PUBLICIDADE

Desencanto e amargura em "O Príncipe"

Filme de Ugo Giorgetti, que estréia nesta sexta-feira, tem como ponto de partida a constatação de que tudo deu errado

Por Agencia Estado
Atualização:

É o filme mais amargo e desencantado de Ugo Giorgetti e não se pode dizer que ele não tenha razão. Qualquer pessoa sensata que queira pensar o País hoje terá de iludir-se muito para achar que está dando tudo certo. O ponto de partida de Giorgetti em O Príncipe, que estréia amanhã, é que deu tudo errado. É a conclusão a que chega o personagem de Eduardo Tornaghi, ao voltar ao Brasil, depois de um auto-exílio de 20 anos em Paris. Não seria difícil concordar com o diretor se ele fosse um pouquinho mais generoso - com o espectador, se não exatamente com seus personagens, que não são mais sombra do que queriam ser nos anos 1960, quando, com certeza, sonhavam em mudar o mundo. Giorgetti não vê motivos para resgatar essas pessoas, nem mesmo o cínico jornalista interpretado por Otávio Augusto, por meio de uma seqüência magnífica como aquela que constituía o episódio de Paulinho Majestade, o jogador decadente que mantém a classe na pobreza, em Boleiros. É o xis da questão. O Brasil vulgarizou-se. Giorgetti, como homem e artista, não agüenta mais a balbúrdia dos barzinhos de rua na Vila Madalena nem o discurso de marqueteiros como aquele criado por Ewerton de Castro. Seria mais eficiente se não tivesse substituído a indignação pela impotência. É o sentimento do diretor neste finalzinho de mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso. Talvez não seja por acaso, por menos que Giorgetti insista em não fazer a ponte entre o presidente-príncipe e o seu protagonista, um intelectual que, ao proclamar-se "príncipe da náusea", une Maquiavel e Jean-Paul Sartre. O grande problema de O Príncipe está na cena dos sem-teto na Praça Dom José Gaspar. É o emblema da cosmetização da realidade que os críticos abrigados sob a bandeira levantada pela pesquisadora Ivana Bentes denunciam no cinema brasileiro, hoje. Para eles, Walter Salles e Andrucha Waddington substituem a estética da fome do Cinema Novo pela cosmética da fome. Há uma cosmética da miséria em O Príncipe, como se a direção de arte tivesse assumido o controle da produção, naquela cena. Ou como se Giorgetti, que nunca foi disso, se lembrasse de que também veio da publicidade.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.