Clássico do Dia: 'Tabu' é um inesperado encontro entre dois grandes cineastas

Todo dia um filme será destacado pelo crítico do 'Estado', neste, Friedrich Wilhelm Murnau e Robert Flaherty fizeram um dos filmes mais belos da história do cinema, mas a lua de mel durou pouco

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Em 1980, Kirdy Stevens iniciou a série XXX-Rated Taboo, e a cena "proibida" do filme, o incesto entre mãe e filho, com Kay Parker e Mike Ranger, é considerada das melhores na história do cinema pornô. Nada a ver com o Tabu de 1931, que marcou o inesperado encontro do documentartista Robert Flaherty, que já era reconhecido por suas histórias da oposição do homem à natureza – Nanuk, o Esquimó; O Homem de Aran – com o expressionista alemão Friedrich Wilhelm Murnau. Autor do Nosferatu de 1922, Murnau fez história ao recusar as deformações plásticas do Doutor Caligari e ao narrar a saga de seu vampiro em cenários naturais. Nos EUA, para onde se transferiu, de novo fez história quando Sunrise/Aurora, de 1927, foi o primeiro vencedor do Oscar.

Murnau também era atraído pela natureza, mas era um autor de ficção. Reuniram-se esses dois autores díspares para contar a história de Matahi e Reri, na Polinésia. Até hoje os críticos discutem quem fez o quê. Murnau rompera seu contrato com a Fox porque não estava nada satisfeito com o estúdio, que considerava responsável pelo fracasso de seu longa City Girl. Flaherty também estava por aqui com a Fox, que vetara seu projeto sobre os índios norte-americanos. Os dois diretores se admiravam e respeitavam, e não foi difícil para Murnau agregar Flaherty como codiretor da parte documental, que seria forte em Tabu. A lua de mel não durou muito. Brigaram por questões de conceito e até de autoria. Floyd Crosby ganhou o Oscar por sua deslumbrante fotografia em preto e branco.

Cena de 'Tabu', de 1931, deF.W. Murnau eRobert J. Flaherty Foto: Murnau-Flaherty Productions

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Parte documental, Tabu narra, na verdade, uma história muito bem construída. No Taiti, e em Bora-Bora, Murnau, que financiava a aventura com dinheiro do próprio bolso, escolheu o elenco – uma jovem muito bonita de 16 anos, Reri; um nadador também muito jovem, Matahi; e um ancião que havia sido ministro das ilhas, na época da Rainha Vitória, Hitu. A história, simples, era recheada de informações antropológicas sobre a região em que a dupla filmava – Taiti, Moto Topu, Takapota e Bora-Bora. Na última ilha, Murnau fez construir uma aldeia cenográfica junto a uma montanha sagrada dos nativos. Na história, um pescador de pérolas, Matahi, se apaixona pela bela Reri, mas ela é tabu – consagrada aos deuses. Para viver seu romance, o casal foge e se instala em outra paradisíaca ilha próxima.

O filme divide-se em duas partes – Paraíso e Paraíso Perdido. Na segunda, o feiticeiro Hitu localiza e aprisiona Reri, a quem leva de volta. Matahi tenta alcançar o barco que leva a amada, Morre nadando. O último plano é puro Murnau. A tragédia do homem solitário. Matahi, sozinho no mar, olha o barco que se afasta, até ser tragado pelas águas. Clássico absoluto, Tabu é um dos filmes mais belos já feitos.

De volta a Hollywood, Murnau, que detinha os direitos, conseguiu vender o filme à Paramount, que marcou a estreia para o dia 18 de março de 1931. No dia 10, e a bordo de uma limosina, Murnau partiu numa curta viagem de recreio com seu criado filipino, também motorista, Garcia Stevenson. Kenneth Anger adotou a lenda em seu livro Hollywood Babilonia. Murnau, que era gay, estaria fazendo sexo oral em Stevenson e ele perdeu o controle do carro. O acidente foi terrível, mas só o diretor morreu. Dias depois, Tabu estreou para se consagrar como o grande filme que é.

 

Onde assistir:

  • DVD à venda na Amazon

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