Waltercio Caldas mostra no Rio 19 obras inéditas na exposição 'Estados de Imagem'

Artista tem mais de quatro décadas de carreira

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Por Roberta Pennafort
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RIO - A cada exposição, Waltercio Caldas gosta de escolher, ele mesmo, sem a ajuda de um curador, as obras que serão exibidas. Sugerir as pontes e os diálogos a serem traçados entre suas obras é um prazer do qual o artista, aos mais de 40 anos de trajetória, não imagina abrir mão em vida. Em Estados de Imagem, que a Mul.ti.plo Arte inaugurou quinta-feira, dia 24, a intenção é apresentar desenhos que trazem, cada um, uma questão diferente, um discurso próprio e independente.  O pressuposto é de que o papel não seja encarado como superfície, mas como espaço. A quem buscar um tema único, comum a todas as 19 obras (15 desenhos, três objetos e múltiplo), o aviso: o assunto não é outro que não o desenhar, as imagens são “atitudes em si”.   As figuras estão apoiadas em sua gravidade, os traços estão suspensos no ar, e podem vir acompanhados de palavras e-ou de pequenas esferas, que furam o papel. Os desenhos se percebem como tal, metafisicamente, acredita Waltercio. “Acho que ‘desenho’ é um termo limitado para definir esses trabalhos, da mesma forma que ‘escultura’, para outros. São objetos de papel, desenhos que querem ser tridimensionais. Tenho certo amor por eles. O papel é mais vazio do que uma tela branca, é muito mais ‘nada’. Chega isento, sem história, você pode traçar uma linha e ela flutua”, explicou o artista carioca na última terça-feira, numa visita guiada particular para a reportagem do Estado.

2017. Obra sem título Foto: Jaime Acioli

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Inéditas, as obras foram criadas de 2012 para cá. Ao reuni-las para a galeria do Leblon, Waltercio conta que pensou numa frase antiga do cantor João Gilberto sobre “a rima do ritmo” que busca em sua música. Numa obra à entrada da galeria, carimbou a palavra “pedra” inúmeras vezes, como se a estivesse esculpindo ou lascando, e de modo que a ação de carimbar conferisse mais uma dimensão ao resultado visual.

Noutra, as palavras “desenho branco”, grafadas duas vezes e com a primeira e a última letras alongadas, deixam o protagonismo para o traço. Certa vez, recorda-se, declarou que “se o artista tem alguma função é melhorar a qualidade das descobertas”. “A arte tensiona o que a gente sabe o que não sabe”, e dessa reflexão surgiu “O que não sei”, as palavras em meio a linhas retas e retângulos colados ao papel. Mais adiante, o espectador encontra um espelho de papel em que sua imagem pode ser refletida apenas nas três minúsculas esferas que o compõem - ou nem nelas.

A questão da tridimensionalidade vem de sua gênese artística, na virada para os anos 1970. Já em suas aulas no Museu de Arte Moderna, com Ivan Serpa, em 1964, e na primeira exposição individual, no mesmo MAM, em 1973, quando passou a chamar a atenção da crítica, o jovem Waltercio desenhava a terceira dimensão. O que poderá ser comprovado no livro Os Desenhos (Bei Editora), com texto de Lorenzo Mammì sobre a importância do desenho na produção de Waltercio, a ser lançado durante o período da exposição.

“Não quero fazer filosofia com o desenho, mas que ele filosofe, pense a seu respeito”, disse. “O desenho aqui se transforma em traço, e não o contrário. Uso as dobras, as esferas, as palavras, as cores, sempre pensando o espaço. Com esse material, poderiam ser feitas várias exposições, estabelecendo relações diferentes entre as obras. A soma é maior do que as partes.” 

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