só vocês, da imprensa, insistem no mito da eterna Bela da Tarde.” Emmanuelle Bercot fez filmes sobre jovens. Deneuve é sua primeira heroína ‘madura’. “Foi muito prazeroso escrever e, depois, filmar com ela. Na primeira parte, Catherine contracena com atrizes (Hafsia Harzi, entre outras). Na segunda, quando cai na estrada, decidimos que o melhor seria confrontá-la com não profissionais. A cena da balada foi feita assim. Todas aquelas mulheres são locais. Estreiam no cinema, e com Catherine. Nem a estrela as intimidou nem elas se sentiram intimidades. Era uma conversa de mulheres entre elas.” Uma cantora e compositora – Camille – faz a filha de Deneuve. Ela possui uma canção chamada Elle s’en Va, que a diretora não conseguiu incluir na trilha. Deneuve sugeriu um amigo – o pintor Gérard Garouste – para fazer seu par romântico, o avô do neto (pelo lado do pai). E a diretora, ao transformar a personagem numa antiga miss, achou que seria interessante propor o reencontro de Deneuve com suas colegas de concurso. Os coroas vão poder matar a saudade de Mylène Démongeot, uma loira que fez carreira nas pegadas de Brigitte Bardot. “Mylène e Catherine contavam histórias nos intervalos de filmagem. Todo mundo se divertia. Gosto de fazer cinema assim, em família.” Ela dedica o filme a Claude Miller, cineasta que morreu em abril do ano passado. “Claude foi sempre muito generoso comigo. Deu-me todo apoio na Fémis (escola de cinema). Fui visitá-lo no hospital e manifestei minhas dúvidas. Não estava segura de levar o filme adiante. Ele me disse que eu o faria, e faria bem. Se Deneuve foi uma irmã mais velha para mim, Claude foi um pai. Tinha muito carinho por ele.”

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