Belas Artes a La Carte inicia mostra de filmes dos grandes mestres do cinema espanhol

Estão disponíveis produções que fazem parte da história, e não apenas do cinema, como clássicos de Luis Buñuel, Juan Antonio Bardem, Luis García Berlanga, Carlos Saura, Mario Camus e Victor Erice

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Com apoio da Embaixada da Espanha, o Belas Artes inicia no streaming - a La Carte - uma mostra de filmes dos grandes mestres do cinema espanhol. De 6 a 17 de novembro e, depois, de 4 a 17 de dezembro, outra mostra, dedicada aos grandes artistas do cinema espanhol. Na quarta, 4, à noite, durante a premiação da 44ª Mostra, foram inúmeras as manifestações em defesa da Cinemateca Brasileira, da preservação da memória cinematográfica, da liberdade de expressão. A Espanha calibra essa luta. Em plena segunda onda da pandemia, o país apoia a divulgação de sua cultura no exterior. Sabe quanto isso é importante.

Cena de 'Viridiana', de Luís Buñuel, que está na mostra de filmes dos grandes mestres do cinema espanhol. Foto: UNINCI

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A primeira mostra reúne filmes que fazem parte da história, e não apenas do cinema. Pode-se inventariar as Espanha pós-Guerra Civil, do franquismo triunfante com os clássicos de Luis Buñuel, Juan Antonio Bardem, Luis García Berlanga, Carlos Saura, Mario Camus e Victor Erice. Na segunda leva virão novos filmes imperdíveis e que ficarão disponíveis no cardápio do Belas Artes, podendo ser vistos pelos assinantes durante toda a realização das mostras. Antes que você se pergunte - mas não tem Pedro Almodóvar? -, é bom ir logo informando que não tem. O grande Pedro poderia estar em qualquer uma das duas mostras. Ele é, hoje em dia, um dos mais aclamados autores de cinema no mundo, com o aval da Academia de Hollywood e do Festival de Cannes. Os filmes que o cinéfilo já pode (re)ver:

O Carrasco

El Verdugo, de Luís García Berlanga. Com a vitória do franquismo e sua tríade - Patria, Familia y Libertad -, o cinema espanhol mediocrizou-se e afundou na censura. Berlanga, com Bienvenido Mister Marshall, de 1952, foi o responsável por sua ressurreição. Em dupla com Juan Antonio Bardem, ou sozinho, ele exercitou seu humor (se não for incorreto dizer assim) mais negro para criticar os espanhóis e suas instituições. Havia pena de morte na Espanha - Berlanga fez o grande filme sobre o tema. Ele teve um discípulo ilustre, Marco Ferreri.

Cria Cuervos

O clássico doente de Saura. A história de Ana e suas irmãs. A garota será responsável pela morte do pai militar, e franquista? Ana Torrent, que surgira em O Espírito da Colmeia, faz Ana menina e Geraldine Chaplin, na fase em que foi musa do diretor Saura, tem duplo papel - faz Ana adulta e sua mãe. O clima obsessivo da narrativa é realçado pela canção Por qué te vás?, que virou hit mundial.

El Sur 

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Victor Erice é autor de uma obra reduzida, porém imensa. Franco já estava morto quando surgiu, em 1983, a história de Estrella e seu pai. A garota dos 8 aos 15. Seu pai, interpretado pelo grande ator dos irmãos Taviani, Omero Antonutti. De onde vem o desespero que consome o pai? O que sobra de seus mitos, que nortearam sua vida?

O Espírito da Colmeia

Dez anos antes de El Sur, Victor Erice fez esse filme que pode ser muito bem o maior de toda a história do cinema espanhol, a menos que você prefira algum Buñuel, ou Almodóvar. Durante a Guerra Civil, duas garotas. Uma delas, Ana, assiste ao cultuado Frankenstein de James Whale e fica obcecada. Ana Torrent, com seus grandes olhos tristes, identifica o ser criado com restos de cadáveres no soldado ferido que se esconde nos fundos da casa. Quando a irmã desaparece, borram-se os limites da realidade e da ficção. A cena emblemática - Frankenstein, querendo brincar com a menina, a atira no rio. O que houve com a irmã? O que será de Ana? Seria maravilhoso poder (re)ver também El Sol del Membrillo, de 1992. O pintor António López García e sua obsessão para captar a luz nos frutos da árvore no jardim de seu estúdio. Só isso? Tudo isso!

A Morte de Um Ciclista

Juan Antonio Bardem escreveu roteiros para Berlanga e codirigiu com ele. Produziu Viridiana, de Luís Buñuel, o que lhe valeu não poucos problemas com o regime do General Franco. Esse filme foi duramente perseguido pela censura espanhola. Um casal adúltero atropela um ciclista e foge, com medo de que sua ligação seja revelada. Com a italiana Lucia Bosè, e sua beleza misteriosa. Lucia foi atriz dos primeiros filmes de Michelangelo Antonioni.

Os Santos Inocentes

Baseado no romance cultuado de Miguel Delibes, o diretor Mario Camus conta as histórias cruzadas de duas famílias na Espanha interiorana dos anos 1960. Os pobres vivem para servir os ricos. Alfredo Landa e Francisco Rabal dividiram o prêmio de interpretação masculina em Cannes, 1984.

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Tristana

Don Luís Buñuel adapta o romance de Benito Pérez Galdós - seu segundo grande filme com Catherine Deneuve, após A Bela da Tarde. No Brasil, ganhou o acréscimo de Uma Paixão Mórbida no título. O velho Fernando Rey adota a Deneuve e faz dela sua amante. Ela foge com o pintor Franco Nero, sofre um acidente e perde a perna. Para ver de olhos bem abertos - a cena final é uma das mais ousadas e intrigantes já filmadas. Como Christopher Nolan em Tenet, mas muito antes dele - em 1970! -, Buñuel reverte a narrativa e deixa no espectador o enigma daqueles sinos.

Viridiana

Luís Buñuel, que se exilara no México após a Guerra Civil, obteve permissão para voltar à Espanha e fazer esse filme, cujo caráter subversivo não foi entendido pelo regime. Em Cannes, 1961, dividiu a Palma de Ouro com Une Aussi Longue Absence, de Henri Colpi. Quando o Vaticano fez campanha contra Viridiana, Franco proibiu o filme no país. Só foi liberado após a morte do ditador. Noviça abandona o convento e acolhe mendigos em sua casa, numa santa ceia profana. Sexo, família e religião. Gustavo Alatriste produziu o filme estrelado por sua mulher, Silvia Pinal. Na trama ela forma triângulo com Francisco Rabal e Margarita Lozano, de grandes filmes dos irmãos Tasviani (A Noite de São Lourenço e Kaos).

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