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"Diários de Motocicleta" chega hoje aos cinemas

Selecionado para o Festival de Cannes, filme sobre viagem de iniciação do jovem Ernesto Guevara é o mais belo da carreira de Walter Salles

Por Agencia Estado
Atualização:

Será um lançamento médio. Considerando-se a qualidade do filme e a mídia que está tendo por concorrer no Festival de Cannes, que começa na quarta-feira, dia 12, podia-se estimar que Diários de Motocicleta estreasse hoje com mais do que as 68 cópias com que vai circular pelo País. Prevaleceu a vontade do diretor. Walter Salles não quer arriscar um lançamento de blockbuster porque acha (ou sabe) que seu filme não tem esse perfil. Mas você ainda vai ouvir falar muito de Diários. O filme sobre o jovem Ernesto Guevara e sua viagem de moto (com Alberto Granado) pela América Latina será exibido em Cannes no dia 19. Diários é um filme latino-americano? Feito com capitais da Inglaterra e da França, é latino no sentimento. Salles conseguiu apoio de Robert Redford, que foi quem lhe ofertou o projeto, para que Diários fosse falado em castelhano. Filmou em mais de 30 locações da Argentina, do Chile e do Peru, com a participação de equipes de todos esses países. Ao refazer o roteiro de Ernesto Guevara em 1952, em sua viagem de descoberta da América Latina, o diretor de Central do Brasil admite que descobriu (e assumiu) sua latinidade. Fez o filme menos esteticista e o mais belo de sua carreira. Cacá Diegues não exagerou ao dizer ao Estado, na segunda-feira, que Diários de Motocicleta é um dos melhores filmes feitos em todo o mundo, nos últimos anos. O medo de Salles é que Diários seja superdimensionado e termine banalizado. Ele jura que não faz gênero quando diz que foi uma surpresa a seleção do filme para concorrer em Cannes. "Diários não tem o perfil do filme de festival, não foi feito com essa preocupação." Na bilheteria, Salles também confessa que está menos preocupado com a quantidade do que com a qualidade do público. "É um filme de um recorte intimista, delicado. Foi feito com carinho, mas também exige um público que seja terno com ele." Tanto se fala agora no jovem Che do seu filme que há o risco de que Diários de Motocicleta seja visto como uma hagiografia - seria a biografia de um santo. "A idéia não foi essa e, sim, a de usar a viagem de iniciação como metáfora de algo que me interessa muito - a construção da ética." Salles ficou seduzido com o projeto apadrinhado por Redford no Festival de Sundance. A sedução não foi só dele. Muitos foram os atraídos pela revelação da paisagem geográfica e humana da América Latina e também pela experiência dos dois jovens que viajam por essa realidade. O roteirista José Rivera, os atores Gael García Bernal e Rodrigo de la Serna, que fazem Ernesto e Granado, todos foram tocados pelo humanismo radical da história e dos personagens. "Não é só Ernesto, mas o Granado. A história me fascinou porque é vista do ângulo dele." É por meio do olhar do próprio Granado, no desfecho, que Salles, contrariamente ao que diz, faz de Diários de Motocicleta um filme, afinal, sobre o Che e o mito do eterno revolucionário. Originalmente, os créditos finais incluíam a entrevista que o diretor fez com Granado em Havana. Ele achou que repetia o que o filme já mostrara. A cena tomou a forma que tem agora. Há um certo olhar que vira a chave de tudo. Esse final, você precisa ver para descobrir do que se trata, faz uma diferença imensa. O homem Guevara foi assassinado na Bolívia, em 1967. O mito do Che, que transcende o homem, permanece e é até engrandecido em Diários de Motocicleta, o que não pode ser considerado um defeito. A construção de sua ética vira promessa de uma nova utopia e isso é maravilhoso numa época de descrença como esta.

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