'À Prova da Morte', um Tarantino à toda velocidade

'Ninguém escreve diálogos melhor do que eu', diz o diretor Quentin Tarantino

PUBLICIDADE

Foto do author Redação
Por Redação
Atualização:

Luiz Carlos Merten

 

PUBLICIDADE

SÃO PAULO - Em Cannes, há três anos, ele chegou como campeão. Quentin Tarantino, de novo na competição, tentava bisar a Palma de Ouro que recebeu por Pulp Ficton (Tempo de Violência), nos anos 1990. Cahiers du Cinéma estampou na capa sua aposta no festival daquele ano e era justamente À Prova de Morte (Death Proof), batizado como Le Boulevard de la Mort. Na volta de Cannes, a revista continuou elogiando o filme, mas a capa, agora, era de Zodíaco, de David Fincher, que, a propósito, também não ganhou (a Palma).

 

 

 

À Prova de Morte estreia hoje na cidade. Só o fato de o filme entrar em cartaz já é uma vitória. O filme foi concebido como parte de um díptico que Tarantino fez com seu amigo, o também cineasta (tex mex) Robert Rodriguez. A ideia era recriar os programas duplos - Grindhouse - que caracterizavam o cinema massivo norte-americano, alimentando drive-ins e salas da meia-noite, abertas 24 horas, de todo o país. Esses filmes, de ‘exploração comercial’, se revelaram uma tendência forte a partir dos anos 1950, quando os estúdios foram proibidos, por lei, de possuir salas de exibição, até os 70.

 

O filme de Tarantino e o de Rodriguez (Planeta Terror) nasceram juntos, e complementares, mas o público rejeitou Grindhouse. Lançado no Brasil, Planeta Terror também não foi lá essas coisas. A distribuidora Europa, que apostava numa visita de Tarantino ao Brasil para incrementar o lançamento, desistiu de À Prova de Morte. Os direitos foram repassados à PlayArte, que, após o megassucesso de Bastardos Inglórios, achou que valeria investir neste outro Tarantino, anterior.

 

No ano passado, durante as entrevistas de Bastados Inglórios - o filme ganhou o prêmio de melhor ator, Christoph Waltz, em Cannes -, o cineasta voltou repetidas vezes a À Prova de Morte. Disse que seu filme, ao contrário das produções rasteiras e sensacionalistas das Grindhouses, era uma obra elaborada, na qual ele investiu o melhor de seu talento. Tarantino defendeu, principalmente, seu roteiro - e chegou a admitir que se considerava mais roteirista que diretor. "Não sei se creio em Deus, mas se ele existe me deu um dom divino - sou muito bom dialoguista. Sem modéstia, ninguém escreve diálogos melhor do que eu."

 

Os diálogos de Bastardos Inglórios, disparados, como metralhadoras, por Brad Pitt e seus amigos, são outra prova disso, mas À Prova de Morte é agora o filme que você precisa ver. Os jovens, muito provavelmente, vão gostar mais, embarcando de cara na proposta tarantinesca. Os demais espectadores - os velhos? - talvez precisem elaborar um pouco, até se dar conta de que o filme é autoral como Cães de Aluguel, Pulp Fiction ou Kill Bill, que compõe outro díptico, aquele integralmente de Tarantino. O que estraga À Prova de Morte talvez seja Planeta Terror. Robert Rodriguez fez o protótipo do filme trash, sem muitos níveis (embutidos) de leitura.

 

Publicidade

Tarantino assume que À Prova de Morte - definido como ‘slasher movie’, ou seja, um filme de horror em que um psicopata faz vítimas sequenciais- é feminista, na vertente de Jackie Brown e Kill Bill. E ele explica seu feminismo - "Confio mais nas mulheres do que nos homens. Meus amigos me decepcionaram mais." Simples assim, mas ele desenvolve mais a ideia, se você pedir. "Saio muito com mulheres. Minhas melhores amigas integram hoje grupos étnicos. E são jovens, mais jovens que eu. Saímos para beber, falar sobre cinema e sexo." Justamente o sexo fornece o subtexto de À Prova de Morte.

 

O filme é sobre esse ex-dublê, Stuntman Mike (Kurt Russell), que equipou seu supercarro para resistir a choques frontais e cai na estrada como um predador, atrás de belas mulheres. No começo, no bar, mulheres falam de quê? De homens. Como um diretor habituado a reproduzir o linguajar dos machos se sente à vontade para também criar o das fêmeas? Tarantino responde: "Não seria um roteirista, se não tivesse essa facilidade. Um escritor, para justificar a função, tem de saber dar voz a todo mundo, mas no meu caso é mais fácil. Basta dar voz a minhas amigas."

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.