Ciclo marca dez anos da morte de Louis Malle

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Por Agencia Estado
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Há dez anos, em 23 de novembro de 1995, morria de câncer, em Beverly Hills, na Califórnia, o cineasta francês Louis Malle. A data será lembrada, a partir desta quarta-feira, pela Sala Cinemateca, que promove um ciclo que vai até domingo, dia 11. É formado por oito títulos representativos do estilo e das preocupações do diretor que também tem um filme (Os Amantes) na mostra Cine Erótico, do Centro Cultural Banco do Brasil. Malle foi sempre um deslocado. Costuma ser associado ao movimento nouvelle vague, que surgiu na França, no fim dos anos 1950, mas percorreu um caminho próprio - e diverso - do de Jean-Luc Godard e François Truffaut, mesmo que, eventualmente, tenha estado próximo de um, ou outro. No fim da vida, radicou-se nos Estados Unidos, onde morreu. Malle foi, acima de tudo, um solitário. Nascido numa família rica de Thumeries, no norte francês, ele trocou a direção das empresas pela de cinema. Começou co-assinando O Mundo do Silêncio com Jacques Cousteau e o documentário ganhou a Palma de Ouro no Festival de Cannes, em 1956. Malle voltou outras vezes ao documentário, incluindo em 1969, com Calcutá, que causou polêmica pelo retrato que o diretor fez da miséria na Índia. São três ou quatro documentários. Compõem uma parcela ínfima (mas não insignificante) de sua obra voltada preferencialmente para a ficção. Malle sustentava que todo filme é político. Em Maio de 68, esteve na linha de frente do movimento para interromper o Festival de Cannes. Existem fotos dele e de Truffaut sentados no chão, na mesma barricada. Para os cinéfilos, Malle é, acima de tudo, o cineasta do escândalo. Do sexo oral em Os Amantes ao suicídio em 30 Anos Esta Noite, o incesto em O Sopro no Coração, o colaboracionismo em Lacombe Lucien, a prostituição infantil em Pretty Baby - Menina Bonita e as perseguições aos judeus em Adeus, Meninos, a obra de Malle aborda, provocativamente, temas sobre os quais os franceses muitas vezes prefeririam manter o silêncio. Alguns entre esses filmes estão entre os melhores do autor. Estão no ciclo Os Amantes, 30 Anos Esta Noite, O Sopro no Coração, Lacombe Lucien. Os outros quatro incluem Ascensor para o Cadafalso, policial servido pela magnífica trilha que Miles Davis improvisou no estúdio de gravação; Zazie no Metrô; Lua Negra; e o experimental Meu Jantar com André. Faltam algumas preciosidades, a maior delas "O Ladrão Aventureiro", magnífico retrato de um homem que só se sente vivo no ato de transgredir, quando rouba; "Pretty Baby"; "Atlantic City"; "Adeus, Meninos"; e "Tio Vânia em Nova York". Por dois deles, ele ganhou o Leão de Ouro em Veneza: "Atlantic City" e "Adeus, Meninos", provocando a fúria de Glauber Rocha, que esperava receber o cobiçado prêmio em 1980, por "A Idade da Terra". Glauber foi duro com Malle. O diretor sobreviveu aos seus ataques e viveu 15 gloriosos anos de criatividade. Teria decepcionado, se o último filme tivesse sido "Perdas e Danos", que adaptou do romance de Josephine Hart. Felizmente, ainda fez "Tio Vânia em Nova York", transformando a leitura da peça de Chekhov em obra-prima que reinventava as relações do cinema com o teatro. Ao menos, era isso que parecia em 1994. Hoje, talvez se perceba que Malle estivesse antecipando, ali, o Lars Von Trier de "Dogville" e "Manderlay". Nos seus últimos tempos, ele trabalhava num projeto do coração - a cinebiografia de Marlene Dietrich, que queria realizar com Uma Thurman no papel da vamp alemã. Nunca saberemos como seria a Marlene de Malle, mas não custa sonhar. A bissexualidade da atriz e a sua intransigente oposição ao nazismo poderiam fornecer ao grande autor o tipo de material de escândalo de que ele tanto gostava.

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