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A morte tratada com uma simplicidade visual

Filme contemplativo, 'O Segredo das Águas', de Naomi Kawase, detalha o ciclo da vida e o relacionamento com o mar e a natureza

Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Por Luiz Zanin Oricchio
Atualização:

O Segredo das Águas

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, de Naomi Kawase já foi chamado de "cinema new age". Maldade. O filme é uma preciosidade. E se tudo que fala no ciclo da vida, infância, maturidade, velhice e morte, relação com a natureza, sexualidade, busca da paz interior fosse descartável como autoajuda de luxo, metade da filosofia ocidental, e a filosofia oriental inteira, teriam de ser atiradas na primeira lata do lixo da esquina. São inquietações permanentes da alma humana, nada menos, e ninguém tem culpa formada ao trazê-las de volta, ainda uma vez.

"O Segredo das Águas". Filme trata de amor e morte Foto: Divulgação

O que temos é uma ilha japonesa, no qual as tradições de culto à natureza são mantidas. Nelas, dois adolescentes descobrem a sexualidade e enfrentam problemas familiares. Um mistério mais profundo se insinua no dia em que aparece um cadáver na praia. As imagens são belíssimas. E há todo um relacionamento com o mar e com as forças da natureza (ventos e marés) que dão o estofo da história. No todo, O Segredo das Águas é um filme contemplativo - no que o termo recobre de melhor. Quer dizer, busca levar o espectador a uma imersão nos tempos e sensações dos ilhéus, em especial dos adolescentes protagonistas. Mas não é um filme sem trama. Pelo contrário, os acontecimentos estão lá, narrados sob a forma de uma história de descoberta, da dor e prazer causados pelo crescimento. Há nele algo de muito oriental, além do idioma falado - a relação entre jovens e idosos. Se no mundo ocidental foi estabelecido um muro entre as gerações, em outras sociedades parece haver uma permeabilidade maior entre pessoas de diferentes idades. Não que ela se dê sem conflito. Pelo contrário, o confronto entre o adolescente Kayto e sua mãe é quase brutal. E sua relação com o pai, que mora em Tóquio, é cheia de ambivalência. Tal qual poderia ocorrer entre o filho e os pais de um casamento desfeito em qualquer parte do mundo. Mas a presença de um personagem mais idoso, um velho pescador, dá uma dimensão nova à vida daqueles jovens que se iniciam na existência. Ela nada tem de caricatural ou piegas. É apenas a fala de alguém muito experimentado e que sabe ter a morte próxima de si.

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