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Uma atitude milenar que inspira vários criadores

Por Francisco Quinteiro Pires
Atualização:

A atitude milenar dos ciganos diante do mundo sempre fascinou os criadores, segundo Cristina da Costa Pereira. "Para inventar, o artista precisa do sonho", diz. "E os ciganos, pelo fato de estarem sempre caminhando, sem explicarem a causa da sua busca, inspiram uma visão onírica." Um dos capítulos de Os Ciganos Ainda Estão na Estrada é dedicado à presença desse povo errante nas artes. De saída, Cristina alerta para a idealização dos artistas em relação aos ciganos, vistos como seres românticos, à margem do controle social. No cinema, ela pinçou Ingmar Bergman, Federico Fellini, Carlos Saura e Cacá Diegues. Em Fanny e Alexander (1982), Bergman faz um filme autobiográfico em que Alexander se rebela contra a educação rígida, dizendo aos amigos de escola que os ciganos virão buscá-lo. Em O Sétimo Selo (1958), quando a Morte joga xadrez com Antonius Block, surge um casal de belos ciganos que a distraem do jogo; é o momento para o protagonista derrubar o tabuleiro e contrariar os desígnios da senhora fatal. O crítico brasileiro José Lino Grünewald viu na obra de Fellini - como em La Strada (1954) - a fixação pelo mundo do circo e pela estrada: "o caminhar constante da procura, cheio de desencontros." O espanhol Carlos Saura dirigiu Carmen (1983), que fala da montagem da ópera homônima de Bizet por uma companhia de balé e que capta o espírito independente e narcisista de uma cigana cheia de sensualidade. E Cacá Diegues dirigiu Bye Bye Brasil (1979), no qual o protagonista se chama Lorde Cigano, um ilusionista que viaja pelo Brasil para apresentar um espetáculo mambembe com a sua trupe. Para Cristina, João Guimarães Rosa, que estudou o romani e incluiu três histórias com ciganos em Tutaméia, foi quem melhor percebeu as singularidades desse povo. Cecília Meireles os menciona em Romanceiro da Inconfidência. Em Dom Casmurro, Machado de Assis comparou o olhar de Capitu, o mais famoso da literatura brasileira, ao de uma "cigana oblíqua e dissimulada". (É bom lembrar que os ciganos dão extrema importância aos olhos, que revelam as intenções do indivíduo.) A autora cita mais escritores - García Márquez, Lorca, Lawrence, Baudelaire. Além de lembrar as origens ciganas do pianista Wagner Tiso, ela fala do flamenco, que hoje experimenta um boom de gravações e shows na Espanha e que absorveu procedimentos da música cigana.

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