'Control' recria os últimos anos do roqueiro Ian Curtis

Filme é dirigido por Anton Corbijn, que chegou a fotografar a banda Joy Division antes da morte do músico

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Por Alysson Oliveira e da Reuters
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O cinema adora alguém que possa transformar em mártir. De heróis da história antiga a revolucionários contemporâneos, essas figuras são recorrentes. Melhor ainda se forem artistas, atormentados e morreram jovens. De Sylvia Plath a Kurt Cobain todos já ganharam sua cinebiografia. Por isso é de se estranhar a demora para surgir uma ficção sobre Ian Curtis, líder da banda Joy Division, que se matou aos 23 anos em 1980, pouco antes de embarcar para a sua primeira apresentação nos Estados Unidos.       Veja também: Trailer de 'Control'  Trailer de 'Joy Division'  Ouça trecho de 'Dead Souls', do Joy Division Os últimos anos da vida do cantor são o centro de Control, que estréia em São Paulo e no Rio nesta quinta-feira, 22 - quatro dias depois do aniversário da morte do músico. O filme é dirigido pelo fotógrafo Anton Corbijn, que chegou a fotografar a banda pouco antes da morte de Curtis. No ano passado, o longa foi premiado na Quinzena dos Realizadores, um evento paralelo no Festival de Cannes. A ação começa em 1973, quando Curtis (Sam Riley) é um adolescente não muito diferente dos rapazes de sua idade. Morando numa pequena cidade da Inglaterra, ele divide o tempo entre os amigos, a escola, cultuar o roqueiro David Bowie ou citar o poeta Wordsworth - cuja Ode: Intimações de Imortalidade ele sabe de cor. Nada isso é suficiente para tirá-lo de sua bolha de isolamento - o que acontece apenas quando conhece Deborah (Samantha Morton, de Poucas e Boas), a namorada de um amigo com quem acaba se casando. Curtis tinha problemas emocionais e sua arte é o reflexo claro disso. Suas composições primam pela melancolia e desesperança. Control tenta investigar a intersecção entre a arte e a vida do personagem, ao mesmo tempo destituindo-o do posto de mito, ao procurar retratá-lo pelo lado humano. Esse tipo de tratamento pode facilmente transformar a figura de um personagem no mártir - às vezes de uma geração inteira. Em seu favor, o diretor Corbijn e o roteirista Matt Greenhalgh desviam-se das armadilhas tão comuns nas cinebiografias. Eles parecem compreender que a década de 1970 foi tomada pela melancolia depois do final dos anos de 1960, quando o mundo era mais colorido e alegre - e que essa depressão não era exclusividade de Curtis. Nesse sentido, as músicas do Joy Division e a fotografia num preto e branco nos tons comuns aos filmes da Nouvelle Vague são importantes para transmitir toda a sensação de claustrofobia e tristeza daquela época. A arte e a morte de Curtis em Control não são vistas como causa e efeito. O roteiro é baseado num livro de memórias da mulher de Curtis, lançado na década de 1990, e equilibra informações sobre a vida profissional dele, como músico, e a pessoal, como marido e pai. Deborah tem o pé no chão e o pragmatismo que faltavam ao seu marido. Depois de casado, ele ainda se envolve com uma fã, a belga Annik (Alexandra Maria Lara), e esse amor o destrói, novamente. No filme, uma das músicas mais famosas da banda, Love Will Tear Us Apart, serve de trilha para a cena em que Deborah descobre a infidelidade do marido. Em outro momento, Curtis compõe She's Lost Control, e é quando sua mulher já está totalmente descontrolada. As músicas do Joy Division apresentadas em Control são tocadas pela banda que está em cena - e o próprio Riley faz os vocais. As regravações são competentes e a presença de palco do ator é um daqueles casos em que se recria muito bem o personagem real. Talvez o que haja de mais sedutor em Control seja este retrato de um período. Assim, citações explodem na tela, como as referências culturais de Curtis, caso do cantor e compositor Lou Reed e do escritor J. G. Ballard (cujo livro The Atrocity Exhibition empresta o título a uma música do Joy Division).

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