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"Adoro a imperfeição dos meus filmes", diz Iñarritu

Diretor de "Babel", protagonizado por Brad Pitt e Cate Blanchett, veio lançar o filme no Festival do Rio

Por Agencia Estado
Atualização:

Alejandro González-Iñárritu vive com a mulher e os dois filhos em Los Angeles, mas viaja seguido para a Cidade do México, por causa de seus pais. Ele quer que os dois meninos tenham o máximo de contato possível com os avós. Iñárritu é um homem de família. É uma coisa cultural, devido à sua origem latina? "Acho que é humano, não é?", ele devolve a pergunta. A questão do humano é essencial na vida e na obra deste mexicano cosmopolita, que filma a desumanidade do mundo para melhor refletir sobre os rumos do planeta, nesta era de globalização. Ao apresentar seu novo filme, "Babel", para uma platéia de convidados no Festival do Rio, Iñárritu disse que pensava estar fazendo uma obra sobre o que nos divide e descobriu que filmou o que nos une. Iñárritu passou 72 horas muito intensas no Rio. Chegou na segunda (era esperado no domingo). Encontrou-se com o amigo Walter Salles, apresentou "Babel" à platéia do Cine Odeon BR e, sob o efeito da caipirinha e do jet leg, apagou. Na terça e quarta-feira, passou por uma verdadeira maratona de entrevistas. Na quarta à tarde, estava exausto. Enterrou o chapéu no rosto, não quis ser fotografado. Mas não foi nem um pouco antipático. Chegou a entrevistar o repórter, pedindo todo tipo de informação sobre o novo Arturo Ripstein, "Carnaval de Sodoma", que também está em exibição no Rio. Ele ainda preparava "21 Gramas" quando lhe veio o conceito de "Babel". "Trabalho muito por conceito, de uma forma racional. Acho que sou bom nisso. Quando filmo, é um corpo a corpo visceral, é o momento em que me permito ser instintivo. Na montagem, volto a ser conceitual", explica. "Babel" surgiu da vontade de Iñárritu de pensar o mundo numa escala planetária. Nos anos 60, o teórico da comunicação Marshall McLuhan disse que a TV havia transformado o mundo numa aldeia global. Com a internet, o mundo encolheu ainda mais - ou foi a aldeia que se ampliou? Hoje é tudo conectado, tudo instantâneo. Como colocar isso na tela? A colaboração do roteirista Guillermo Arriaga foi fundamental. Como sempre, quando trabalham juntos, Iñárritu fornece o conceito, mas a história toma forma com Arriaga. Foi dele que veio a idéia dos meninos do deserto africano e do tiro que é disparado, atingindo a turista americana que viaja com o marido naquele ônibus, lá longe. Com o trabalho, surgiram os outros fios da história - a empregada mexicana que cuida do filho do casal nos EUA e comete a imprudência de levar o menino a uma festa de casamento na fronteira mexicana; e a origem do rifle, no Japão. São três histórias de família, em três continentes e, neste sentido, "Babel" encerra a trilogia que nasceu com "Amores Brutos" e teve prosseguimento com "21 Gramas". Os filmes não surgiram como uma trilogia, mas ela se impôs e o autor, cada vez mais conscientemente, foi encaixando as peças para contar suas histórias de conflitos entre pais e filhos. Iñárritu ama esses vastos painéis que filma. Acha que a literatura latino-americana tem muito disso, mas sua principal influência foi em casa - o pai, que não é escritor, sempre o encantou com as histórias que adorava contar. Foram três anos de roteiro e preparativos e um ano de filmagem em três continentes, em cinco línguas. O projeto exigiu muito trabalho e o mais difícil nem foi convencer Brad Pitt e Cate Blanchett a interpretarem o casal de americanos. "Eles entraram no projeto porque acreditaram nele. Foram generosos, reduzindo seus cachês." Por falar em cachê, não propriamente o dinheiro, mas outro sentido que se pode atribuir à palavra, Iñárritu, que não tem tido muito tempo de ver filmes, conta que o que mais o impressionou, recentemente, foi "Caché", de Michael Haneke. "É rico em todos os sentidos - como discussão política, como proposta estética." A pergunta torna-se inevitável - o que é o cinema para Iñárritu, o que ele pretende com seus filmes? "É dar um testemunho, baseado nas minhas experiências. Por isso não consigo escolher entre meus filmes. Encontro-me em cada um deles em diferentes fases de minha vida. São como filhos e a gente não escolhe entre os filhos. São como as mulheres. As muito lindas, em geral, são como bonecas, não são as mais humanas. Adoro a imperfeição dos meus filmes. É nela que me reconheço." A grande imperfeição de "Babel" é que neste filme, mais do que nos anteriores, a estrutura narrativa de Iñárritu e Arriaga termina por exibir seu artifício de forma mais evidente. Onde? Como?, ele volta a conduzir a entrevista. O episódio japonês é o elo fraco da cadeia. "Não vou dizer que seja o meu preferido, mas sem o perfume e o mistério da história japonesa eu não teria conseguido dar ao filme a escala planetária que pretendia", ele retruca. "Babel" estréia em 19 de janeiro no Brasil. Antes, deve passar na Mostra de São Paulo. Iñárritu seguiu na quarta à noite para Los Angeles. Ele tem algum projeto? "Tenho, gostaria de dormir durante seis meses para me recuperar do desgaste. Desde que iniciei "Babel", nunca mais parei." Há grande expectativa da distribuidora UIP pelas chances de "Babel" no Globo de Ouro e no Oscar. "No Globo de Ouro, talvez; no Oscar, não acredito. O filme não tem o formato que a Academia (de Hollywood) gosta", diz o diretor.

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