Ciclo sobre o cineasta René Clair

O diretor de Viva a Liberdade, que já foi chamado de príncipe dos cineastas e depois virou maldito, ganha retrospectiva no Espaço Unibanco

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Por Agencia Estado
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Houve um tempo em que o francês René Clair (pseudônimo de René-Lucien Chomette) era chamado de príncipe dos cineastas, cavalheiro do humor. Isso foi muito antes que ele se tornasse um dos alvos preferidos dos críticos que se tornaram diretores e, agrupados na revista Cahiers du Cinéma, lançaram os fundamentos da nouvelle vague, que ajudou a deflagrar as grandes transformações ocorridas no cinema mundial, nos anos 60. Clair não foi tão penalizado quanto Claude Autant-Lara e Julien Duviver, mas era tratado com desdém, como o vanguardista - sua fase dos anos 20 - que entrou para a Academia Francesa e traiu suas convicções de juventude. Os arautos da nouvelle vague adoravam bater nele pelo que representava de medalhão. Não houve muita gente para chorá-lo quando morreu, em 1982, e menos ainda para lembrá-lo no centenário de seu nascimento, há dois anos. A partir de amanhã, o Espaço Unibanco resgata uma dívida com Clair e, em parceria com o Consulado da França, exibe um ciclo dedicado ao diretor. São seis filmes em 16 mm. Cobrem os anos de 1930 a 55, começando com Sob os Tetos de Paris e terminando com As Grandes Manobras. Entre esses extremos passam A Nous la Liberté (rebatizado como Viva a Liberdade), 14 Juillet, O Último Milionário e O Silêncio É de Ouro. Entre esses filmes estão as obras fundamentais de Clair, aquelas às quais os historiadores de cinema atribuem real importância. Ficam faltando Entr´Acte, que reúne a nata do dadaísmo (Picabia, Man Ray, Marcel Duchamp e Erick Stie) e pode ser considerado um manifesto do movimento, Le Chapeau de Paille d´Italie e Le Millon, mas Sob os Tetos de Paris, Viva a Liberdade e 14 Juillet compensam, pelo menos em parte, essas ausências. Sob os Tetos merece a definição de filme falsamente falado. Quando foi feito, o cinema já havia começado a falar, mas Clair, como Charles Chaplin, desconfiava do cinema sonoro e fez com que seus personagens só abrissem a boca atrás de vitrines e janelas ou então tivessem a voz abafada por algum ruído, recurso que seria incorporado, depois, por Jacques Tati (em As Férias do Sr. Hulot). Viva a Liberdade investe contra a automação dos tempos modernos, num doce anarquismo que inspirou Chaplin - o próprio criador de Carlitos admitia haver bebido na fonte de Clair para fazer o Tempos Modernos dele. 14 Juillet foi o único título da produção de Clair ao qual se curvou até o iconoclasta Jean-Luc Godard - ele chegou a dedicar Uma Mulher É uma Mulher a este filme, dizendo que era o único espontâneo (e o único que encerrava alguma novidade, mas aí Godard exagerou) na carreira do diretor. Dos demais filmes do ciclo, não há um só que não justifique a adesão do público. O Último Milionário ainda faz rir com sua sátira ao ditador de um país imaginário, O Silêncio É de Ouro também esbanja ironia e As Grandes Manobras, considerado uma tragicomédia (com Gérard Philippe, Michle Morgan e a jovem Brigitte Bardot), atira o diretor nas vertentes de Max Ophuls, o cineasta vienense da valsa. Por mais que Clair tenha decepcionado no academismo da sua última fase, há momentos de sua obra que vale reter e admirar. Como esses que o Espaço Unibanco vai exibir. Mostra René Clair Parlant. Sexta, "Sob os Tetos de Paris" (Sous les Toits de Paris)/30, duração 95 minutos; sábado, "A Nós a Liberdade" (A Nous la Liberté)/32, duração 97 minutos; domingo, "14 de Julho" (Quatorze Juillet)/32, duração 92 minutos. Legendas em espanhol. Todos os dias, às 18 horas (preços no local). Espaço Unibanco 4. Rua Augusta, 1.470, tel. 287-5590. Até 6/7

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