Diretora escolhe elenco de filme sobre Cazuza

Daniel de Oliveira, no papel do cantor, e Marieta Severo, no de sua mãe, já estão confirmados; maior dificuldade é encontrar um bom intérprete de Ney Matogrosso

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Por Agencia Estado
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Cazuza não era uma figura fácil na vida real. "Enfant terrible" do rock nacional dos anos 80, ele representava uma fusão de sentimentos e atitudes. Rebelde, contestador, por vezes até intratável, mas também doce e generoso. Nem mesmo a aids abalou sua vontade de viver e continuar produzindo. Para a diretora Sandra Werneck e o produtor Daniel Filho, transformar em filme biográfico a história do polêmico cantor e compositor, que morreu em 1990, será um desafio. Preciso Dizer que Te Amo - música de Cazuza, Bebel Gilberto e Dé, que dará nome ao longa-metragem - está em fase de captação de recursos e deve começar a ser rodado em setembro. Será lançado pela Globo Filmes. Alguns nomes já estão confirmados: o ator Daniel de Oliveira, no papel do músico, a atriz Marieta Severo, como sua mãe (Lucinha Araújo), e os atores que vão encarnar os integrantes do grupo Barão Vermelho. Antônio Fagundes está sendo sondado para interpretar o pai, João Araújo, fundador da gravadora Som Livre. Sandra Werneck afirma, entretanto, estar com dificuldades para encontrar um Ney Matogrosso à altura do original, para seu filme. "O Ney continua tão jovem e tão lindo que não consigo encontrar um ator para interpretá-lo", queixa-se Sandra, diretora de Amores Possíveis. Ney Matogrosso teve um romance com Cazuza e foi amigo do músico até seus últimos dias. O roteiro é inspirado no livro Cazuza - Só as Mães São Felizes, escrito por Lucinha Araújo em parceria com a jornalista Regina Echeverria e publicado em 1997 pela Editora Globo. Na obra, Lucinha faz um testemunho sobre toda a trajetória de seu filho único, desde o nascimento, passando pela adolescência problemática e o despertar para a música, até sucumbir ao vírus da aids, aos 32 anos. Ela dedica ainda um capítulo à Sociedade Viva Cazuza, que fundou logo após a morte do filho e que hoje cuida de 25 crianças portadoras de aids. No filme, o ponto de partida será a adolescência do compositor, marcada pela rebeldia, o envolvimento com as drogas, o relacionamento conturbado com os pais, a descoberta da sexualidade. "A idéia é mostrar o quadro mais completo do artista; Cazuza tinha imagem de brigão, mas aqueles que conviviam com ele dizem que existia o lado mais doce", comenta Douglas Dwight, responsável pelo terceiro tratamento do roteiro. "Vamos retratá-lo como poeta", adianta Sandra. Além do livro Só as Mães São Felizes, a obra do compositor e o depoimento de pessoas que conheceram Cazuza foram usados como referência. Segundo Dwight, foi realizada também uma pesquisa com internautas para saber o que eles gostariam de ver num filme do Cazuza. "Prevaleceram alguns momentos, como o trabalho do músico no Barão Vermelho, o grupo inserido no cenário do rock dos anos 80, a participação deles no Rock in Rio, o episódio do cuspe na bandeira do Brasil e a aids", enumera ele. Rosto desconhecido - Espécie de consultora nessa fase de definição do roteiro, Lucinha Araújo diz que não pretende freqüentar os sets de filmagens. "Mesmo porque meu filho não ia querer que eu me intrometesse." Ela conta que, quando escreveu o livro, nunca tinha pensado que ele poderia virar um filme, mas que as pessoas sempre disseram para ela que o argumento renderia. "No livro, eu não queria só mostrar o lado bom dele. Cazuza falava tudo o que vinha à cabeça, mas ao mesmo tempo era um filho e neto maravilhoso." Lucinha viu um pouco de Cazuza no teste de um dos atores que tentava o papel principal. Certo dia, a diretora Sandra Werneck levou à casa de Lucinha e João Araújo os testes de sete atores numa fita de vídeo, para que o casal assistisse e desse seu aval. De acordo com Lucinha, o primeiro candidato logo chamou atenção dela, mais pelas atitudes do que propriamente pela semelhança física. Já os demais teriam pecado por não saberem o que é ser Cazuza. "Tinha uma cena em que Cazuza ficava sabendo que estava com aids. Esse ator foi o único que teve uma reação parecida com a dele: seus olhos se encheram de água, ele amassou o papel do teste, enfiou na boca, depois o tirou e foi embora", descreve ela. Lucinha, João Araújo, Sandra Werneck, Daniel Filho e outras pessoas da equipe de produção chegaram a um consenso. Entre 50 candidatos, o ator Daniel de Oliveira ficou com o papel. A escolha privilegiou um rosto pouco famoso já que, segundo Sandra, um ator conhecido poderia vir marcado por outros personagens. "Não havia uma determinação em não usarmos atores conhecidos, mas primeiro procuramos atores não tão conhecidos. E foi ótimo, porque excelentes atores se apresentaram e não foi uma escolha fácil", diz o produtor Daniel Filho. Mineiro, Daniel de Oliveira iniciou a carreira no teatro em Belo Horizonte, há dez anos. Namorado de Débora Falabella, a Mel da novela O Clone, ele trabalhou em Malhação durante um ano e meio, e ganhou um pequeno papel nos últimos dois meses da novela A Padroeira. Mas foi atuando na peça de teatro Êxtase que o ator conseguiu a chance de participar dos testes. "O teste foi de improviso, não havia nenhum texto", detalha Daniel. Ele tinha 12 anos quando Cazuza morreu. Hoje, tem 25 anos. Nessa mesma idade, Cazuza, com o Barão Vermelho, ainda batalhava pelo reconhecimento da banda. Para seu "laboratório", Daniel pretende fazer aulas de canto, alugar um apartamento em Ipanema e freqüentar os lugares por onde Cazuza passou, além de ler e ouvir o que ele gostava. Mesmo se dedicando ao personagem, o ator acredita que será uma tarefa difícil. "Vou interpretar uma pessoa que já existe na cabeça das pessoas", justifica. Para a atriz Marieta Severo, o fato de ser um filme biográfico não a obriga a interpretar Lucinha Araújo do mesmo jeito que ela é na vida real. "A Lucinha da ficção é que vai me interessar. O roteiro vai pegar alguma visão dela, dar seu enfoque e eu vou dar o meu." Marieta já leu Só as Mães São Felizes e deverá ter algumas conversas com Lucinha para compor o personagem. "Cazuza sempre me achou muito parecida com a mãe dele", lembra ela. "Tenho uma admiração enorme por ela, da maneira como transformou a dor em generosidade."

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