Análise: 'Primavera em Casablanca' traz dramas pessoais na Primavera Árabe

Contexto político é o pano de fundo para as histórias individuais

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Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Por Luiz Zanin Oricchio
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Primavera em Casablanca, de Nabil Ayouch, mostra as vantagens e fraquezas de um “gênero” que andou muito em voga faz alguns anos, o dos episódios que se entrelaçam. A força desses filmes vem do encanto narrativo, em que personagens de histórias isoladas entram ou saem em outras histórias, tecendo assim um novelo ficcional. O perigo reside em especial num ponto: quem deseja trabalhar desse jeito precisa assegurar-se de que esse mecanismo precisará funcionar como máquina bem azeitada ou o rigor de tapeçaria de alta-costura. 

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Maryam Touzani em 'Primavera em Casablanca', de Nabil Ayouch Foto: California Filmes

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Em Primavera, Nabil cruza linhas no espaço e no tempo. Vai do início dos anos 1980 até 2015, das montanhas do Atlas ao caos metropolitano de Casablanca. São cinco histórias cruzadas: a do professor que ensinava em berbere e vê-se obrigado a mudar o idioma para árabe; a linda mulher um tanto desprezada pelo marido que se descobre grávida e hesita entre abortar ou não; um chef judeu que, apesar do sucesso, sofre com preconceitos; uma adolescente cheia de hormônios em conflito com a família tradicionalista; um músico fã de Freddy Mercury em confronto com uma sociedade machista e agressiva. 

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O projeto não é ingênuo nem superficial. À sombra dessas histórias cruzadas sente-se pulsando o mal-estar de uma sociedade equilibrada em doses fortes de patriarcalismo e repressão. As demandas sociais e pessoais – representadas em diversos níveis pelos personagens – pressionam para se exprimir. E a coisa finalmente explode nas ruas como parte daquilo que se convencionou chamar de “Primavera Árabe”, da qual sai o título brasileiro. O original é Razzia, que denota melhor a violência implícita ou explícita em diversas etapas da narrativa. 

Algumas histórias são melhores que as outras e a quase ausência de alternância entre vidas particulares e as ruas tornam artificiais as imagens de protestos que parecem surgidas do nada. A articulação entre as narrativas poderia ser melhor. No entanto, o espectador sai do filme com uma panorâmica da complexa sociedade marroquina, em seu misto de abertura e autoritarismo. E guarda na memória algumas imagens fortes e rostos marcantes, como o da atriz Maryam Touzani. 

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