Documentário enfoca conflito pelo olhar de crianças

Promessas de um Novo Mundo, que estréia nesta sexta-feira, discute a tolerância a partir de entrevistas com crianças israelenses e palestinas

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Por Agencia Estado
Atualização:

Diante do recrudescimento do conflito entre palestinos e israelenses, dificilmente um filme seria tão oportuno quanto este Promessas, uma direção conjunta de Carlos Bolado, Justine Shapiro e B.Z. Goldberg. O documentário trabalha na zona quente da guerra e busca um enfoque novo, pelo olhar das crianças que lá vivem. Os documentaristas entrevistam crianças palestinas e israelenses, com idades entre 7 e 11 anos. Falam com elas individualmente, depois em grupo. Mostram depoimentos dos israelenses para os palestinos e vice-versa. No final, promovem um encontro entre elas. Quando um documentarista, ou um ficcionista, busca o olhar infantil, o que está querendo, de fato, é o olhar desarmado, e em tese sem preconceitos. Essa visão idílica da infância está ausente no filme. Pelo contrário, o que mostra de mais impressionante, pelo menos num primeiro momento, é a maneira como os espíritos já estão armados desde cedo. As crianças aprendem dos pais a quem devem detestar. Quem são seus oponentes, seus inimigos inconciliáveis. As idéias de pátria e de exclusão se forjam na infância - e com muito mais força se existe um conflito ancestral para dar consistência ao ódio recíproco. Também é interessante verificar como esses sentimentos não são uniformes. Por exemplo, algumas crianças israelenses têm alguma abertura prévia para o diálogo com os palestinos, mas isso não acontece com o filho de um religioso fundamentalista. Provavelmente por influência do pai, esse menino será sempre o menos disposto ao diálogo, o de convicções mais firmes e imutáveis. No conjunto do filme, é um estudo de caso particular sobre a maneira como se fabrica um radical. Os outros garotos podem não ser tão jacobinos assim, mas o fato é que os preconceitos de uns contra outros já parecem bem arraigados. Só balançam, ou se desfazem, durante o encontro promovido pelos cineastas. Então conseguem conversar, discutir e até brincar. Afinal, são apenas crianças e não têm, ou não deveriam ter, nada com as ancestrais confusões do mundo dos adultos. Podem então falar de amenidades e até de futebol, quando o espectador descobre que, apesar de tudo, a seleção brasileira ainda é a favorita entre eles. O documentário é explicitamente "do bem" e consegue abalar esses preconceitos de uma maneira tão esperta quanto simples: como se sabe, esses ódios são coletivos e não resistem muito ao confronto com a individualidade. Assim, Goldberg conversa com muita desenvoltura com um menino palestino que lhe assegura que nenhum israelense é confiável. Ao que o cineasta responde que ele mesmo, Goldberg, é israelense. Ora, é uma exceção e, aberta a exceção, pode-se ter esperança de um dia desmontar esse silogismo do terror. Promessas não se propõe a fazer uma análise do conflito. Não toma partido nem procura saber quem tem razão ou quem começou primeiro. Por esse ângulo, a discussão seria interminável, provavelmente inútil. Procura apenas mostrar o absurdo da divisão entre pessoas que teriam muito a ganhar com a convivência. Faz isso sem nenhuma pieguice, o que, dadas as circunstâncias, é muito difícil. Promessas de um Novo Mundo (Promises). Direção Justine Shapiro, B.Z. Goldberg e Carlos Bolado. Israel-EUA/2000. Duração 90 minutos.

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