PUBLICIDADE

A volta do gênero ´espanda-e-sandália´

Por Agencia Estado
Atualização:

Assim como E o Vento Levou... e as comédias de Charles Chaplin, todo mundo já parou duas horas na frente da TV ou sentou-se no escuro do cinema para ver um filme do gênero "espada-e-sandália". Esses épicos sobre a Roma antiga e o apogeu e queda de um dos mais fascinantes impérios mundiais ganharam fama na década de 50 com o estrondoso sucesso de bilheteria de filmes como Quo Vadis? (de Mervin LeRoy, 1951) e Demétrio e os Gladiadores (Delmer Daves, 54) e o cunho de clássicos como Ben-Hur (William Wyler, 59) e Spartacus (Stanley Kubrick, 60). Mas, na primeira metade de década de 60, os filmes de espada-e-sandália ficaram mais dispendiosos. Criados para superar os anteriores, os novos hibrídos do gênero acabaram se tornando produções ungidas pelo excesso. Cleópatra (Joseph L. Mankiewicz, 63), a história do triângulo amoroso entre a rainha do Egito (interpretada com pompa e circunstância por Elizabeth Taylor) com os nobres romanos Marco Antônio (Richard Burton) e Júlio César (Rex Harrison), até hoje carrega o título do mais caro longa já produzido por Hollywood. E também um dos maiores fracassos já feitos. Quando os diálogos de Barrabás (Richard Fleischer, 61) foram ridicularizados pelo público; John Wayne apareceu como um improvável romano em A Maior História de Todos os Tempos (George Stevens, 65); e descuidados extras, interpretando ancestrais com toga e cabelos crespos, foram registrados para sempre na tela com relógios made in Suiça em seus pulsos, ficou evidente que um gênero cinematográfico estava marcado para morrer. Durante os 35 anos seguintes, idéias de ressuscitar o gênero ficaram sempre enterrradas ao pé do Vesúvio. Nenhum produtor parecia ter coragem de colocar um astro moderno de Hollywood em cima de uma biga ou fazê-lo gritar Ave, César! Há dois anos, porém, quando Steven Spielberg rodava seu fracassado épico Amistad, o roteirista do filme, David Franzoni, relatou ao diretor de E.T. - O Extraterrestre sua idéia de escrever uma história sobre a Roma antiga. Spielberg farejou sucesso num filme passado nas arenas do Coliseu e, por meio de seu estúdio DreamWorks SKG, desenvolveu o esboço de Gladiador (Gladiator). "aqueles que estão para morrer, nós os saudamos" Esta superprodução de US$ 103 milhões, dirigida pelo cineasta inglês Ridley Scott (de Blade Runner - O Caçador de Andróides), chega aos cinemas de todo o Brasil nesta sexta, duas semanas depois da ruidosa estréia no circuito americano, onde o filme já faturou um total de US$ 73.3 milhões e continua no primeiro lugar das bilheterias. Os produtores Walter F. Parkes e Douglas Wick, emissários da "idéia maluca" de Spielberg, fizeram uma visita ao escritório de Scott, em Beverly Hills, para convencer o diretor de Thelma Louise a dirigir Gladiador. Além de ser um mestre do cinema-publicitário, ou seja, daqueles filmes que enchem os olhos com imagens espetaculares, há muito tempo o cineasta inglês alimentava a idéia de fazer um épico sobre Alexandre, o Grande, rei da Macedônia, responsável pela conquista do Império Persa. Como a própria dupla de produtores não estava muito convencida de que o roteiro de Gladiador estava no ponto, especificamente o recheio do filme, eles levaram uma arma extra para convencer Scott: uma reprodução do óleo Pollice Verso, pintado pelo francês Jean-Léon Gérôme (1824/1904) e com a inscrição "aqueles que estão para morrer, nós os saudamos". A pintura de um gladiador olhando para o camarote do imperador e pedindo permissão para matar, que tanto influenciara Stanley Kubrick a criar situação semelhante para Kirk Douglas em Spartacus, iria convencer também Scott, um ex-estudante de pintura do Royal College of Art, de Londres. "Olhei para aquela reprodução e pensei: ´que grande idéia´", explica o inglês durante uma entrevista coletiva para 30 jornalistas estrangeiros. "O trabalho de um cineasta é sempre achar o centro, a paixão, e o porquê de investir seu tempo numa história", continua. "E eu fiquei aceso ao ver aquela reprodução e após refletir sobre o fato de nunca ter tentado algo do gênero". O Gladiador Assumindo o papel antes oferecido a Mel Gibson está o neozelandês Russell Crowe, recentemente indicado para o Oscar de melhor ator por O Informante. Uma das estrelas mais interessantes e talentosas a surgir em Hollywood nos últimos anos - e também um dos atores mais indóceis -, Crowe é alma de Gladiador. Ele interpreta o personagem fictício do general Maximus, um ex-fazendeiro com sangue espanhol que vem a se tornar o arquiteto de uma das maiores vitórias do exército do imperador Marco Aurélio (o ator inglês Richard Harris): o embate de 17 anos numa floresta escura e densa contra guerreiros germânicos, no ano de 180 a.C. Enquanto seu exército comemora a árdua vitória num acampamento, Marco Aurélio, o mais filosófico dos imperadores da Roma antiga, anuncia o enfraquecimento de sua saúde e diz a Maximus que pretende confiar-lhe o comando de seu reino, que naturalmente pertencia a seu filho Commodus (Joaquin Phoenix, irmão de