Chadwick Boseman: a morte do guerreiro num momento crucial da luta antirracista

Chadwick Boseman morreu aos 43 anos, depois de uma luta de quatro anos contra um câncer

PUBLICIDADE

Por Luiz Carlos Merten
Atualização:
Chadwick Boseman, que morreu aos 43, durante estreia de Pantera Negra em 2018 Foto: Mario Anzuoni/Reuters

Todo mundo se lembra do apresentador Jimmy Kimmel no Oscar de 2018. A cada 15 ou 20 minutos, ele atualizava os números da bilheteria de Pantera Negra. Mais US$ 1 milhão, mais um, mais um. Pantera Negra estourava. Virou um fenômeno social, como, aliás, fora Mulher Maravilha um ano antes. Depois do empoderamento feminino, o afago na autoestima do público negro. No ano passado o blockbuster de Ryan Coogler somou várias estatuetas na premiação da Academia. Wakanda forever. Wakanda agora está de luto pela morte de seu príncipe.

Chadwick Boseman lutava havia quatro anos contra um câncer de cólon. Morreu na noite de sexta-feira, 28. Tinha 43 anos. Era ator, diretor e roteirista. Antes de adentrar glorioso no Universo Marvel, criando o super-herói negro, destacou-se por seus retratos de personagens reais. Foi Jackie Robinson em 42, James Brown em Get on Up e Thurgood Marshall em Marshall. Além da sua aventura solo como Pantera Negra, o personagem apareceu em Capitão América: Guerra Civil, Os Vingadores: Guerra Infinita e Os Vingadores: Ultimato.

PUBLICIDADE

Na época, ninguém sabia, já que a discrição foi total, mas ele filmava suas cenas de ação alternadamente com sessões de quimioterapia para tentar fazer regredir a doença. 

Revelava coragem, e resiliência. Boseman nasceu em Anderson, na Carolina do Sul, em 29 de novembro de 1976. Formou-se na TL Hanna High School em 1995. Escreveu sua primeira peça, Crossroads, e a encenou na escola, depois que um colega foi baleado e morto. Começava uma carreira de militância. Prosseguiu os estudos na Universidade Howard, em Washington, onde se formou, em 2000, em artes plásticas e direção. Seu sonho era ser escritor e diretor, e ele foi fazer um curso de interpretação na Inglaterra, convencido de que ajudaria no seu relacionamento com atores.

Estreou na TV em 2003. Participou de episódios de séries como Law & Order, CSI New York e ER. Dirigia uma peça off-Broadway no East Village quando foi chamado a fazer um teste para ator no filme 42, sobre o lendário jogador de beisebol Jackie Robinson. Chegou a pensar em desistir do teste, porque preferia ser diretor e dramaturgo, mas foi aprovado e sua vida tomou outro rumo.

Interpretou guerreiros. O super-herói T’Challah, o deus Tot (em Deuses do Egito). Interpretou os heróis do cotidiano, que enfrentaram o preconceito. O astro do beisebol Robinson, o cantor, compositor e produtor musical James Brown. Rapidamente, num período curto de tempo, fez história e virou referência no imaginário do público afro-americano.

Nas redes sociais, amigos e fãs lamentaram a morte de Chadwick. “Obrigado, Chadwick, por tudo que você nos deu. Precisávamos disso e vamos sempre dar valor a isso”, escreveu Samuel L. Jackson. E Oprah Winfrey: “Que alma gentil e abençoada. Grandeza entre cirurgias e sessões de químio. A coragem, a força que isso exige. Esse é o rosto da dignidade”.

Publicidade

Boseman não teve tempo de fazer Pantera Negra 2, mas deixou pronto um filme produzido por Denzel Washington e coestrelado por Viola Davis. Ma Rainey's Black Bottom é uma adaptação da peça de mesmo nome, de 1982, do dramaturgo August Wilson. 

A morte de Boseman ocorre num momento crucial da vida norte-americana, depois do assassinato brutal de George Floyd, que desencadeou uma onda de protestos que reverberou pelos EUA e o mundo, e depois de outro policial dar 7 tiros em Jacob Blake, também negro, pelas costas. Os EUA vivem os maiores protestos raciais desde o movimento por direitos civis, nos anos 1960. Em Destacamento Blood, Spike Lee fez de Boseman o porta-voz do discurso politizado da época.

I can't breathe, Black Lives Matter. Boseman morreu em casa, em Los Angeles, acompanhado pela mulher, a cantora Taylor Simone Ledward, com quem se casou em outubro do ano passado. Enquanto isso, as ruas são tomadas pela comoção e o presidente Donald Trump, candidato à reeleição, exalta a lei e a ordem, glorificando a polícia e demonizando os manifestantes. Vidas negras importam. A de Chadwick Boseman, infelizmente, extingiu-se cedo demais.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.