Um raro exemplo de filme que discute idéias

Produção não teme o diálogo nem a argumentação, construindo-se no embate das palavras esgrimidas

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Pode-se não gostar de Redacted, o novo Brian De Palma, mas o filme, com certeza, escancara algumas feridas abertas pela Guerra do Vietnã na vida norte-americana. É o que também ocorre com Leões e Cordeiros, novo filme realizado pelo astro Robert Redford e por ele próprio interpretado, com Tom Cruise e Meryl Streep. Leões e Cordeiros é muito bom, mas corre o risco de não agradar aos que ainda procuram justificativas para a presença norte-americana no Iraque. Na verdade, o filme desmonta todas as teses apresentadas pelo presidente George W. Bush para justificar a guerra, mas seria datado se ficasse só nisso. A discussão de Leões e Cordeiros é mais ampla. Envolve a mídia e ''''o ser ou não ser'''' das questões de consciência - os fins justificam os meios? Leões e Cordeiros é o primeiro filme da nova United Artists, selo que o astro Cruise está tentando revitalizar, após ser despedido da Paramount, apesar dos lucros fantásticos da série Missão Impossível, por seu comportamento considerado bizarro desde que virou militante da Cientologia. O filme estréia simultaneamente nos EUA, o que significa que ainda é cedo para saber se irá bem de bilheteria na chamada ''''América''''. O projeto de Cruise pode depender disso, mas se o seu cinema de idéias (este filme) não tiver respaldo popular, ele vai ganhar rios de dinheiro com o próximo, Valkyrie, uma narrativa de ação sobre o oficial que liderou o complô contra Hitler. Todo mundo adora bater num vilão nazista. Já o de Leões e Cordeiros nem chega a ser um vilão tradicional, porque o senador interpretado por Cruise pode ser ambicioso, mas está agindo de acordo com sua consciência. A complexidade do filme consiste em dar voz e expor os motivos de todo mundo. O roteirista Matthew Carnahan disse que teve a idéia para Leões e Cordeiros quando zapeava em sua TV. Num canal, ele viu imagens de uma multidão reunida num estádio, celebrando um jogo decisivo. Em outro, a imagem dos cadáveres de mortos no Iraque. O filme começou a nascer do choque que lhe produziram as imagens. O relato desenvolve-se em três frentes - a entrevista da repórter Meryl Streep com o senador Tom Cruise, que tem um plano de ofensiva final no Iraque; o diálogo do professor Robert Redford com o estudante Andrew Garfield, onde o que se discute é a alienação da juventude; e a situação extrema em que caem dois voluntários - um negro e um chicano - que vêem no Iraque a última fronteira para brigar por inclusão social. Poucos filmes produzidos nos EUA discutem idéias assim, expondo argumentos em diálogos esgrimidos por personagens em campos opostos (e que não são, a priori, catalogados como bons e maus). Mais até do que a política de Bush filho, o que está em discussão é o chamado quarto poder, a imprensa. Procurando muito, você poderá até achar os defeitos de Leões e Cordeiros, mas nem isso tirará a força que o filme tem. Serviço Leões e Cordeiros (Lionsfor Lambs, EUA/2007, 92 min). Drama. Dir. Robert Redford.14 anos. Cotação: Bom

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