PUBLICIDADE

A fineza do cantor oficial de Botafogo

Walter Alfaiate - A Elegância do Samba narra a história de um carioca dedicado a roupas e à batucada

Por Francisco Quinteiro Pires
Atualização:

No cartão profissional, oferecido a clientes e amigos, lê-se: "Walter Alfaiate, o magnata supremo da elegância moderna." Esse título talvez esteja com os dias contados. "A vida continua por aqui, mas falta gente querendo fazer roupa", diz Walter. "As pessoas estão comprando do chinês, porque é mais barato, mas a qualidade é bem inferior." E nem adianta lembrar o que até outro dia se ouvia na secretária eletrônica do ateliê de Walter localizado na Galeria Ritz, nº 610 da Av. Nossa Senhora de Copacabana, no Rio. "Estás mal vestido e com dinheiro no bolso? Não vais arrumar nada, meu camarada. Estás bem vestido e sem dinheiro no bolso? Vais arrumar o que quiseres. Deixe o seu recado."

 

Veja também:

 

O documentário Walter Alfaiate - A Elegância do Samba não registra todos esses detalhes, mas cria um retrato das várias facetas daquele que é considerado por Paulinho da Viola "o cantor oficial de Botafogo". Dirigido por Vital Filho, Emiliano Leal, Paulo Roscio, Rommel Prata e Vitor Fraga, o filme homenageia todo artista que fez fama após entrar na casa dos 60 anos. Walter Nunes de Abreu lançou Olha Aí (1998), o primeiro CD, quando completou 68. Mas sua história começa na adolescência, nos anos 1940, quando escolheu ser alfaiate e ingressou no bloco carnavalesco Paraíso das Cabrochas, dirigido por Oswaldo Tintureiro.

 

Walter Alfaiate é um dos bambas de Botafogo, "um pedaço da zona norte na zona sul", na definição de Regina Casé, uma das moradoras ilustres do bairro de onde saíram, entre outros, Mauro Duarte, Mical, Zorba Devagar e Niltinho Tristeza, influências de Paulinho da Viola. Botafogo também é importante por ser uma das origens, ao lado do Cacique de Ramos, como lembra Nei Lopes, do pagode de quintal, que nos anos 1980 mudou a pegada do samba com a inclusão de novos instrumentos, como o banjo, o tantã e o repique de mão. É famoso o Cantinho da Fofoca, frequentado pela turma botafoguense e onde Beth Carvalho conheceu Walter, que antes de Alfaiate foi chamado de Walter Sambista e Walter Sacode, por fazer sucesso com a interpretação de Sacode Carola (Alfredo Marques e Hélio Nascimento).

 

Embora lamente o fato de a família de Mauro Duarte não ter liberado o samba A.M.O.R, gravado em Olha Aí, Walter espera que o filme seja "como uma flor que se abre na minha vida". Em 2005, Walter lançou Tributo a Mauro Duarte, homenagem ao parceiro que conheceu num Botafogo contra Fluminense. "Não dá para sentir tristeza, porque ele nunca fica muito tempo por cima", diz o sambista sobre o time da estrela solitária. Lançado depois de Samba na Medida (2003), Tributo... é o último CD de Walter, que deseja gravar o quarto disco neste ano. "Gostaria de mostrar meu lado crooner." Junto com sambas sincopados - especialidade desse mestre da divisão rítmica do canto, com uma voz de timbre encorpado, herdeiro da escola de Ciro Monteiro -, ele gravaria sambas-canção que interpretava na boate Bolero, na Copacabana dos anos 1950.

 

Publicidade

Os amigos de Walter são unânimes em dizer que ele é o último dos representantes do carioca da antiga: um malandro de fina estampa, simpático e doce no trato, que vê a vida como se brincadeira fosse. "O carioca da minha safra é mais maneiro mesmo." Se se recuperar de "uma gripe terrível", Walter estará na sessão do documentário exibida às 21h30 de quarta, no CineSesc (tel.: 3087-0500). "Está calor aí em São Paulo? Detesto frio." Depois de pedir um clima mais ameno, Walter Alfaiate confessa um segredo. "Toda vez que chego a São Paulo, o sol aparece." Oxalá.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.