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Sem a Monarquia, uma crise de identidade

Por Walnice Nogueira Galvão
Atualização:

A proclamação da República a 15 de novembro de 1889 trouxe a reabilitação de Euclides, com reintegração na Escola Militar: em 1892 já era oficial do exército e detentor do diploma de engenheiro militar. Entre março e julho desse ano, assinaria uma série de 27 crônicas, sob o título geral de Dia a Dia. Pelo mesmo lance, Euclides ficara de um momento para o outro privado de seu adversário, a monarquia, a quem atacara sem cessar através de artigos em A Província de S. Paulo, desde que fora expulso da Escola Militar. A série Dia a Dia deixa transparecer uma certa crise de identidade, patenteando como foi especialmente desnorteante deixar de escrever contra o Antigo Regime e passar a escrever a favor da República. Arrefeceu a verve de combate: fora mais fácil pertencer à oposição. E tampouco era simples acompanhar esses inícios, em que os senhores do momento se engalfinhavam nas facções em atrito, empenhadas em golpes e contragolpes. Assim foi sob Deodoro e sob Floriano. Tratava-se doravante de participar do processo de construção do novo regime, tarefa a que Euclides se consagraria com entusiasmo, ansioso por oferecer sua contribuição, criticando as iniciativas que lhe pareciam equivocadas e principalmente o desvirtuamento dos ideais republicanos. O novo regime mostrou-se mais acolhedor a figurões veteranos, dispostos a tudo para continuar participando do poder, do que a incorporar adeptos fervorosos da República que tinham lutado para trazê-la à luz, como é o caso de Euclides. As referências contidas em sua correspondência não são nada abonadoras nem lisonjeiras para os poderosos recém-chegados, entregues a conchavos e transações dos mais escusos. Neste artigo, Euclides aproveita a efeméride, o Dia do Trabalho, para fazer uma homenagem ao proletariado industrial. Tece considerações sobre o fato de que, ainda incipiente no Brasil, nos países da Europa já constitui uma classe ponderável, capaz de parar a máquina do mundo se cruzar os braços. Impressiona aqui seu talento visionário, que surgirá com força nos livros que escreverá, em sua capacidade de criar com palavras vívidos quadros que evocam a legião dos operários saindo das trevas do passado para ocupar seu lugar na História, à luz da liberdade futura.

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