É Tudo Verdade: 'Segredos do Putumayo', de Aurélio Michiles, reveste-se da maior importância

Singularidade do filme – o paradoxo? – é que ele transforma o horror em beleza; 'Fico Te Devendo uma Carta Sobre o Brasil', de Carol Benjamin, inspira-se numa história de sua família

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Num momento em que tanto se discute, internacionalmente, a questão amazônica, um filme como Segredos do Putumayo, de Aurélio Michiles, que passa neste sábado, 3, às 21h – com repetição no domingo, às 15h, seguido de debate, às 17h –, reveste-se da maior importância. O filme está na programação do festival É Tudo Verdade. Nos anos 1990, Michiles já resgatara o chamado cineasta da selva, Silvino Santos. Volta-se agora para Roger Casement, considerado um pioneiro da luta por direitos humanos.

Casement foi o homem que denunciou o rei Leopoldo II, da Bélgica, mostrando as atrocidades cometidas em seu nome, no Congo. Ao mesmo tempo em que espoliava sua colônia africana, o rei instituiu uma cruel punição para os nativos que não se submetiam à sua autoridade. Mandava decepar mãos e pés. As imagens são chocantes. Casement registrou depois a repressão na Irlanda, onde nasceu, e depois veio ao Brasil para investigar os crimes cometidos pela Peru Amazon Company, com ações na Bolsa de Londres. Em seu Diário da Amazônia, Casement documentou como a empresa escravizou, e matou, mais de 30 mil índios, obrigando-os ao trabalho escravo na extração da borracha.

Segredos do Putumayo, de Aurélio Michiles, está na programação do festival É Tudo Verdade Foto: Aurélio Michiles/É Tudo verdade

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A singularidade de Segredos do Putumayo – o paradoxo? – é que o filme transforma o horror em beleza. É o mais elaborado e bem fotografado filme do diretor, e o rigor do preto e branco se equivale àquele com que Ciro Guerra filmou a floresta em O Abraço da Serpente, seu longa de ficção indicado para o Oscar. Difícil falar de Segredos do Putumayo sem evocar o filme colombiano – cujo diretor, por sinal, enfrenta atualmente denúncias de assédio de diversas mulheres em seu país. Justamente as mulheres estão no centro de outro documentário que passa neste sábado, às 15h, devendo ser seguido de debate às 17h, sempre no site do festival – www.etudoverdade.com.br.

Fico Te Devendo uma Carta Sobre o Brasil, de Carol Benjamin, inspira-se numa história de sua família. Seu pai, Fred, ainda era menor de idade quando foi preso, julgado e condenado – ilegalmente – pela ditadura militar. Enquanto recupera sua história familiar – e mostra o silêncio das pessoas e instituições como ferramentas de apagamento da memória coletiva –, Carol transforma sua avó no verdadeiro centro dessa tragédia. Iramaya Benjamin era dona de casa, mas, em defesa do filho, tornou-se militante na questão dos direitos. Teve uma aliada preciosa na dirigente sueca Marianne Eyre, da Anistia Internacional. Como a questão da Amazônia, a dos direitos humanos tem estado em discussão no Brasil e o É Tudo Verdade abre uma janela importante para o tema.

Veja os trailers dos filmes:

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