PUBLICIDADE

Sexo frágil faz Leconte prisioneiro

Com perfume autoral, Félix e Lola tenta decifrar segredos de estranha fugitiva

Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Foi em 2001, logo depois de A Viúva de Saint-Pierre - com Juliette Binoche, Daniel Auteuil e Emil Kusturica -, que Patrice Leconte realizou Félix e Lola. Ele se espanta de que somente agora, sete, quase oito anos depois, seu filme esteja estreando no Brasil. Depois disso, Leconte acrescentou mais oito títulos ao currículo, inclusive dois que se contam entre seus favoritos - L?Homme du Train, de 2002, e Confidances Trop Intimes, de 2004 - , mas ele próprio é reticente ao falar de Les Bonzés 3: Amis pour La Vie, que em 2006 bateu recordes (mais de 10 milhões de espectadores) e se transformou num dos maiores sucessos da história do cinema da França. "É um humor muito particular, muito regional e francês. Não creio que seja um produto para exportação, e menos ainda para o Brasil. Vocês têm outro humor, outro astral." Assista ao trailer do filme Leconte conversa com o repórter pelo telefone, desde sua casa no campo, onde passa as férias natalinas. "Preciso de agitação, mas gosto desses períodos de calma, mais reflexivos." Pode ser uma boa definição para o cinema deste ex-assistente de François Truffaut, que alterna êxitos comerciais - e obras de um recorte mais popular -, com outras mais íntimas, nas quais se percebe um perfume autoral. Foi, aliás, o que disse Arnaud Desplechin, autor de outra estréia francesa desta quinta-feira especial, Um Conto de Natal, ao saber que o repórter do Estado, na seqüência de sua entrevista, também falaria com o diretor de Félix e Lola pelo telefone. Desplechin admitiu respeitar muito Leconte e gostar de vários de seus filmes. "Que gentil da parte dele", disse Leconte, ao saber do comentário. "Nunca conversei com Arnaud. Nó nos encontramos há cerca de um mês em Roma, quando uma associação cultural me prestou uma homenagem, mas foi uma coisa breve, dez segundos, o tempo de nos apertarmos as mãos." Félix e Lola pertence à vertente intimista da carreira de Leconte. Logo no começo, num salão de baile, um homem dispara contra o cantor e há um corte para a vertigem de um parque de diversões, com todo o seu colorido e movimentação. O repórter confessa que não se lembra de outro começo tão agitado para um filme de Leconte. "É porque nunca houve antes, mas foi intencional, para preparar o espectador para o clima da história." Essa história diz respeito a uma mulher misteriosa, Lola, que irrompe na vida de Félix. Ele é o responsável pela manutenção dos carros que se chocam, no parque. Envolvem-se, mas ela tem um passado, uma filha e um homem que a persegue. Lola é uma estranha fugitiva. Durante o desenrolar da trama, você vai ver que ela foge de si mesma. Um dos amigos do herói observa que o que o atrai em Lola é justamente seu mistério. Bingo! O próprio Leconte, como bom discípulo de Truffaut, é suscetível ao mistério das mulheres. "É verdade. Elas são tão frágeis e, ao mesmo tempo, tão fortes. Uma mulher não cessa de nos surpreender e, para mim, enquanto homem e artista, é estimulante recriar esse mistério na tela." Charlotte Gainsbourg, como Lola, vem se somar à galeria de atrizes de Leconte: Sandra Bonnaire, Juliette Binoche, Vanessa Paradis, Anna Galiena, Sandra Majani, etc. Desta vez, há algo nesta mulher que tem a ver com a solução do mistério - e do crime - que convém não dizer, mas se revela ao medo da banalidade e da mediocridade. "Mas é para isso que a gente faz cinema, não? Para contar histórias que exercitem nossa imaginação", explica o diretor - sua declaração vai fazer sentido depois que você vir Félix e Lola. Neste cinema tão marcado pela fascinação do feminino, o homem termina sendo o sexo frágil. Philippe Torreton, que faz Félix, é ótimo. Um grande ator de teatro que se tornou conhecido no cinema graças a Le Capitan Conan, de Bertrand Tavernier. Leconte seguiu uma lição de Truffaut e fez Félix e Lola contra seu filme precedente, A Viúva de Saint-Pierre, que foi uma produção cara. Este é um filme ?menor?, como produção. Não foi um grande sucesso, mas é a continuidade da carreira que garante a carreira de Patrice Leconte. Alguns críticos na França consideraram Félix e Lola seu melhor filme. Ele acha exagerado, mas confirma. Gostou tanto de fazer Félix e Lola quanto de O Marido da Cabeleireira, A Viúva de Saint-Pierre, Les Bronzés 3. Leconte ama os sets de filmagens. Por isso mesmo, preocupa-se. "Já começaram a me homenagear e a me dar prêmios de carreira. Será que estão pedindo para que me aposente?" Serviço Félix e Lola (Felix et Lola, França/2001, 89 min.) - Drama. Direção Patrice Leconte. 14 anos. Cotação: Bom

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.