"Contra Todos" lota platéia no Festival de Berlim

O longa de estréia do cineasta brasileiro Roberto Moreira manteve a platéia lotada no horário das 23 horas. O filme fala de violência e religião na periferia de SP

PUBLICIDADE

Por Agencia Estado
Atualização:

Roberto Moreira teve casa cheia na sua estréia no longa-metragem com Contra Todos, na noite de segunda-feira. Não foi pouca coisa. O filme foi projetado às 23 horas e, após a exibição, houve debate com o público. A platéia ficou até o fim e, embora muitos espectadores, por causa do horário e do frio, tenham abandonado o debate, os que ficaram discutiram Contra Todos com o máximo interesse. Moreira encontrou-se com o repórter do Estado no lobby do Hotel Hyatt para comentar Contra Todos. Aos 42 anos, com diversos curtas e a co-autoria do roteiro de Céu de Estrelas, de Tata Amaral, no currículo, Em seu primeiro longa, Moreira fala de religião e violência na periferia de São Paulo. "O Brasil é um país violento", ele diz, lembrando o recente assassinato de fiscais do Ministério do Trabalho que investigavam denúncias de trabalho escravo em Minas, para confirmar o que afirma. "Sempre me impressionou muito o fato de que você pode pagar 2 mil e poucos reais pela vida de uma pessoa. E me interessa mais ainda discutir a violência no seio da família." Contra Todos está sendo comparado aqui a um filme do Dogma. Foi feito com poucos recursos - originalmente, ganhou um concurso de telefilmes -, gravado em vídeo e passado para filme (no processo que se chama de transfer). Moreira quis fazer um filme na contracorrente da tendência chamada de cosmética da fome. Talvez tenha exagerado na dose. A imagem do filme nega o esteticismo, legal, mas não precisava ser tão desleixada. Ele se defende: "Vimos o filme em São Paulo e o visual estava OK. A tela na qual foi exibido aqui é muito ampla e estoura a imagem, prejudicando a qualidade. No Brasil, você vai ver que não é assim." O diretor leciona dramaturgia de roteiro na Escola de Comunicação e Arte, a ECA, da Universidade de São Paulo. Criou um roteiro que parece inicial, mas que volta e meia contradiz o que as aparências sugerem e, no final, recorre a vários flash-backs explicativos que mudam os rumos da narrativa. É um processo que Hollywood gosta de usar, o whodunit, mas o de Moreira não é certamente convencional. O personagem central, ou um dos personagens centrais, é um crente que também é assassino de aluguel. "O cinema tem mostrado crentes que se convertem e renegam seus crimes ou que continuam matando. Queria criar um personagem intermediário entre esses extremos." Teodoro é seu nome e ele é totalmente ambíguo. Não se encaixa na definição de figura do mal. Quem é do mal é o personagem de Ailton Graça, Waldomiro. Descobre-se, no fim, que se trata de um Otelo que é o próprio Iago e arma toda uma maquinação destruidora. Moreira escolheu o ator perfeito. Ailton acaba de fazer Otelo no teatro. A escolha do intérprete de Teodoro é menos feliz, mas não é um problema do ator. O personagem é menos convincente. Aos que definem Contra Todos como um Dogma brasileiro, Moreira diz que é um Dogma com armas. Contra Todos, que será distribuído pela O2, a empresa de Fernando Meirelles - associada a quem ainda é a incógnita - vai suscitar todo tipo de polêmica, estética e política. Tem elementos de O Invasor, de O Homem do Ano, de Amarelo Manga. Moreira quis fazer um filme com a cara do Brasil. "Nosso País é cheio de contradições. Não existe um Brasil, uma só realidade. Existem visões da realidade e a minha quer mostrar o País que as aparências muitas vezes mascaram."

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.