Sam Mendes mantém suas questões sobre família

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Diretor de teatro, Sam Mendes estreou no cinema instantaneamente consagrado com a chuva de Oscars atribuída a Beleza Americana. Foi há dez anos e, desde então, Mendes vem levando uma carreira errática, mas interessante. Estrada para Perdição, Soldado Anônimo e, agora, Foi Apenas Um Sonho reafirmam preocupações autorais e, se é verdade que a crítica já não presta tanta atenção ao cineasta, é porque teria de fazer um mea-culpa. A visão suburbana da família e da sociedade em Beleza Americana não é muito mais densa do que a da série Desperate Housewives. Admitir que supervalorizou Beleza Americana, no ano do excepcional O Informante, de Michael Mann, talvez não seja coisa fácil para muita gente. Há algo de rude na honestidade de Frank, o personagem de Leonardo DiCaprio em Foi Apenas Um Sonho. Talvez seja, inconscientemente, uma projeção do próprio Mendes afinal, ele é marido da estrela Kate Winslet. Ela já ganhou o Globo de Ouro pelo papel e agora concorre a melhor atriz por O Leitor. Nem Kate nem DiCaprio seduziram os acadêmicos de Hollywood pelo filme de Sam Mendes. O que há de errado com esses caras (os votantes)? O filme é uma adaptação do romance de Richard Yates, autor que, em seu começo, foi um tanto ofuscado por Joseph Heller e J.D. Salinger. Revolucionary Road é do mesmo ano de Ardil 22 e Franny e Zooey e só muito depois houve o revival que hoje reconhece Yates como um dos grandes autores norte-americanos do século 20. Revolucionary Road, que se pode traduzir como Caminho Revolucionário, virou Foi Apenas Um Sonho na tradução, que já engloba a confissão de um fracasso. É a história de um casal, Frank e April, que se passa em 1955. Ambos foram jovens, sonharam com uma vida diferente da de seus pais, mas neste ano específico, marcado por intensas modificações no cinema de Hollywood - Nicholas Ray, Robert Aldrich, James Dean -, Frank e April descobrem que estão se aburguesando e traindo a rota que traçaram para si. O filme começa com a dupla conhecendo-se e prossegue com Frank a caminho do camarim de April, e pensando como vai dizer o que pensa da peça que ela acaba de representar. Ele é um bruto - diz ?não foi exatamente um sucesso?, ou coisa parecida, começando aí a matar as aspirações da mulher. A própria razão de ser de Foi Apenas Um Sonho parece ser a de promover o reencontro de Leonardo DiCaprio e Kate Winslet, o primeiro desde o romântico Titanic, de James Cameron, mostrando como evoluíram em sua arte. Ambos criam seus personagens com intensidade e o próprio Mendes escolhe a via do romantismo. O livro de Richard Yates tem um background social muito mais forte. Investir nos atores, mais do que na crítica social, é um preço que o diretor paga. Mas é curioso como, contando a história de um casal, ele se mantém fiel ao seu tema preferido - as relações geracionais, entre pais e filhos. No livro, Frank quer ser tudo menos parecido com seu pai. O filme não é tão enfático, mas esse é sempre o drama dos personagens de Sam Mendes. A família termina virando para eles uma prisão. Existem momentos em que o o drama de Frank é admitir para si mesmo, e para a mulher, que não são os revolucionários que sonharam.

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