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Uma janela aberta para a produção da Índia

Mostra espanhola homenageia a arte do país, popular, mas pouco compreendida

Por Camila Molina
Atualização:

Como é a arte contemporânea indiana? No caso do mercado de arte, um certo apelo pela Índia é claro que não tomou fôlego indo na onda da novela da Rede Globo. Cerca de três ou quatro anos atrás, como diz o curador indiano Bose Krishnamachari, a arte da Índia vem refletindo a vontade de os artistas daquele país se empenharem em projetos mais ambiciosos. "Nos anos 1990 teve início uma mudança na arte indiana, algo que seguiu com a economia, como aconteceu na China. Tudo está dentro de uma situação global", afirma o curador e também artista, emendando ao mesmo tempo que hoje em dia a arte contemporânea é uma espécie de "linguagem de massa". Krishnamachari foi o responsável por conceber o panorama da atual arte indiana para a edição deste ano da Arco - Feira de Arte Contemporânea de Madri, que ontem abriu as portas nos pavilhões 6, 8 e 10 da Ifema, centro ferial da capital espanhola abrigado no Parque Juan Carlos I, para convidados e para a imprensa. A Arco 09, em sua 28 edição (é realizada em fevereiro em Madri), tem a Índia como país convidado. Na feira, que será inaugurada oficialmente hoje, com a presença tradicional do rei Juan Carlos II e da rainha Sofia, e até segunda-feira poderá ser vista pelo público, tem espaço especial dedicado à Índia, uma mostra que reúne 42 artistas selecionados por Krishnamachari, todos de 13 galerias indianas sediadas principalmente em Bombai e Nova Délhi. Veja galeria de imagens da Arco Fala-se tanto sobre a Índia, inclusive que ela é a bola da vez no mercado de arte, e o que se vê neste panorama da Arco? Infelizmente, não se vê uma imagem empolgante da produção. No pavilhão 6 da Ifema, onde estão os estandes das galerias do país, um ou outro trabalho chama a atenção, como o de Shilpa Gupta, indiana residente em Berlim e tem em seu currículo participações em Bienais, como a de Seoul e de Sydney. No estande da galeria Bodhi Art (com atuação em Bombai, Berlim, Nova York e Cingapura), a instalação I Have Many Dreams, avaliada em 50 mil, instiga o espectador ao colocar um trio de telas com o que seria o retrato posado de três meninas pintadas em estilo hiper-realista e, na frente das pintura, um microfone de onde sai o som de uma canção cantada por uma jovem. Shilpa cria uma ação em dois tempos. Mas, de resto, no panorama da Índia, o que chama a atenção é uma espécie de arte decorativa por vezes, mesclada por obras de denúncias literais dos tantos problemas enfrentados pelo segundo país mais populoso do mundo - enquanto um dos artistas faz carros que remetem a ossos e outro apresenta a foto de um mar de latas de refrigerantes amassadas, talvez apenas a obra escultórica Night Fountain, de Anandajit Ray (uma cama de casal feita com canos e torneiras), abra espaço para a poesia dentro do comentário político sobre a desigualdade social do país, onde falta de água em alguns locais. De resto, o que se vê são fotografias, pinturas e objetos - não há quase nada de vídeo selecionado pelo curador. Um jornalista indiano disse estar decepcionado com as escolhas Krishnamachari, que há, sim, algo mais palpitante sendo feito por indianos do país de Anish Kapoor. A programação da Arco ainda inclui outras seções dedicadas a artistas indianos. É tempo de crise econômica e é certo que isso se reflete numa feira de arte. "Ninguém nega que se trata de uma edição especial, por causa da conjuntura internacional que a rodeia, com a vista colocada na linha da moderação e serenidade pelos últimos índices do mercado", afirma Lourdes Fernández, diretora da Arco pelo terceiro ano. Dados concretos sobre vendas só serão divulgados no fim da feira, mas de certa maneira é possível destacar algumas características desta Arco especial, mesmo assim, realizada com o mesmo montante do ano passado, com 8 milhões, "apertando o cinto", como diz Lourdes. A historiadora de arte que apresentou a Arco a um grupo de jornalistas contou que esta edição retoma o clássico, os autores consagrados e o suporte fotográfico, todos esses mais fáceis e acertados de se vender. É curioso como a fotografia (de todos os tipos de autores e países, desde Thomas Struth a jovens) é o grande destaque da feira, até mesmo em relação às obras pictóricas, que estão sempre se referindo ao gênero fotográfico. BRASILEIROS No ano passado, o Brasil foi o país homenageado da Arco e, para a ocasião, o Ministério da Cultura do Brasil bancou grande representação de arte brasileira no evento, um panorama com obras de 108 artistas em