PUBLICIDADE

Titãs ''saem do chão'' em CD de inéditas

Redescobrindo suas origens, grupo está gravando álbum com elementos eletrônicos, mostrado com exclusividade ao Estado

Por Marco Bezzi
Atualização:

Um a um eles vão atravessando o corredor estreito que leva ao maior dos estúdios do complexo Midas, em São Paulo. Na parede, discos de ouro e platina de NX Zero, CPM 22 e Charlie Brown Jr. rebatem a luz que vem de fora. Longe da zona de conforto que acostumaram a dividir em estúdios do Rio de Janeiro, os cinco integrantes dos Titãs encaram essa rotina há 12 meses. Tudo para que o novo disco, previsto para sair em maio, volte a mostrar a relevância dos 27 anos de união entre Branco Mello, Charles Gavin, Paulo Miklos, Sérgio Britto e Tony Bellotto. O dia está reservado para a gravação da bateria de Gavin, o mais concentrado dos Titãs. Separado por um vidro à prova de som, o baterista toca no escuro, atrás das peças que compõem seu "brinquedo" de fazer barulho. "Na verdade, ele gosta mesmo é de tocar pelado, mas está fazendo um charme para a imprensa", brinca o guitarrista Tony Bellotto. A cumplicidade entre o quinteto é perceptível a quilômetros de distância. Enquanto Mello - o único a não vestir preto - ajeita seu microfone e Britto empunha o baixo como se segurasse uma peça rara do acervo do Louvre, a sexta peça que compõe o quebra-cabeça titânico está no canto dando a ordem para que Deixa Eu Entrar comece a ser ensaiada. É a primeira vez do produtor Rick Bonadio como comandante de uma banda que não necessita de credenciais. Ligado a artistas diversos como Mamonas Assassinas, NX Zero, Rodolfo e ET, Rouge e Charlie Brown Jr., Bonadio foi escolha unânime entre os cinco Titãs. "O Rick é uma espécie de clínico e conhece muito a nossa obra", conta Miklos. "Ele trouxe uma bagagem toda nova de referências e abriu uma série de possibilidades." O que mais chama a atenção nas seis músicas que a banda mostra com exclusividade ao Estado é a inserção de elementos eletrônicos. Em Múmias, faixa com pouco sinal de bateria orgânica, Paulo Miklos grita: "Sai do chão!". Estariam os Titãs aderindo à dance music tardiamente? Bellotto retruca: "Aderimos a uma mistura de elementos muito modernos misturado às máquinas dos anos 80. Isso tudo acaba remetendo ao nosso próprio som." A frase que melhor explica a atual fase dos Titãs vem de Britto: "Somos nossa própria referência." Os 15 discos de estúdio já lançados pela banda ganham novo papel no CD que ainda não tem nome definido. Sem precisar se reinventar, os Titãs voltaram a se descobrir incorporando na nova obra elementos do passado. "Conversamos bastante sobre este álbum ter um frescor, mas em termos de acabamento", afirma Bonadio. "Busquei dentro deles aquele Titãs que todo mundo gosta. Mesmo quando estou programando a bateria eletrônica ou um som diferente penso em como eu gostaria de ver o grupo soando hoje." A primeira música de trabalho será Antes de Você, uma balada com cara de rock de FM. A faixa estrelará a próxima novela das sete na TV Globo, Caras e Bocas, em abril, e traz o refrão "não me lembro como eu era antes de você". Segundo Rick, será uma das músicas do ano. O dedo do produtor é claro. Os vocais estão mais leves e o segundo refrão de Antes de Você traz um vocal dobrado, característica de nomes como CPM 22 e NX Zero. Já Deixa Eu Sangrar traz violinos gravados em Nashville, além de mais elementos digitais. "Poucos grupos de rock topam abrir mão daquela sonoridade de banda para buscar outras coisas. Hoje, o computador é necessário na música pop", assente Gavin. O baterista compara a empreitada com os novos trabalhos de Coldplay e U2. Diz que de cara ficou enciumado com a falta de seu instrumento em todas as faixas, mas, ao ouvir um conselho de Britto, se acalmou: "Ele disse para eu ouvir as músicas como se não estivesse dentro do processo. A partir daí, tudo funcionou". Foram 40 músicas compostas nesse ano de processo entre ensaios, pré-produção e gravação. Dessas, 14 canções devem entrar no novo álbum. Duas parcerias, uma com Andreas (do Sepultura) e outra com Arnaldo Antunes e Liminha, foram selecionadas. "Havia um lastro em cada canção que fez ser possível esse tipo de experimentação dentro do estúdio", conta Mello. "Procuramos uma coisa instigante, forçamos nossos limites. Sempre tentamos fazer algo relevante, mas nem sempre isso acontece. Desta vez, acho que conseguimos", aponta Miklos. Para Gavin e Britto, o limite entre o possível e o impossível sempre esteve próximo. Britto sentiu-se estranho ao tocar baixo pela primeira vez e Gavin, morador do Rio, não suporta mais a ponte aérea: "Nunca fiz uma produção tão longa como essa", desabafa. Tudo para que o resultado seja o melhor. "Estávamos cansados de só escutar gente reclamando da crise. O Rick foi o único cara que teve uma visão otimista. Disse que vamos superar a crise com boa música e criatividade. Vale ressaltar que não chamamos ninguém para gravar o álbum. Somos só nós cinco. Uma volta às origens", retrata Bellotto. No ano em que o grupo lançou o elogiado documentário A Vida Até Parece Uma Festa - com lançamento em DVD em agosto -, tudo parece conspirar para um final feliz. "A carreira deles tem um conceito inabalável. Este disco vai funcionar muito bem", respira aliviado Bonadio. Faixa a faixa ANTES DE VOCÊ: Composta por Miklos, é o primeiro single do álbum. Tem início suave e é desenhada por boas frases de guitarra e teclado. Miklos canta: "Não acho nada na TV / Não me lembro como eu era antes de você." O solo é rasgado e o refrão tem vocal dobrado no estilo CPM 22. A música vai estar na próxima novela da TV Globo, Caras e Bocas. Para tocar nas rádios. MÚMIAS: Com uma demo "tosca" gravada por Miklos, a banda a conheceu. Os teclados lembram Kraftwerk e remetem aos anos 80. O miolo tem um pouco de Pulso e, apesar do experimentalismo, o DNA dos Titãs está intacto. "Sai do chão!", grita Miklos, para finalizar com um "vai tomar no ..." DEIXA EU SANGRAR: Faixa de Britto com orquestra e violinos gravados em Nashville. Não há bateria e os vocais de Britto estão bem suaves. "Hoje é tarde demais pra dizer adeus", canta no refrão. SACOS PLÁSTICOS: Bits misturados com um reggae bem acelerado. Traz Sonífera Ilha para os anos 2000. Branco Mello canta na canção composta por ele e Paulo Miklos. Música frenética. QUANTO TEMPO: Todos os Titãs cantam. Remete à nostalgia de Isso e Domingo. Traz versos como "o tempo passou e esqueci de dizer que agora vou embora". Outra que traz uma levada reggae inserida em loops e batidas digitais. Riff de guitarra contagiante. DEIXA EU ENTRAR: Parceria entre Andreas (Sepultura), Bellotto e Britto. Música pesada, no estilo de Cabeça Dinossauro e Clitóris, com repetição constante de riffs e frases. Branco Mello canta e Paulo Miklos dobra a voz no refrão: "Corpo fechado, por que tanto resguardo?"

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.