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Cresce importância do festival de cinema do Recife

Em nove anos, o Cine PE Festival estabelece-se como o mais popular do país e marca a edição 2005 premiando Do Luto à Luta, de Evaldo Mocarzel

Por Agencia Estado
Atualização:

O Cine PE Festival do Audiovisual 2005, em apenas nove anos, estabeleceu-se como o mais popular do País, graças à platéia entusiasmada que lota as sessões no Cine-Teatro Guararapes. Na sala, montada no Centro de Convenções de Olinda, cabem 2.205 espectadores sentados, mas o público chega não raro a 2.800 e até 3 mil pessoas. O público vibrou com a vitória de Do Luto à Luta, de Evaldo Mocarzel, que ganhou o Kalunga de melhor documentário do júri oficial e o de melhor filme para os críticos, somando a esses troféus outros cinco - melhor direção, fotografia, montagem, prêmio do público e melhor filme no cômputo geral. O documentário sobre Síndrome de Down provocou verdadeira comoção no Recife, sendo muito aplaudido durante a exibição oficial e nesta terça-feira, quando foram anunciados os prêmios. Os documentários, realmente, deram de dez a zero nas ficções, no Recife. Foram três documentários e quatro ficções. Qualquer um dos documentários - Do Luta à Luta, de Evaldo Mocarzel; Aboio, de Marília Rocha; Soy Cuba! - O Mamute Siberiano, de Vicente Ferraz, poderia ambicionar o prêmio máximo do Recife. O problema é a divisão entre documentários e ficções. Atribuindo um prêmio de documentário, o festival se arrisca a dar exposição excessiva a uma má ficção, que poderá ficar com as glórias de grande vencedora do evento em 2005. O som foi outro problema do Festival do Recife, que não é mais chamado assim porque por causa de um litígio que obrigou seu diretor, Alfredo Bertini, a trocar de nome. Apesar de todos os cuidados tomados pela organização, o som foi quase sempre péssimo. Bertini ocupa atualmente a Secretaria de Turismo do Recife e sua mulher, Sandra Bertini, assumiu a direção-geral do evento. Sandra tem formação de economista. Fez um festival marcado pela eficiência, mas com alguns percalços que, no fundo, não decorreram dela. Agora é o caso de, no próximo ano, a organização rever o regulamento e unificar de vez a competiçào, como já fazem os grandes festivais internacionais. A melhor ficção foi a que encerrou o Cine PE -Cabra-Cega, de Toni Venturi, sobre a guerrilha que, durante a ditadura militar, quis mudar o Brasil pela via armada, mas como ela passou fora de concurso o júri deu o Kalunga da categoria para Bens Confiscados, de Carlos Reichenbach, que não é melhor de coisa nenhuma. O melhor foi mesmo o filme de Mocarzel, aplaudido 30 vezes em cena aberta. O próprio diretor define Do Luto à Luta como um filme de utilidade pública. Trata da Síndrome de Down e convida os espectadores a se despirem de seus preconceitos para olhar os downianos - outrora chamados de mongolóides - de uma outra maneira. Eles possuem um cromossomo a mais. Têm um desenvolvimento mais lento, mas podem fazer tudo, como diz uma das entrevistadas e com certeza estão querendo se habilitar para a vida, o amor, o sexo, o casamento, o mercado de trabalho. Isso implica em fazer com que as pessoas ditas ´normais´ revejam suas posições em relação a eles. Confira os principais prêmios: MELHOR FILME: Do Luto à Luta /Evaldo Mocarzel MELHOR DOCUMENTÁRIO: Do Luto à Luta FILME DE FICÇÃO: Bens Confiscados/Carlos Reinchenbach MELHOR DIREÇÃO: Do Luto à Luta/Evaldo Mocarzel ROTEIRO: Soy Cuba (RJ)/Vicente Ferraz/Luciano Castilho ATOR: No Meio da Rua/Guilherme Vieira e Cleslay Delfino MELHOR ATRIZ: O Cerro do Jarau (RS)/Lu Adams MELHOR ATOR COADJUVANTE: O Cerro do Jarau (RS)/Miguel Ramos ATRIZ COADJUVANTE: No Meio da Rua/Maria Mariana Momenrat MELHOR FOTOGRAFIA: Do Luto à Luta (SP)/Carlos Ebert DIREÇÃO DE ARTE: O Cerro do Jarau (RS)/Eduardo Antunes MELHOR MONTAGEM: Do Luto à Luta (SP)/Marcelo Moraes MELHOR SOM: Aboio (MG)/Bruno do Cavaco/O Grivo TRILHA SONORA: Aboio (MG)/Cordel do Fogo Encantado/Naná Vasconcelos/Grivo JÚRI POPULAR: Do Luto à Luta (SP)/Evaldo Mocarzel CRÍTICA: Do Luto à Luta Na segunda-feira à noite, foi exibido o último longa de ficção concorrente. Havia expectativa por No Meio da Rua. O diretor, afinal, é o mesmo Antônio Carlos de Fontoura (antes era só Fontoura) que fez dois clássicos, Copacabana Me Engana e A Rainha Diaba. Bem - não é o mesmo. O Fontoura da grande fase lançava um olhar crítico sobre a classe média e a criminalidade urbanas. O atual, após uma longa passagem pela TV, faz o que parece um episódio rejeitado de Cidade dos Homens. Um garoto rico vive cansado com o excesso de tarefas com que os pais o sobrecarregam, na tentativa de prepará-lo para o competitivo mercado de trabalho deste mundo global. O garoto liga-se a um menino de rua. Descobre um outro mundo para que o diretor possa fazer a ponte entre o asfalto e a favela. O desfecho até que é razoável, mas não redime um filme na maior parte do tempo folclórico e vítima do seu desejo de ser apaziguador das tensões sociais. Para não dizer que é tudo ruim, os dois garotos são ótimos. O equívoco é do diretor e, talvez, da organização do festival, que selecionou um filme sem perfil para integrar uma mostra do porte da do Recife. O grande barato deste festival é o público, mas o Recife arrisca-se a criar uma ditadura do público. Por mais caloroso que seja (e é), ele prefere as comédias, as piadas visuais e verbais, as explosões de violência e as frases feitas - todas aplaudidas em cena aberta -, em detrimento de uma reflexão mais serena. Não se trata de ir contra o público. Ainda bem que existe a massa de espectadores do Recife, todos entusiastas do cinema brasileiro, mas apenas atentar para o risco que a necessidade de agradar a esse público encerra. Os longas de ficção que concorreram nesta edição: Esses Moços, de José Araripe Jr.; O Cerro do Jarau, de Beto Souza; Bens Confiscados, de Carlos Reichenbach; e No Meio da Rua.

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