Documentário registra trabalho do Grupo Satyros

Montagem de 'Vestido de Noiva', texto de Nelson Rodrigues, é registrada por Evaldo Mocarzel

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Por Beth Néspoli
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Quem viu, na curta temporada paulistana, a montagem de Vestido de Noiva dos Satyros, dirigida por Rodolfo García Vázquez com participação especial da atriz Norma Bengell, sabe que além de muitas projeções há momentos em que uma câmera, no palco, capta imagens on line. Pois outras três câmeras tomaram o espaço da platéia durante as apresentações desse espetáculo na mostra principal do Festival de Teatro de Curitiba que começou na quinta e termina no domingo.   Veja também: Galeria de fotos do making of    O motivo de tantas lentes? O trabalho dos Satyros está sob o foco do documentarista Evaldo Mocarzel. Premiado por filmes como À Margem da Imagem e Do Luto à Luta, o cineasta volta agora seu olhar para o palco e promete passar meses debruçado sobre o processo de criação desse grupo que transformou o circuito ‘off’ em ‘in’ ao se instalar na Praça Roosevelt, em 2000, na época um dos lugares mais violentos da cidade, hoje ponto de encontro de artistas e local da moda. "O teatro paulistano vive um período de efervescência que precisa ser registrado", diz Mocarzel. "Eu não tenho dúvida que o movimento teatral de agora, em bora parte impulsionado pela Lei de Fomento, já faz parte da História do teatro brasileiro e será objeto de estudo no futuro. A filmagem de processos cênicos, espetáculos, entrevistas com atores e diretores pode ser tornar documento importante para historiadores", argumenta Mocarzel. E pode ser útil não só para pesquisadores de teatro, mas de outras áreas do conhecimento.   Já estão em fase de finalização dois longas que ele realizou com o grupo Teatro da Vertigem, dirigido por Antonio Araújo: um mostra na íntegra o espetáculo BR3, encenado no Rio Tietê, e outro retrata a preparação da montagem. Ele deseja ainda documentar o trabalho do diretor Sérgio de Carvalho e dos atores da Cia. do Latão em assentamentos do MST e já está em fase de captação para um filme em Pernambuco envolvendo a Cia. Os Fofos Encenam, de Newton Moreno.   Faz nove dias que Evaldo Mocarzel está em Curitiba. Veio bem antes das apresentações de Vestido de Noiva - domingo e segunda - para filmar o processo de criação de A Fauna, um espetáculo realizado pelo grupo com moradores do bairro Vila Verde, na periferia da cidade. Era para ser parte do filme, mas ganhou tal dimensão que será um longa à parte. Como já acontecera com o Vertigem, Mocarzel fará dois longas sobre o trabalho dos Satyros. "São documentários bem diferentes, até na linguagem. Em Vila Verde eu não fiz entrevistas, não dei um pio, fiz o chamado documentário de observação, no qual a câmera fica permanentemente ligada, até que deixa de ser percebida. Assim se consegue captar o processo de ensaios, de criação cênica, sem aquele artificialismo que automaticamente ocorre quando alguém fala ou age diante de uma lente. E não estou falando em câmera oculta, mas da que se torna invisível pela presença constante", explica.   O cineasta vai intervir, com entrevistas, no documentário sobre a atuação dos Satyros, que também começou a ser gravado no festival de Curitiba. Mocarzel deu muita sorte ao filmar o que seria a primeira apresentação de Vestido de Noiva, no domingo, interrompida por problemas técnicos. "Eu sofri com a angústia dos atores", diz. Mas é evidente que ter filmado uma pane enriquece um documentário sobre o teatro, onde o imponderável é parte do jogo.   Espetáculo iniciado, falha o projetor. "Rodolfo subiu ao palco, pediu cinco minutos para o reparo. Mas olho para o projetor e vejo alguém que alguém tenta consertar com uma chave, não de fenda, de carro mesmo. Tudo sendo filmado, a angústia dos atores, o zumzum na platéia, a solidariedade do público." Subitamente, o projetor volta a funcionar. Por dez minutos apenas. E a sessão é interrompida. "Um sujeito começa a gritar na platéia, a culpar o festival. Norma Bengell aparece no palco chorando, diz que o grupo tentou fazer o seu melhor e o festival também, o público aplaude. Foi terrível, claro, mas o documentário ganhou pathos, dramaticidade."   Em Curitiba, Mocarzel filmou também ensaios, bastidores. Planeja ainda uma série de entrevistas com o diretor, o dramaturgo Ivam Cabral - ambos fundadores do grupo em 1989 - e com os atores. Para tornar lúdicas e teatrais as conversas, vai criar um cubo feito de espelhos, diante dos quais os atores vão falar de seu trabalho, uma brincadeira com a auto-imagem dos atores. Também vai acompanhar o processo de criação de Liz, peça do cubano Reinaldo Monteiro, que estréia no Festival de Havana, em junho.

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