Diretor e roteirista falam do macaco de ‘Amazônia’, que abre mostra no Rio

Mostra exibirá 350 filmes de 60 países em 30 pontos da cidade

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Festival do Rio, teu nome é gigantismo. O evento de cinema que começa na quinta, 26, e se prolonga até 10 de outubro, com a entrega do troféu Redentor aos vencedores das Premières Brasil e Latina, vai apresentar, ao longo das duas próximas semanas, 350 filmes de 60 países. Distribuídos em 30 seções, serão exibidos em 30 pontos do Rio. E o festival ainda realiza oficinas, promove palestras e seminários, traz convidados importantes. Apesar de tudo isso, a diretora artística Ilda Santiago adverte – o gigantismo do festival está no conteúdo, na qualidade do que vai exibir. “Foi duro, mas conseguimos reduzir um pouco o número de filmes em relação ao ano passado.”

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Como Cannes, o convite para a abertura, amanhã à noite, no Cine Odeon, em plena Cinelândia, exige tenue de soirée ou pelo menos traje social completo, mas no Rio é mais fácil driblar o protocolo e ter acesso ao tapete vermelho com trajes mais informais. Luz, câmera, ação! Como já virou tradição, o Festival abre-se com uma produção brasileira, desta vez uma coprodução – Amazônia é uma parceria da Gullane Filmes com a França, realizada pelo francês Thierry Ragobert, mas escrita pelo brasileiro Luiz Bolognesi. Depois de encerrar o Festival de Veneza, a saga do macaquinho domesticado para sobreviver na Amazônia ganha a tela do Rio – para mostrar quão estreitos podem ser os limites entre documentário e ficção.

Ragobert realizou um documentário que fez sensação nas telas de todo o mundo – O Planeta Branco. Com Amazônia, ele propõe agora O Planeta Verde – e em 3-D, para colocar na tela a grandiosidade cênica com que a mãe natureza vestiu a chamada ‘rain forest’. “O filme não é apenas belo de ver como levanta questões ambientais que são decisivas. Não existe cultura sem patrocínio nem contrapartida social. Que melhor contrapartida do que contribuir para o debate sobre a própria sobrevivência planetária?”, pergunta-se Ilda Santiago. Sua preocupação ecoa no que diz o diretor – “A quarta dimensão do filme é justamente o engajamento nas questões da biodiversidade e sustentabilidade.”

Bolognesi conta que Ragobert foi guerreiro na transformação do projeto inicial. Os produtores franceses tinham a ideia que o atraiu – um macaco da cidade (de circo) perde-se na floresta e tem de reassumir sua natureza para sobreviver –, mas eles pensavam numa aventura para toda a família. Foi durante o processo – e foram sete longos anos até a première, em Veneza – que sugiram tanto a decisão de filmar em 3-D, para favorecer a imersão emocional do público na história e no ambiente, quanto de revestir a trama de ‘camadas’.

“Quando entrei no projeto, levado por Fabiano Gullane, já havia um roteiro, mas ninguém estava muito satisfeito”, informa Bolognesi. “O que fiz foi aprofundar o arco dramático e, para isso, precisei entender o macaco em toda a complexidade do seu comportamento. Fiz pesquisas científicas e também investiguei o macaco na cultura popular, como ele é retratado na imaginação do povo e dos artistas. Câmara Cascudo foi uma ferramenta decisiva. O macaco não é o bicho mais forte da floresta, mas é o mais malandro.”

Uma espécie de Macunaíma da floresta? “Exato. O macaco engana até a onça. Na construção do arco, sua relação com a floresta nos levou a ter de encarar a questão ambiental. Thierry foi fundamental para que o filme ganhasse sua conformação definitiva. É um grande documentarista, mas aberto a voos de imaginação.” O próprio Ragobert destaca que, a despeito das similaridades entre O Planeta Branco e O Planeta Verde (Amazônia), a grande diferença é que o primeiro é 100% documentário e o segundo, 80% ficção.

O casting selecionou 15 macacos que formaram um grupo. Quatro foram escolhidos para o papel do protagonista, mas o filme foi quase todo feito com um só. “Nosso astro precisou de dublê apenas em cenas pontuais. Não gostava de água, por exemplo.” Todos os macacos foram enviados para um santuário do Ibama, mas o astro está num zoo que o instituto possui em Manaus. O longa estreia em 27 de novembro na França e, aqui, no começo de 2014. Amanhã, no Festival do Rio, o público vê antes a Amazônia como nunca foi retratada na tela – Ragobert tem 30 anos de estrada. Começou a fazer documentários com o lendário Jean-Jacques Cousteau. Orgulha-se de Amazônia mais do que de qualquer outro que tenha feito antes.

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Pré-estreias, retrospectivas, há muito para ver

Jean-Thomas Bernardini, da Imovision, que vai distribuir A Vida de Adèle no Brasil, não quis se indispor com o Festival do Rio nem com a Mostra de São Paulo. Nenhum dos eventos vai exibir o longa de Abdellatif Kechiche, mas a verdade é que Adèle, mesmo escolhido por unanimidade pelo júri – palavra de Steven Spielberg –, não foi o melhor filme de Cannes. O Rio apresenta Um Estranho no Lago, de Alain Guiraudie, e São Paulo, A Touch of Sin, de Jia Zhangke, os melhores.

O Rio promove uma retrospectiva de Guiraudie, trazendo ao Brasil o essencial do diretor. Também apresenta uma seleção do melhor do recente Festival de Veneza, incluindo o vencedor do Leão de Ouro, Sacro Gra, de Gianfranco Rosi. Quem espera para antecipar estreias muito aguardadas poderá ver Blue Jasmine, de Woody Allen; Gravity, de Alfonso Cuarón; Jeune et Jolie, de François Ozon etc. Todos na mostra Panorama do Cinema Mundial. O encerramento será com Serra Pelada, de Heitor Dhalia.

A Première Brasil, como sempre, será a menina dos olhos da programação e dos seus longas de ficção e documentários sairão os vencedores do Troféu Redentor. Além das demais mostras já conhecidas (Panorama, Expectativa 2013, Première Latina, Midnight, Midnight Terror e Midnight Música, Gay, Fronteiras, Dox, Filme Doc, Geração, Itinerários Únicos e Meio Ambiente), o festival reinventa-se com novas seções como o Panorama Grandes Documentários, com filmes de Ratty Pahn, L’Image Manquante, que venceu a mostra Un Certain Regard, em Cannes, e Claude Lanzmann, O Último dos Injustos. Foco na Alemanha, retrospectivas de Paul Schrader e Claire Simon, clássicos restaurados de Alfred Hitchcock. há de tudo, para todos. Uma festa de cinema.

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