River Phoenix) Ao saber das intenções do pai, Commodus (Joaquin Phoenix, irmão de River), um jovem inseguro e depravado, o estrangula e assume o poder. Não sem antes decretar o assassinato de Maximus. Na floresta que acabara de lutar, o general espanhol consegue escapar, mas não a tempo de salvar sua família (o filho de Maximus é interpretado pelo garotinho italiano Giorgio Cantarini, de A Vida é Bela). Na parte do roteiro de Gladiador que assemelha-se ao de Spartacus, Maximus, agora conhecido como o "espanhol", é vendido como escravo e vai parar numa escola de gladiadores, em Marrocos, comandada por Próximo (Oliver Reed). Lá, ele recebe o treinamento necessário antes de seguir para Roma e apresentar-se na arena do Coliseu. Ao descobrir a verdadeira identidade de Maximus, Commodus tenta aniquilar seu inimigo com todos os truques disponíveis dentro da arena. Por outro lado, sua irmã, Lucilla (a atriz dinamarquesa Connie Nielsen, que pode ser vista também em Missão: Marte), que vive uma relação amorosa com o irmão - e um flerte com Maximus - arma um complô com o senador Gracchus (Derek Jacobi), também personagem fictício, para derrubar o irmão. Para recriar impressionantes milagres arquitetônicos, como o Coliseu por dentro, as escadarias do Fórum e a silhueta do Senado, a equipe de Gladiador filmou na Ilha de Malta, no Mediterrâneo. As cenas da batalha inicial contra o exército germânico foram filmadas num bosque da Inglaterra e as do treinamento na escola de gladiadores em Marrocos. Para "erguer" o Coliseu foi necessário um orçamento de US$ 1 milhão. Poderia ter sido três vez mais, caso a equipe técnica do filme não tivesse construído apenas 40% da extensão do gigantesco estádio e apenas dois de seus cinco andares de arquibancada. "O resto foi tudo criado por efeitos computadorizados", explica Scott. Show de TV Ao contrário das verdadeiras batalhas de gladiadores, repletas de animais para serem abatidos, Scott preferiu concentrar-se no enfrentamento de seus brutamontes com quatro tigres de Bengala. Para filmar essas e outras cenas de luta dentro do Coliseu, Scott e seu diretor de fotografia, John Mathieson, estudaram os movimentos das câmeras dos shows de luta livre (wrestling), coqueluche atual da TV americana. Ao contrário de Dalton Trumbo, o roteirista de Spartacus perseguido pela lista negra do general McCarthy, que usou no filme de Kubrick fortes pinceladas de crítica política, Scott vê seu Gladiador como um filme perfeito para descrever a indústria moderna de entretenimento, com seus filmes violentos como O Clube da Luta, videogames e as lutas livres de TV. "Caso gladiadores existissem hoje, teríamos um show de TV com audiência recorde", avalia o inglês. "Não precisamos mais sair de casa, pois temos grande eficiência em abastecer nosso lar com imagens violentas", conclui. Além do amontoado de problemas trazidos pelo visual de seu filme, Scott teve que lidar com três outras grandes adversidades. O miolo do roteiro, que narra a venda de Maximus como escravo e seu treinamento no Norte da África, era inconsistente. Um terceiro roteirista escrevia, a toque de caixa, o script, que ficava pronto poucas horas antes do ator entrar em cena. Crowe, farejando problemas, começou a criar oposição contra seus diálogos. Ele os achava ridículos demais. Para ajudar, três dias antes de encerrar sua participação no filme, o ator inglês Oliver Reed morria de um ataque cardíaco, num pub de Malta depois de uma noite regada a uísque. Uma cena crucial do ator foi criada com o auxílio de efeitos especiais. Apesar de incorreções históricas e um roteiro que foi criticado por muitos, Gladiador nasceu carimbado com o selo de sucesso. Espera-se que uma nova leva de filmes de espada-e-sandália surjam depois da produção de Scott. Um dos trabalhos sobre gladiadores desenvolvido no momento é o longa Gates of Fire, adaptação do livro de Steven Pressfield sobre a história de 300 espartanos que se levantaram contra o exército Persa. No ano que vem, começará a ser produzida para um canal de TV a série Spartacus, inspirada no guerreiro já interpretado por Kirk Douglas. A Morte De Oliver Reed Muitos acreditavam que o personagem Próximo, de Gladiador, reavivaria a carreira do ator inglês Oliver Reed, famoso por suas participações em Oliver! (de Carol Reed, 1968) e Mulheres Apaixonadas (Ken Russell, 69). Mas, no dia 2 de maio de 1999, três dias antes de encerrar sua participação no filme, Reed, notoriamente conhecido por seus excessos com a bebida, morria aos 61 anos num pub de Malta, após uma tarde regada a uísque e quedas de braço de ferro com os marinheiros locais. A perda de Reed abriu um crise no set do filme de Ridley Scott. Como a maioria de suas cenas já haviam sido rodados, e elas incluíam centenas de extras, foi descartada da idéia do recrutamento de outro ator para o trabalho. A solução, então, foi gastar US$ 3 milhões na recriação digital do ator. Closes no rosto do ator foram escaneados num computador e depois colocado por cima do de um dublê de corpo que fez a cena.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.