12 de fevereiro de 2018 | 06h02
Não é raro que o cinema tome uma história particular como representante de uma situação mais geral. Há riscos na empreitada. O principal deles, o artificialismo com que às vezes se passa de um nível para o outro.
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O Insulto, de Ziad Doueiri, tira de letra esse desafio. Em primeiro lugar, porque constrói uma história consistente, cuja verossimilhança interna nos leva a creditá-la como “real”. Ou muito possível de ter de fato acontecido. Segundo, porque conta com atores excepcionais para validar essa prova dos nove do real.
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Isso não impede que o espectador lúcido vá notando, à medida que o enredo avança, que, além de um caso particular entre dois homens teimosos, se trata de um comentário sutil sobre os ódios e preconceitos que alimentam a incessante crise no Oriente Médio. E em outras partes do mundo. Parte de um roteiro muito engenhoso. Dois moradores de Beirute - um cristão e um palestino - levam uma pequena desavença ao tribunal. Ambos têm suas razões.
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Pela discussão entre as partes, flui não apenas a ideia de que guerras começam por motivos fúteis, como a menos óbvia constatação de que antigas feridas não cicatrizam apenas pela boa vontade das pessoas. Exigem medidas políticas. A força fabulatória é grande. E a atenção à ambiguidade dos personagens pouco comum no cinema atual.
Aliás, quando vemos o simplismo da maior parte dos roteiros de cinema, nos perguntamos se não devemos procurar inspiração em outra parte do mundo. Afinal, a natureza humana é complexa e torna-se ainda mais ambivalente - e violenta - quando entram em jogo posições políticas antagônicas. Temos disso aqui no Brasil e em outros países. Faltam ficcionistas que transponham essa polaridade agressiva para o plano da arte.
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