atividade representados por 32 galerias, mostra com curadoria de Paulo Sergio Duarte e Moacir dos Anjos. Foi, por assim dizer, um "ano atípico" para o Brasil na Arco (o país também homenageado em 1997 na feira, porque o segmento especial era dedicado à arte latino-americana), pois, além da mostra principal, algumas galerias compraram estandes em outros espaços da feira, o que deu grande visibilidade à arte nacional. Uma ação ampla, com financiamento de R$ 2,6 milhões, promoveu ainda uma programação de arte brasileira por diferentes instituições da capital espanhola, como a exposição de José Damasceno no Centro Nacional Reina Sofia, mostras de Carmela Gross e Fernanda Gomes no Matadero Madrid e as de Lucia Koch e Marcelo Cidade em La Casa Encendida. O Brasil está nesta 28ª edição da Arco representado por sete galerias. No programa geral, selecionadas pelo comitê do evento (mas deve-se dizer que ir a uma feira internacional nestes tempos demanda um alto para os galeristas) estão Dan Galeria, Gabinete de Arte Raquel Arnaud, Galeria Leme e Galeria Nara Roesler, todas de São Paulo. Já na seção Solo Projects, no pavilhão 6, em que curadores de vários países são convidados para escolher artistas que apresentarão um trabalho individual, o brasileiro Moacir dos Anjos selecionou Carlos Contente da galeria A Gentil Carioca (RJ); Matheus Rocha Pitta, da Novembro Arte Contemporânea (RJ): Matheus Rocha Pitta; e Nicolas Robbio, da Galeria Vermelho (São Paulo). "São jovens, ainda pouco conhecidos principalmente no exterior e com obras originais e potentes, com todas as condições de alçar voos mais altos", diz o curador. No ano da crise, o projeto Brasil Arte Contemporânea, realizado pela Apex-Brasil, deu ajuda de custo para seis das sete galerias participantes (a Dan Galeria optou por não participar). Uma das iniciativas do programa é dar visibilidade à arte brasileira, apoiando galerias a participarem de feiras internacionais. No caso desta edição da Arco, a Apex, segundo a gerente do projeto, Flávia Abbud, deu ajuda de 7 mil para cada galeria comprar seu estande (mas o dinheiro é dado diretamente à organização da feira, nem passa pela galeria). "O aporte é igual para todos e cada um decide a área de seu estande. Dependendo da escolha, os 7 mil já pagam todo o espaço da galeria, como é o caso dos três participantes dos Solo Projects", diz Flávia. Já no caso da Raquel Arnaud, que optou por ter o estande de maior área, o aporte da Apex pagou por 25% do total, por exemplo. No ano passado, no Ano do Brasil na Arco, o programa da Apex apoiou galerias com um total de R$ 150 mil. Nos estandes brasileiros há de tudo, desde a arte bem contemporânea (como nos espaços da Galeria Leme e da Galeria Nara Roesler) até os grandes consagrados, do concretismo para cá. "Estou otimista. Pouco a pouco a arte brasileira não é novidade no cenário internacional e isso abre o mercado, tem de se persistir. O foco da participação constante é divulgar as obras dos artistas e não a venda imediata. É um trabalho lento, com continuidade", diz Flávio Cohn, da Dan. Desde 2001, a galeria já foi seis vezes à Arco, levando obras de contemporâneos, mas também modernistas e agora, ainda, apostando nos concretistas (a fase de Lygia Clark, Fiaminghi, Charoux) e outros de renome, como Mira Schendel (que neste ano terá mostra dedicada à sua obra no MoMA de Nova York) - afinal, um perfil de artistas sempre mais caros. "O mercado é internacional, não espanhol", diz Cohn, também reforçando que é numa feira internacional que diretores de instituições e grandes colecionadores, como bancos, estão sempre de passagem. Raquel Arnaud também faz sua aposta em artistas de peso, como o escultor Sergio Camargo, Arthur Luiz Piza, Cruz-Diez, Soto e Waltercio Caldas. A repórter viajou a convite do Centro Oficial de Turismo Espanhol, Arco 2009 e Iberia - Líneas Aéreas de España NÚMEROS 238 galerias no total 32 países participantes 13 galerias são de 6 países latino-americanos 7 galerias são brasileiras no Programa Geral e seção Solo Projects (5 de São Paulo e 3 do Rio) 13 galerias indianas no Panorama Índia 42 artistas indianos na mostra especial 79 galerias espanholas estão na Arco 09 3 pavilhões do Parque Ferial Ifema abrigam o evento Galerias Brasileiras PROGRAMA GERAL: Dan Galeria (São Paulo) Gabinete de Arte Raquel Arnaud (São Paulo) Leme (São Paulo) Nara Roesler (São Paulo) SOLO PROJECTS (curadoria de Moacir dos Anjos): A Gentil Carioca (Rio de Janeiro): artista Carlos Contente Novembro Arte Contemporânea (Rio de Janeiro): artista Matheus Rocha Pitta Galeria Vermelho (São Paulo): artista Nicolas Robbio

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