Berlim exagera ao premiar Michael Winterbottom

Seu In This World ficou com o Urso de Ouro de melhor filme. É o que se poderia definir como o inferno das boas intenções. Urso de Prata foi para Adaptation, de Spike Jonze

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Por Agencia Estado
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Havia, desde o início, a suspeita de que o júri presidido por Atom Egoyan não faria a coisa certa. E não fez mesmo. O Urso de Ouro para o melhor filme do 53ª Festival de Berlim foi atribuído ontem a In This World, de Michael Winterbottom. É o que se poderia definir como o inferno das boas intenções. O inglês Winterbottom freqüenta regularmente o circuito dos grandes festivais, sem que se saiba exatamente de onde vem o prestígio. O júri agora exagerou. In This World trata de refugiados políticos, acompanhando o esforço de dois refugiados de um campo do Paquistão para chegar a Londres. A perspectiva do diretor é muito européia: ele teve toda a facilidade para fazer o filme, misto de documentário e ficção, mas o protagonista não pôde vir a Berlim porque está ameaçado de expulsão da Inglaterra, que lhe nega o status de asilado político. Como Egoyan é um autor pós-moderno - Ararat é a prova -, não surpreende que o Urso de Prata tenha ido para Adaptation, de Spike Jonze. O filme conta a história de um roteirista que tem dificuldade para desenvolver o texto contratado. Trata do próprio processo criativo, mas é preciso gostar muito de Nicolas Cage para vê-lo em dose dupla - interpreta gêmeos e um ainda é o alter ego do outro. Há algumas coisas divertidas e é no mínimo surpreendente ver Meryl Streep cheirando cocaína e participando de cenas de sexo, mesmo se nas mais pesadas ela foi substituída por uma dublê. Mas a adaptação só é criativa em termos. No desfecho, esquece que é um exercício intelectual e vira um thrillerzinho vagabundo, com perseguição e assassinato. Nada a objetar aos prêmios de melhor ator para Sam Rockwell e melhor atriz para o trio de As Horas, de Stephen Daldry. Rockwell é a alma do filme de estréia do ator George Clooney na direção, Confessions of a Dangerous Mind. Interpreta Chuck Barris, homem de TV, misto de Gugu e Chacrinha norte-americano, que trabalhou como espião para a CIA. Houve vaias quando Egoyan anunciou o prêmio múltiplo de melhor atriz. Ficou evidente que o júri não quis correr o risco de ter de escolher entre Meryl Streep, Nicole Kidman e Julianne Moore, por As Horas. Houve ainda um prêmio para o melhor filme europeu, Goodbye Lenin, de Wolfgang Becker, outro especial, em homenagem ao fundador do festival, Alfred Bauer, para Herói, de Zhang Yimou. O prêmio de direção foi para Patrice Chéreau, por Son Frère. A surpresa é que o realismo cru de Chéreau parecia na contramão do que Egoyan gosta. Os críticos também surpreenderam, mas no bom sentido. O prêmio da Fédération Internationale de la Presse Cinématografique, foi para o filme alemão Lichter (Luzes Distantes), de Hans Christian-Schmid. Também trata de refugiados políticos, foi um tanto eclipsado pela repercussão de Goodbye Lenin, mas tem classe. E é melhor do que In This World.

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