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Trueba, homenageado no In-Edit

Cineasta vencedor do Oscar debate com o público no festival de documentários musicais que mostra El Milagro de Candeal

Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Homenageado do In-edit, Festival Internacional de Documentários Musicais, que começa hoje, o diretor espanhol Fernando Trueba participa, às 19 horas, de um debate sobre música e cinema, no Instituto Cervantes. Madrilenho, de 54 anos, Trueba fez sucesso internacional com Belle Époque, que lhe valeu o Oscar de filme estrangeiro. No Brasil, chamou-se Sedução. Por melhor que seja o diretor de ficção, há outro Trueba, o autor de documentários musicais. Ele próprio explica: "Para o pessoal de cinema, e talvez no Brasil, Sedução seja meu filme mais conhecido. Mas, para o pessoal da música, melhor é Calle 54, e muito me orgulho disso." O In-edit homenageia Trueba exibindo justamente Calle 54 e outro documentário, mais recente dele, El Milagro de Candeal, que fez em Salvador, com o lendário pianista cubano Bebo Valdés. Com 91 anos, Bebo vive na Suécia desde os anos 40. Andava esquecido e Trueba, com sua declaração de amor ao jazz latino, recolocou-o em evidência. Bebo Valdés iniciou nova carreira, vendeu 1 milhão de discos, ganhou três vezes o Grammy e ficou tão popular na Espanha que as pessoas lhe pedem autógrafos na rua. Apaixonado por música instrumental brasileira, Trueba queria fazer um documentário sobre a verdadeira revolução social e musical que Carlinhos Brown e a comunidade estão fazendo no Candeal. "Precisava de alguém que me servisse de guia nessa investigação musical. Alguém de fora, cujo olhar fornecesse o fio para o espectador e eu mesmo descobrirmos o Candeal. Pensei num jornalista, por exemplo, mas aí me lembrei do que Bebo me havia dito. Ele não queria morreu sem visitar a Bahia, convencido de que em Salvador se faz a melhor música de raiz africana do mundo. Propus que ele fosse meu fio condutor e Bebo aceitou, com entusiasmo." O filme conta com participações de Caetano Veloso, Gilberto Gil e Marisa Monte. Gil dá entrevista, Caetano e Marisa cantam. Trueba conta para o repórter o que, provelmente, vai relatar hoje, em seu encontro com o público. Seu amor pelo jazz, e pelo jazz latino, não tem uma origem familiar, por exemplo. Não foi uma coisa que ele herdou dos pais. "Nasci numa casa em que não havia vitrola. Aliás, não tinha livros, não tinha nada. Para dizer a verdade, tinha um livro, a Bíblia." Foi o seu amor pela beleza que o levou a querer ser pintor, mas ele descobriu que não seria um bom pintor. Os livros e a música substituíram a pintura, mas foi o cinema que o possuiu, e ele virou diretor. Se você pedir que ele se defina, Trueba dirá que é diretor de cinema. Ele virou produtor de música em função dos documentários musicais. Criou a Calle 54 Records. Produz os discos (CDs) que gostaria de ouvir. Uma exceção - agora mesmo produz um CD em Nova York para a Warner, com um músico que admira, o saxofonista Phil Woods. Calle 54, o filme, reúne artistas para uma sessão musical única. São músicos do Brasil, de Cuba e Porto Rico, da Espanha, República Dominacana e Argentina. Gente como Eliane Elias, Paquito D?Rivera, Bebo e Chucho Valdés, Chano Dominguez, Michel Camilo, Tito Puente e Gato Barbieri. Trueba ama o jazz latino, mas ele tem um carinho especial pelo jazz brasileiro, mesmo reconhecendo que, no Brasil, ele não seja reconhecido como tal e sim como música instrumental. "Por volta de 1960, o Brasil produzia a melhor música instrumental do mundo, que servia de farol para grandes artistas de todas as partes. Era uma verdadeira revolução, não necessariamente ligada à explosão da bossa nova." É o amor por esse momento específico da MPB que impulsiona seu trabalho. Trueba já fez 160 entrevistas para um filme, que ainda pretende realizar, sobre Tenório Jr. "Ainda quero entrevistar mais gente, mas não será um filme de depoimentos. Quero fazê-lo como documentário, não como ficção, porque acho que o resgate do personagem exige isso, mas ainda não tenho o formato." Tenório Jr. era esse grande músico que sumiu na Argentina, na longa noite da repressão. Sua sorte trágica condensa de alguma forma a visão que Trueba tem da grande música instrumental brasileira. "Muitos daqueles músicos passaram a acompanhar cantores e cantoras. A morte de Tenório Jr. liga-se à brutalidade e ao irracionalismo das ditaduras que ensanguentaram o continente." De tanto pesquisar sobre Tenório Jr., Trueba tem essa sensação de que o conhece profundamente e é um amigo. Ele fala com emoção do Tenório Jr. que enche seus ouvidos, seus olhos. "É como se estivesse vivo por meio de sua arte." O In-Edit Brasil surgiu há sete anos em Barcelona, para fomentar a produção de documentários musicais e oferecer ao público a oportunidade de ver obras talvez difíceis de encontrar no circuito comercial, embora, eventualmente, títulos como Buena Vista Social Club, de Wim Wenders, e Calle 54 tenham se tornado grandes êxitos. Nestes sete anos, o In-Edit chegou ao Chile, à Argentina e ao México. Desembarca agora no Brasil, em São Paulo e no Rio. Ao público caberá escolher o melhor documentário nacional para ser exibido no próximo In-Edit de Barcelona, em outubro. Seis filmes integram a mostra competitiva, entre eles Jards Macalé - Um Morcego da Porta Principal (leia na página ao lado). Na Base da Bossa - 50 Anos de Excelência, Música Subterrânea, Favela on Blast, Dub Echoes e Fandango são os demais concorrentes. As atividades incluem projeções de documentários, debates, shows. Cinema e música. Juntos como o homenageado Fernando Trueba gosta. Serviço Festival Internacional de Documentários Musicais. Até 5/7 Cine Olido. Avenida São João, 473, tel. 3331-8399. R$ 4 Centro Cultural da Juventude Ruth Cardoso. Avenida Deputado Emílio Carlos, 3.641, tel. 3984-2466. Grátis MIS. Avenida Europa, 158, tel. 2117-4777. R$ 5/ R$ 10 CineSesc. Rua Augusta, 2.075, tel. 3087-0500. R$ 3/ R$ 12 Instituto Cervantes. Av. Paulista, 2.439, 3897-9609. Grátis HSBC Belas Artes. Rua da Consolação, 2.423, tel. 3258-4092. R$ 8/ R$ 12 Programação completa: www.in-edit-brasil.com

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