Diretora artística do festival de cinema do Rio fala sobre as novidades do evento

Ilda Santiago não quer nem ouvir falar em crise

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

E, com outubro, começa a grande temporada dos festivais brasileiros. No Rio, em plena Cidade das Artes, na Barra remodelada pela Olimpíada, começa nesta quinta, 6, o 18.º festival de cinema. Serão 11 dias muito intensos, até 16. Uma pequena pausa e, na sequência, o holofote cinematográfico desloca-se para São Paulo onde, no dia 20, começa a 40.ª Mostra. É o sonho de todo cinéfilo – filmes, grandes filmes. A diversidade do mundo desfilando nas salas de cinema.

Alguns patrocinadores diminuíram o aporte para o Festival do Rio, mas a diretora artística Ilda Santiago não quer nem ouvir falar em crise. “Mantivemos todos os nossos patrocinadores e apoiadores, e isso é muito bom. É um reconhecimento da importância do festival. Na verdade, pode até ser que o dinheiro tenha algo a ver com as mudanças, mas há muito queríamos reestruturar o festival. Já tivemos num ano 400 filmes. É demais. Ninguém consegue ver isso. E se a pessoa vir 100 terá sempre a sensação ruim de que perdeu 300. É injusto.” O que o Rio está fazendo é adequar seu festival ao formato dos maiores eventos de cinema do mundo. Cannes, Veneza e Berlim, todos duram entre 10 e 12 dias. O festival, de 14 dias, agora terá 11. E serão 250 filmes.

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“Mesmo assim, é muita oferta”, avalia Ilda. Mas ela está orgulhosíssima. “Nossa programação deste ano está um luxo. Não apenas estamos trazendo filmes como I Daniel Blake, que venceu a Palma de Ouro, como vamos ter uma Première Brasil gloriosa.” A Première é a grande vitrine do cinema brasileiro. A deste ano terá 35 longas e 13 curtas distribuídos em suas diferentes seções. A seleção contempla diretores já consagrados – Eliane Caffé, Andrucha Waddington, Eryk Rocha, etc. – e estreantes como José Luiz Villamarim e a atriz Leandra Leal. “Nenhuma outra cidade passou por uma transformação urbana tão grande como o Rio, preparando-se para a Olimpíada. E o festival dá conta disso. Estamos abraçando a cidade toda, e este ano vamos transpor a ponte, levando o festival para a Reserva Cultural de Niterói. A inauguração na Barra faz parte dessa descentralização, numa projeção que vai integrar convidados e público, porque colocamos centenas de ingressos à venda.”

Serão 30 pontos de exibições, entre salas, lonas, projeções ao ar livre no Boulevard Olímpico da Praça Mauá e espaços adaptados como a grande sala de eventos do Cidade das Artes. É nesse local que será exibido hoje à noite o novo filme de Denis Villeneuve, A Chegada, com Amy Adams em atuação saudada como digna de Oscar. Nas redes sociais e na própria imprensa dos EUA, Amy é considerada aposta segura no Oscar de 2017. Ilda Santiago não quer nem ouvir falar de destaques de filmes – “É tudo muito bom” –, mas não se furta a elogiar a Première Brasil, as mostras Expectativa e Midnight e uma programação especial. Filme.Doc, só com obras sobre cinema.

Pegando carona no documentário Cinema Novo, de Eryk Rocha, o festival propõe uma espécie de revisão crítica do movimento e ainda outorga um prêmio de carreira a Cacá Diegues. Também homenageia os 15 anos de Lavoura Arcaica projetando a versão restaurada do filme cultuado de Luiz Fernando Carvalho. Outra homenagem – ao crítico José Carlos Avellar, que morreu este ano, e ao centenário do lendário Paulo Emílio Salles Gomes – vai resgatar o clássico que ambos amavam, Ganga Bruta, de Humberto Mauro. E, por falar em resgate, um daqueles filmes míticos, de cuja existências até se podia duvidar – É Um Caso de Polícia, de Carla Civelli, de 1959 –, também terá gala no Rio. Além do Odeon, em plena Cinelândia, o festival reinaugura outro cinema tradicional do centro do Rio, o Roxy, agora com três salas.ENTREVISTA - 'Tenho orgulho do que fiz. E do Cinema Novo' - Cacá Diegues - Diretor Nome histórico do Cinema Novo, Cacá Diegues será homenageado no Festival do Rio com um troféu especial de carreira e a exibição da versão restaurada de A Grande Cidade, de 1966.O que representa esse prêmio de carreira? Não tenho saudade. Não me debruço sobre o passado, mas fico feliz com o reconhecimento. Tenho orgulho do que fiz, de ter integrado a geração do Cinema Novo, onde conheci as pessoas mais interessantes da minha vida. E é isso, a nossa vida, não só a minha, que o prêmio contempla.No documentário de Eryk Rocha, você diz que o AI-5 desmontou o projeto coletivo do Cinema Novo. Como? De 1964 a 68, em plena ditadura, tivemos uma extraordinária efervescência cultural. Tropicália, os melhores filmes do Cinema Novo. E aí veio a consolidação da ditadura com o AI-5. A ditadura nos separou. O sonho coletivo dissolveu-se em projetos individuais.E A Grande Cidade? O filme foi restaurado pelo CNC, na França. O Cinema Novo, compreensivelmente, estava voltado para o sertão e A Grande Cidade vê o sertão da perspectiva urbana. Os nordestinos da cidade grande. É um dos meus preferidos.E o Grande Circo Místico? Estou terminando. Espero lançar em maio do ano que vem. E se der, tentar festivais como Berlim ou Cannes.

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