Depois de uma longa hibernação, os cinemas dos Estados Unidos acordam num fim de semana crucial

Mais americanos irão aos cinemas neste fim de semana como não se viu desde que a pandemia provocou o fechamento das salas em março

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Por Jake Coyle
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STAMFORD, CONNECTICUT– Com a estreia de novos filmes, um pequeno número de cinéfilos com máscaras foi assistir ao lançamento de Tenet, nos Estados Unidos, no Bow Tie Majestic 6, no centro de Stamford, Connecticut. Eles ocuparam seus assentos na noite de terça-feira, separados um do outro e um pouco inebriados com sua volta à sala de cinema pela primeira vez em meses. Philip Scarante e Andy Flore, ambos com 25 anos de idade, iam religiosamente todas as terças-feiras ao cinema, antes de as salas serem fechadas em março. “É a nossa praia” disse Scarante. Assistir ao mais recente filme de Nolan numa pequena tela não é nada atrativo. “Todo mundo está usando máscara”, observou ele, olhando a sala com poucas pessoas. “Não esperava que muita gente viesse”.

O filme 'Tenet', da Warner Bros., exibido em um cinema AMC na Virgínia do Norte, EUA, em 2 de setembro de 2020. A rede AMC planeja reabrir 70 por cento de seus cinemas nos EUA para acomodar o blockbuster de ficção científica. Foto: EFE/EPA/JIM LO SCALZO

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Neste fim de semana mais americanos irão ao cinema, como não se via desde que a pandemia provocou o fechamento das salas em março. Depois de algumas semanas de filmes catalogados e lançamentos sem importância, Tenet, uma produção de US$ 200 milhões, é o primeiro lançamento imprescindível no cinema, um mega filme que será um teste decisivo para se ver o quão dispostos estão os cinéfilos a retornarem às salas.

Ao mesmo tempo, um outro filme de US$ 200 milhões, o remake de Mulan, da Walt Disney & Co., está estreando não nos cinemas, como estava previsto originalmente para ser lançado em março, mas no serviço de streaming Disney+. Mulan estará disponível pelo preço de US$ 30 somente para assinantes do Disney+.

Cada um dos filmes deve traçar um novo caminho para Hollywood na era da covid-19, e talvez depois. Tenet, que registrou uma bilheteria de US$ 53,6 milhões em 41 territórios internacionais no último fim de semana, pode provar que os blockbusters que levam o público ao cinema conseguem ser ressuscitados com cinemas em meia capacidade e protocolos de segurança – ou que as pessoas ainda não estão dispostas e se sentar no escuro com estranhos ao lado.

Mulan poderá abrir uma janela no campo do serviço on-demand para as maiores franquias de filmes ou provar que grandes bilheterias (a projeção para Mulan era de obter uma receita de US$ 750 milhões nos cinemas) não se repetem no cinema em casa.

O fim de semana do Dia do Trabalho, que normalmente é um dos mais inertes nos cinemas se transformou num dos momentos mais dramáticos, com o destino da indústria cinematográfica em jogo, quando dois experimentos caros testarão as possibilidades de uma nova realidade.

'Mulan', à esquerda, e 'Tenet'. Dois caminhos divergentes para a indústria cinematográfica se chocam em um fim de semana. Foto: Jasin Boland / Disney via AP, à esquerda, e Melinda Sue Gordon / Warner Bros. Entertainment via AP

“O mundo neste exato momento, o conceito de lançar o filme em todos os lugares para todo mundo ir e assistir no mesmo fim de semana, não é de modo nenhum uma opção num futuro previsível”, disse Nolan numa entrevista. “Assim se levar o setor para diferentes maneiras de pensar ealguns deles sendo modelos de distribuição mais antigos, temos esperança que isto funcione”.

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A Warner Bros está lançando Tenet onde consegue. Depois do seu lançamento na Europa, Canadá e Coreia do Sul no fim de semana passado, o filme pode ser visto em 75% dos cinemas abertos nos Estados Unidos, junto com os da China, na sexta-feira. Alguns Estados, como Nova York, mantêm os cinemas fechados, contudo mais cinemas estão chegando online em tempo para Tenet. Nova Jersey e algumas salas na Califórnia devem reabrir na sexta-feira.

O vigoroso lançamento internacional do filme de Nolan provou que muitas pessoas estão ávidas para retornar às salas. Mas no caso dos Estados Unidos a história é diferente. Embora os casos e mortes por causa da covid-19 estejam diminuindo, ainda são muito mais elevados do que em muitas partes do mundo. O número de contaminados se aproxima dos seis milhões, com mais de 180.000 óbitos. Epidemiologistas estão mais preocupados com a reabertura das escolas, mas continuam cautelosos no tocante a grandes aglomerações em espaços internos.

Por outro lado, os responsáveis pelas salas de cinema estão ligados no seu sustento. Novos produtos, dizem, são fundamentais para sobreviverem à pandemia. O Bow Tie Cinemas, de Connecticut, aberto no início do verão, foi depois fechando quando grandes estreias foram adiadas. Na estreia de Tenet na terça-feira, Trudy e Phil Davies, com um saco de pipoca entre eles, disseram ter ido ao cinema para “terem a chance de fazer algo diferente”, mas também para contribuírem para a recuperação.

Por mais difíceis que sejam as circunstâncias do momento, a Warner Bros também vê uma oportunidade. Tenet não tem concorrentes nos cinemas e será exibido continuamente durante meses. Tem a tela grande toda para ele. Em um cinema do Boston AMC, o filme vem sendo exibido 86 vezes de sexta-feira a domingo. A Disney lançou outros pequenos filmes nos cinemas (Os Novos Mutantes da Fox, A História Pessoal de David Copperfiel da Fox Searchlight), mas até agora aditou ou enviou para o serviço de streaming seus filmes de maior envergadura. Como Hamilton, Mulan será usado para impulsionar a base de assinantes de mais de 60 milhões do Disney+. Ao anunciar o plano de lançar o filme no mês passado, o diretor executivo Bob Chapek qualificou a medida de “exceção”.

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“Não vemos isto como uma nova janela, mas uma oportunidade de aprender”, disse Catheleen Taff, diretora de distribuição da Disney. “A única coisa que aprendemos com a pandemia é que não podemos ser inflexíveis. Temos de ser fluídos”. A medida não agradou os proprietários das salas de cinema, mas foi respaldada por Wall Street. Benjamin Swinburne, analista do Morgan Stanley em nota aos investidores, disse que vê o serviço on-demand premium “estruturalmente benéfico no longo prazo para os estúdios de cinema e provavelmente menos perigoso para se assistir a um filme”.

De que maneira as coisas podem avançar, é o que todos perguntam, mas os lançamentos de Tenet e Mulan devem demorar muito para permitir uma redefinição dos negócios com filmes em meio a uma turbulência social e tecnológica. É o que veremos no caso de filmes na fila de espera, como Mulher Maravilha 1984 (com estreia prevista para dois de outubro), Viúva Negra, da Marvel (seis de novembro) e Soul, filme de animação da Pixar (20 de novembro).

Pronto para assistir a Tenet, Jose Alvarez, jovem de 20 anos de White Plains, Estado de Nova York, estava emocionado em retornar à sala de cinema. “Filmes são fascinantes e economizamos muito dinheiro porque estamos fechados em casa”, disse ele, com sua máscara embaixo do queixo. “Não há muita coisa para se fazer. E ficar fechado em casa não é bom para a saúde”.

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TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

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