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Testamento sonoro de José Agrippino

Documentarista localiza disco perdido que revela outra faceta do guru tropicalista - e SescTV exibe, a partir de hoje, ciclo de filmes experimentais do escritor e cineasta, que[br]terá, ainda, obra no Beaubourg, em Paris

Por Jotabê Medeiros
Atualização:

Colhendo depoimentos para o documentário inédito que apresenta hoje em ciclo sobre o escritor e cineasta José Agrippino de Paula (1937- 2007) no SescTV, à meia-noite, a videomaker e pesquisadora Lucila Meirelles foi à casa do cineasta Hermano Penna, o premiado diretor de Sargento Getúlio. Conversando, Penna falou informalmente de sua amizade com o multimídia Agrippino, cuja produção foi das mais abrangentes - cinema, literatura, dança, teatro, happening, artes visuais, música. "Música?", admirou-se Lucilla, demonstrando incredulidade. "Sim, ele fazia umas fitas cujas capas eram desenhadas por ele mesmo e que vendia para amigos, para ajudar a financiar seus projetos", respondeu Penna. "Eu mesmo tenho uma aqui que comprei da mão dele." E foi buscar a preciosa demo, gravada nas duas faces da fita. Foi assim que o desconhecido disco Exu Encruzilhadas, de 1971, uma viagem ?indo-psicodélica? do guru tropicalista Agrippino, volta a ser ouvido a partir de hoje (com exclusividade, no site www.estadao.com.br). É uma sucessão de faixas que organizam ruídos, mais do que criam música, e que não parecem ter início e fim, misturando-se organicamente. É um som feito de improvisos circulares, como na tradição sufi ou nas composições aleatórias de John Cage e de Marco Antonio Guimarães (do grupo Uakti). Está também impregnado de candomblé. O som de Agrippino causa um choque pelo que carrega de ousadia e premonição. Não há possibilidade de que essa música seja conectada à Tropicália - a literatura de Agrippino se presta a isso, pela estrutura, mas sua música está em outra dimensão. "É um som que também carrega aquele espírito de desregramento de uma época", diz Lucila Meirelles. Entre faixas como Funeral de Iansã e Veneno de Deus, a revelação da música maluca de Agrippino vai solidificando seu mito - que já tomou a França. Em março, será instalada no Beaubourg uma mostra com seus filmes, exigência surgida com a súbita descoberta de sua arte após a publicação de seus livros naquele País, começando por Panamérica (lançado em janeiro pela editora Leo Scheer). A Holanda também receberá a mostra, que vai para Roterdã assim que encerrar seu ciclo francês.C

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