Cotada ao Oscar, Amanda Seyfried se afastou de Hollywood e há anos vive realizada numa fazenda

Atriz participou de 'Mank', filme de David Fincher produzido pela Netflix

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Por Kyle Buchanan
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As cabras não queriam sair de manhã, disse Amanda Seyfried. Uma delas em particular deu um problema, que ela descreveu como “enorme, só Deus sabe”. E não conseguia movê-la do lugar. O que ela fez? Foi ao estábulo, firmou os pés e a empurrou. Claro que a cabra resistiu. É o que acontece com cabras: elas são teimosas. E têm chifres – e Seyfried, uma atriz de 34 anos, não tem. Foi frustrante, exaustivo. E foi também fantástico, acrescentou.

A atriz Amanda Seyfried em sua fazenda, no interior do estado de Nova York Foto: Molly Matalon/The New York Times

Esta é uma das principais razões pelas quais Amanda vive numa fazenda em Catskills. Em vez de um condomínio supercaro em Sunset Strip, uma briga pela manhã com suas cabras tem a capacidade de colocar tudo em perspectiva. “É insano o quanto me sinto realizada e bem-sucedida aqui sem precisar estar num filme de sucesso”, disse. Amanda compartilha a fazenda com galinhas, cavalos dos mais variados portes, um jumento chamado Gus, as cabras, seu marido, o ator Thomas Sadoski, e dois filhos. Durante uma semana de bate-papos pelo Zoom, ela não usava nenhuma maquiagem e não parecia mais velha do que a bela, mas estúpida, garota que interpretou em Meninas Malvadas (2004) ou a noiva cantora de Mamma Mia (2008). Mas hoje ela é mãe de duas crianças, fazendeira e, pela primeira vez em sua carreira, uma séria concorrente ao Oscar. No novo drama da Netflix, Mank, dirigido por David Fincher, com estreia marcada para esta sexta, 4, ela faz o papel de Marion Davis, estrela de cinema dos anos 1920 e 1930 conhecida hoje como a amante do magnata da mídia William Randolph Hearst. É um relacionamento que foi levado ao cinema por Orson Welles em Cidadão Kane, e Mank é uma crônica desse processo, quando o roteirista Herman Mankiewicz (Gary Oldman) recorda os anos que passou em festas na propriedade de Hearst em San Simeon, uma reluzente Shangri-lá, onde se tornou um confidente de Marion Davies. Amanda tem algumas cenas em Mank, mas interpreta Marion Davis de modo matreiro e autoconsciente, uma jovem insolente, sem afetação, do Brooklyn, que se deixa levar para um castelo por Hearst e está determinada a tirar o maior partido disso. Davies parte para festas, bebe demais e com frequência diz coisas erradas, mas quando diz algo errado em círculos da mais alta classe isso significa que você ouve histórias sobre homens ricos que, na verdade, não são bons para a garota. Apesar dos sucessos anteriores, Amanda Seyfried ainda ficou chocada quando deparou com Quentin Tarantino no aeroporto recentemente, e ele sabia quem era ela. “Modere suas expectativas e você terá agradáveis surpresas”, disse-me ela. No ano passado, quando seu agente lhe disse que Fincher havia pensado nela para Mank, os olhos dela se encheram de lágrimas. “É maravilhoso ser respeitada por alguém que você considera um mestre único no seu campo”, afirmou. Numa entrevista por telefone, Fincher comparou Amanda a Cameron Diaz – uma comediante que sempre foi capaz de dar mais de si, mesmo que raramente peçam por isso. “Todos sabíamos que ela era luminescente, que era efervescente, que ela era divertida. Sabíamos que ela sabia como analisar cada palavra, ou fazer uma piada, e que conseguia ser comovente. Acho que o que surpreendeu no final foi o quão rapidamente ela conseguiu se superar em tudo isso, dando a Marion Davies uma outra dimensão”, afirmou. Fincher é famoso por fazer dezenas e dezenas de tomadas de uma cena, um processo que frustra artistas acostumados a dizer suas frases e partir para outra. Amanda considerou o método de Fincher um sonho. Finalmente ela tinha espaço para ver do que era capaz. “Era a minha vez. Era eu”, contou. O que levou Amanda a ser atriz? “Ainda venho discutindo isso com meu terapeuta”, afirmou. Mas vê muito dela na sua filha de 3 anos, Nina, uma garota criativa, rápida para se expressar e ávida por afirmação. Ser mãe com frequência leva Amanda a fazer uma retrospectiva da sua própria vida, e a partir do seu posto de observação privilegiado nas Montanhas de Catskills, no Estado de Nova York, as coisas parecem um pouco diferentes agora. Depois de uma infância feliz em Allentown, na Pensilvânia, onde seu pai, louco por cinema, adorava as comédias de O Gordo e o Magro e clássicos como Nosferatu, ela passou seus anos de adolescência indo para Nova York para gravar episódios de novelas, como As the World Turns e All My Children. Algumas atrizes levam uma eternidade para ter seu primeiro sucesso. O primeiro filme de Amanda foi Meninas Malvadas. Um início bastante estimulante para alguém que ainda tenta se descobrir. Tudo o que Amanda sabia na época é que adorava a atenção, adorava ganhar um sorriso e fazer com que as pessoas sentissem algo. E quando garota era ávida para usar tudo o que tinha dentro de si em cada papel. Talvez seja essa razão de seu sucesso tão precoce. Abençoada com aqueles grandes olhos e uma conexão íntima e imediata com a câmera, não é difícil para Amanda convencer você de que está realmente sentindo alguma coisa. Sua tendência em agradar às vezes fez dela uma presa fácil, hoje ela sabe. “Se você não tem limites, então é esmagada neste setor. Este é um lugar assustador para uma pessoa jovem, alguém que não tem uma estrutura – como eu era. E paguei por isso.” Ela lembrou de um trabalho quando ainda era uma adolescente, quando o diretor pediu para aparecer quase nua na tela. Sem ninguém no setor para defendê-la, ela concordou em tirar sua roupa. “Fui colocada em posições insanas. Caminhava sem calcinhas e com uma camiseta e não me sentia com nenhum poder para dizer, ‘não, não me sinto à vontade’.” Aos 22 anos, Amanda começou a procurar casas fora de Hollywood. Com a carreira indo bem, ela precisava traçar seus próprios limites e lembrar que um set de filmagem não é uma casa, que lar é lar. Há sete anos, depois de papéis em Os Miseráveis e Lovelace, ela finalmente se decidiu pela fazenda.  Mais tarde, conheceu e se casou com Sadoski, e com ele e os filhos que nasceram, incluindo o que nasceu em setembro, foi para a fazenda. “Passar os últimos anos em Catskills solidificou minha necessidade de ficar fora do jogo quando não estou trabalhando, ficar na natureza e me renovar. Todo mundo precisa de um centro de gravidade. Um lugar para se sentir seguro.” / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

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