26 de janeiro de 2012 | 21h35
Ele dá a impressão de querer se despedir. É como se J. Edgar fechasse um ciclo. Mostrar o personagem, o poderoso J. Edgar Hoover em duas épocas, é potencialmente interessante. Clint filma os ideais e sua degradação. Para ele, o filme é sobre relacionamentos e, se o fez, foi porque encontrou no roteiro algo mais que elementos biográficos. Hoover era um enigma que ele quer resolver. Ou desmontar, em parte.
Notório caçador de comunistas - Clint também tinha fama de fascista, na época de Dirty Harry -, Hoover reformulou o FBI, acurou os métodos de investigação científica, mas foi sempre um homem de bastidores. Um manipulador que pressionava, até chantageando, presidentes e como tal se manteve no poder durante muito tempo. Esse Hoover, com certeza, não é simpático, não gera empatia, principalmente se você tiver uma vocação de esquerda. Como se filma um personagem desses? À maneira de Brecht, com estranhamento, ou distanciamento crítico.
Há mais um aspecto... Sempre houve a suspeita de que Hoover fosse um homossexual enrustido, que não saiu do armário por causa da mãe durona. O filme cria dois personagens secundários para expressar a duplicidade de Hoover - a secretária devotada e o ‘amigo’. Arrisca cenas ousadas (o beijo) ou patéticas, quando Hoover entra em colapso e se veste com as roupas da mãe (como Norman Bates), após a morte da velha senhora. Da mesma forma, Clint volta-se sobre dois filmes anteriores para seguir nessa duplicidade (Sobre Meninos e Lobos) e para expor os métodos do G-Man que reformulou o FBI (o sequestro do menino, como em A Troca). É tudo potencialmente interessante, mas Clint errou a mão no distanciamento (afinal, nunca foi brechtiano) e a maquiagem horrível derruba a narrativa em dois tempos. A melhor cena é pura ficção investigativa. Tolson, o amigo, diz que Hoover pode enganar todo mundo, até a si mesmo, mas não a ele. É tão boa que ‘quase’ vale o filme.
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