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Sob o céu vermelho do Colorado

O histórico show do U2 na turnê americana de War, em 1983, sai pela primeira vez em DVD

Por Lauro Lisboa Garcia
Atualização:

Enquanto não chega o novo álbum, No Line on the Horizon, previsto para o dia 3 de março, os fãs do U2 podem se refestelar com os relançamentos dos primeiros anos da banda nos anos 1980. No fim de 2008, a Universal colocou no mercado brasileiro as edições de luxo (com dois CDs cada) dos álbuns Boy (1980), October (1981) e War (1983). Agora, sai pela primeira vez em DVD Under a Blood Red Sky, o histórico show que a banda fez no anfiteatro de Red Rocks, em Denver, Colorado, durante a turnê americana de War, no dia 5 de junho de 1983. Tanto o DVD como os CDs têm material inédito e encartes com muitas fotos para os colecionadores babarem. Outros títulos virão no mesmo formato. O roteiro do show reúne as canções mais representativas dos três álbuns da banda, abrindo com Out of Control, seu primeiro single, lançado em setembro de 1979. O material de maior impacto - Sunday Bloody Sunday, New Year?s Day, Two Hearts Beat as One, Seconds, Surrender, 40 - vem de War, seu melhor álbum até então. Mas outras anteriores (Gloria, Party Girl, I Will Follow, 11 O?Clock Tick Tock) também se tornaram mais arrebatadoras ao vivo. Com áudio 5.1 e nova mixagem de som, o DVD traz ainda cinco canções que não haviam saído na versão VHS. Há ainda a opção de (re)ver o concerto com comentários do diretor Gavin Taylor. No entanto, mesmo que não houvesse esses novos atrativos, o conteúdo bastaria por si. O filme flagra o U2 em toda sua intensidade dos primeiros anos. Sem cenários nem grandes efeitos visuais (como viriam a utilizar nas megaturnês a partir dos anos 90), a força estava toda concentrada na música, na contundência das letras engajadas, na sonoridade despojada e potente. O incrível cenário natural entre as rochas vermelhas (Red Rocks) já é um diferencial, mas a história por trás do evento, além do resultado, contribuiu para tornar o concerto histórico. Os irlandeses do U2 ainda não eram muito conhecidos nos Estados Unidos, mas atraíram 5 mil fãs, que lotaram o auditório e sabiam quase todas as músicas da banda. O local era de difícil acesso, como comenta o diretor. A banda e a equipe chegaram lá sobre rodas, mas 90% do público foi a pé, enfrentando chuva, neblina e lama. Chovia muito e por pouco o concerto não foi cancelado, lembra Gavin Taylor. "Mas a banda insistiu em fazer o show para não desapontar os fãs, que tinham enfrentado as montanhas e o clima chuvoso para vê-los. Era uma verdadeira peregrinação chegar até o local." Isso tudo contribuiu ainda mais para o show ser valorizado. Para Bono, as péssimas condições do tempo se converteram em ato heroico. "Talvez a chuva reflita a banda e o clima de nossas músicas", comentou. "Se o sol estivesse brilhando, talvez ficássemos iguais a qualquer outra banda. Talvez tivéssemos relaxado. Quer dizer, não é típico do U2 ficar na praia, coisas assim. Afinal, já gravamos na neve." Bono tinha razão ao acreditar que naquela noite a banda entraria para a história de alguma maneira. Lá pelo fim do show, extasiado como todo o público, ele disse que não esqueceria aquela noite e pediu aos fãs que não esquecessem. Um desses momentos inesquecíveis é Sunday Bloody Sunday, quando todo o ambiente se enche de vermelho, como o tapete do palco e o sangue da canção. Das piras montadas em pontos da plateia e sobre o palco saem grandes labaredas. Bono empunha uma bandeira branca e grita suas palavras de ordem, lembrando o famoso massacre de protestantes em Dublin, que inspirou a canção. O público enlouquece. Bono ainda usava aqueles cabelos espetados, com corte idêntico ao que vigorou anos nas cabeças de roqueiros e Xororós daqui, calças justas e trejeitos à Mick Jagger. Não havia fosso para separar palco e platéia. Ele ficava o mais próximo possível do público, tocando nas mãos das pessoas e até se jogando sobre elas, como em Surrender. Havia mesmo uma entrega que não se vê nos cantores hoje. O concerto de Red Rocks, lembra o diretor, foi "o início da longa jornada do U2 em direção à fama". "Foi aqui que essa jornada tão incrível começou virtualmente." Nos anos 80, quando tudo era de difícil acesso no Brasil, esse show chegou a ser projetado num daqueles espaços modernos que os roqueiros da época frequentavam (Carbono 14, uma livraria que havia na Praça Benedito Calixto). Foi de um tremendo impacto. Hoje, passados 25 anos, o show não perdeu a força. Além das canções em si, comove a autenticidade da banda, o vigor do instrumental de The Edge (guitarra), Adam Clayton (baixo) e Larry Mullen Jr. (bateria), um power trio enxuto e criativo como era The Police. E tinha a voz tamanha de Bono, sem dúvida, a mais impressionante do rock de sua geração.

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