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Crime encoberto é tema de Mentiras Sinceras e Fora de Rumo

A trama dos dois filmes em cartaz gira em torno das conseqüências de um crime na vida de um casal

Por Agencia Estado
Atualização:

Quando as mentiras sinceras ficam fora de rumo. Dois filmes em cartaz permitem que se faça uma interessante ponte para falar nos temas da responsabilidade e da culpa. São obras diferentes em técnica, estilo e intenção. Uma é boa - Mentiras Sinceras, que assinala a estréia do roteirista Julian Fellowes, de Assassinato em Gosford Park, na direção. A outra, apelativa, é Fora de Rumo, de Mikael Hafstrõm. Em ambos, e por diferentes motivos, a trama gira em torno do encobrimento de um crime e suas conseqüências na vida de um casal. Mentiras Sinceras baseia-se no livro A Way through the Wood, de Nigel Balchin, e o próprio Fellowes, que recebeu o Oscar de roteiro pelo filme de Robert Altman, diz que deve a indicação a uma amiga, que sabia o que ele estava procurando para sua estréia na direção. Fellowes queria criar o que define como labirinto moral, um daqueles filmes que avançam sem que o espectador tenha certeza de nada. As pessoas boas fazem coisas ruins; as ruins fazem coisas boas e a melhor das intenções pode levar ao maior dos desastres. Foi assim que ele desenvolveu a história desse casal, James e Anne Manning. Interpretados por Tom Wilkinson e Emily Watson, ambos parecem levar uma vida feliz, mas aí surge o personagem de Rupert Everett, um aristocrata arrogante chamado Bill Bule. Ocorre um acidente, um homem é atropelado (e morre). James Manning suspeita de Bill Bule, a quem pressiona. Descobre que, na hora do acidente, Anne estava com ele. E mais - que Anne estava na direção e é amante de Bule. O mundo organizado de Manning começa a ruir. Ele, que queria entregar Bule à polícia, agora quer encobrir o crime da mulher. A situação torna-se insustentável. Anne sai de casa, mas isso é só parte da trama, que se passa em rigorosos 90 minutos, sem que todos esses acontecimentos precisem ser atropelados. Há um investigador - que, curiosamente, é negro em ambos os filmes - e, embora a investigação seja importante em Mentiras Sinceras, não é ela o que mais importa e sim as cenas desse casamento que implode, a pusilanimidade do marido, sempre tentando ajudar, preservar, encobrir e cada vez piorando a situação. Numa cena, James Manning diz as frases decisivas - "Somos destruidores. Fazemos escolhas. As melhores possíveis, cheias de amor, e não vemos o mal que causamos." É a síntese do que Fellowes quer dizer. O adultério, o encobrimento do crime, tudo se presta para que ele encontre seu verdadeiro tema - a morte de ideais que se corrompem e degradam. Não é por acaso que o filme começa e termina num cemitério. No começo, a câmera só passa por ele. No fim, permanece. Atração fatal Tom Wilkinson e Emily Watson são ótimos e Rupert Everett traz para o papel aquela insolência que lhe é característica. Como bom aristocrata, ele sabe seu lugar na sociedade e humilha Wilkinson, da mesma forma como no passado fez a denúncia que levou à prisão do homem que morre em Mentiras Sinceras. Everett tenta se justificar, mas Wilkinson cospe as palavras - nenhum deles tem moral para atacar quem quer que seja. É um belo filme, forte, denso, perturbador, sem nada supérfluo. É muito melhor do que Fora de Rumo, no qual Clive Owens faz um homem casado, mas cuja vida não é tão perfeita assim. Seu emprego como publicitário não é o de seus sonhos, o casamento, também, mas a mulher e ele estão presos à filha, que sofre de diabete. Entra em cena esta mulher que Owens conhece no trem, interpretada por Jennifer Aniston, do seriado norte-americano Friends (e ex de Brad Pitt). Sentem-se atraídos, vão parar num hotel vagabundo cujo quarto é invadido por um sujeito que agride Owens e violenta Jennifer. Ele quer ir à polícia, com todas as conseqüências daí decorrentes. Ela o convence de que o crime deve ser encoberto e aí o agressor ressurge para chantagear Owens. Nada é o que parece ser. O mundo é sórdido, a humanidade não presta e é tudo parte de uma nova atração fatal formatada para que o herói, fora de rumo, mate em defesa da família. O que é sincero nas mentiras do outro filme, aqui deixa de ser. Clive Owens é bom ator demais para não saber escolher seus papéis. Fora de Rumo (Derailed, EUA/2005, 107 min.). Suspense. Dir. Mikael Hafstrõm. 16 anos. Em grande circuito. Cotação: Ruim. Mentiras Sinceras (Separate Lies, Ing/2005, 85 min.). Drama. Dir. Julian Fellowes. 14 anos. Unibanco Arteplex 8 - 14h, 16h, 18h, 20h, 21h50 (sáb. também 0h; 2.ª não haverá 21h50). Cotação: Ótimo

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