‘Coringa’ é vivido em toda a sua maldade por Joaquin Phoenix

Recriado por vários atores, personagem clássico dos quadrinhos e do cinema volta às telonas em filme dirigido por Todd Phillips e com participação de Robert De Niro

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Por Mariane Morisawa
4 min de leitura

VENEZA — A seleção de Coringa, de Todd Phillips, para a competição do 76.º Festival de Veneza era um indício de que não se tratava de um filme baseado no universo dos quadrinhos como tantos outros que vêm inundando as salas de cinema. E, de fato, o longa prescinde de grandes cenas de ação e efeitos especiais épicos para se inspirar mais nos dramas de Martin Scorsese dos anos 1970 e 1980. Mas foi com certa surpresa que o Leão de Ouro foi recebido. 

Com estreia prevista para 3 de outubro no Brasil, Coringa abriu a venda antecipada de ingressos na quinta, 19.

No Festival de Veneza, a presidente do júri, Lucrecia Martel, elogiou os riscos que a produção correu e a reflexão que faz dos anti-heróis como vítimas do sistema. Mas Coringa não seria o que é, um filme com capacidade de sacudir Hollywood na direção de mais ousadia, sem a interpretação de Joaquin Phoenix, que não se baseou em nenhuma das versões anteriores – de Cesar Romero, Jack Nicholson ou Heath Ledger e muito menos a de Jared Leto. 

Joaquin Phoenix. O desafio de recriarpersonagem icônico queoutros atores consagraram Foto: Warner Bros

“Sou pouco conectado à indústria do entretenimento”, disse o ator em entrevista exclusiva ao Estado, em Veneza. E jurou não ter ideia da quantidade de fãs que a história tinha. “Começaram a me perguntar da pressão dois dias antes do início das filmagens, e eu disse: ‘Não me digam isso agora!’”, contou. “Era tarde demais, mas no começo eu estava na ignorância completa. Ainda bem.” 

Phoenix ama uma reação forte aos filmes que faz. “Seja qual for”, contou. “A indiferença é que me incomoda.” Mas em relação à preparação de seus personagens, garantiu que não leva em conta a opinião de ninguém. “É uma exploração e uma experiência pessoais. Faço só para mim.” 

Mas quem é este Coringa? Arthur Fleck é um comediante frustrado que trabalha como homem-placa, vestido de palhaço. Mora com a mãe, que insistia que seu destino era ser feliz e fazer os outros rirem, e depende de remédios para seus problemas de saúde mental – ele tem uma condição que faz com que ria descontroladamente. Sendo pobre e esquisito, Arthur é invisível para a sociedade. Quando alguém o enxerga, é em geral para humilhá-lo. Só que, um dia, ele se vê com o poder nas mãos. 

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Este Coringa não tem o jeito brincalhão de Romero, nem é transformado em vilão depois de cair num tanque de substâncias químicas como no caso de Nicholson. Não tem um desejo de ver o circo pegar fogo como o Coringa de Ledger, nem sabe-se lá o que Jared Leto estava fazendo. Arthur às vezes inspira pena. “Gosto que o filme peça ao espectador que pelo menos tenha empatia por alguém que é o vilão e que faz coisas horrendas. Às vezes, rotulamos uma pessoa como má, como se fôssemos incapazes dos mesmos atos.” 

Leia a seguir outros trechos da entrevista:

Você falou de divisão, e as sociedades mundiais parecem muito divididas. Acha que falta vontade de ouvir opiniões contrárias às nossas? 

Sim, claro. Não há muito debate saudável. Eu me lembro dos programas de notícia de antigamente. Hoje, eles são uma competição de quem grita mais alto. Há questões difíceis que precisamos discutir. Mas, se ficarmos gritando uns com os outros, não vai ter solução. Ficamos viciados nisso, dá mais audiência, mas isso está saindo caro. 

Mas mesmo no caso de pessoas que são detestáveis ou simplesmente fazem coisas horríveis?

É um desafio. O Coringa é uma pessoa complexa. Mas há momentos em que se pode simpatizar com ele, ou pelo menos ter alguma empatia. Mas não se engane: ele é um vilão. Eu o interpretei como um vilão. O Coringa é a própria definição do narcisismo, que é a expectativa de que seus sentimentos devem ser validados pelos outros e que todos precisam prestar atenção porque ele é a pessoa mais importante do mundo. Agora, ele não é político. Só quer adoração. O narcisismo é muito perigoso. 

Como consegue manter-se atento às dores dos outros? 

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Não quero parecer estar me vangloriando, mas sempre fui muito sensível. Quando leio um jornal, não estou só absorvendo informação, mas vivenciando a vida de alguém e isso me afeta profundamente. Acho que é de mim, nasci assim.

Veja aqui o trailer oficial do novo Coringa:

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